A União Europeia está a considerar a hipótese de lançar uma investigação sobre eventuais apoios de Estado dados por Portugal, Grécia, Espanha e Itália aos bancos, pelas garantias que estarão a dar para que ativos por impostos diferidos possam ser considerados como parte do seu capital aos olhos dos reguladores.

Os ativos por impostos diferidos (DTA, na sua sigla em inglês) são ativos constituídos nos balanços dos bancos quando as instituições têm de registar determinados gastos ou perdas, mas cuja dedução do ponto de vista fiscal só ocorrerá mais tarde. Estas perdas geram ativos por impostos diferidos que, mais tarde, quando o banco voltar a ter lucros pode vir a deduzir.

Aquando das novas regras de Basileia III, que entraram em vigor no início do ano passado, os supervisores bancários decidiram que este tipo de ativos, por não serem de recuperação certa, não seria considerado como capital dos bancos. A ideia dos supervisores, na alteração das regras do funcionamento do sistema financeiro após a crise, era garantir que o capital dos bancos era mais sólido e não composto por ativos de qualidade duvidosa, que, em períodos de crise, se revelavam não recuperáveis, colocando em risco a viabilidade dessas instituições.

Para poderem contar como capital, os bancos têm de ter garantido uma elevada probabilidade (quase 100%) de conseguir recuperar esses ativos. Para que isso acontecesse, os governos destes países decidiram fazer alterações à lei para dar essa garantia, de formas diferentes, alguns deles mesmo com garantias do Estado, para evitar o que seria um rombo no capital de alguns bancos numa altura ainda sensível. O caso mais evidente foi o de Espanha, que deu uma garantia a este tipo de ativos que, caso não sejam recuperados pelos bancos, passam até a ser considerados dívida pública espanhola.

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Agora, segundo o jornal inglês Financial Times, a Comissão Europeia está a analisar os países que fizeram estas mudanças – no caso, Portugal, Grécia, Espanha e Itália -, para determinar se a forma como os governos estão a garantir estes ativos pode ser um benefício ilegal aos bancos, que lhes daria vantagem concorrencial.

O FT diz que a Comissão Europeia está a falar com os países e com as respetivas autoridades da concorrência, sendo o caso da Grécia o que mais preocupa. Ao abrigo do regime criado pela Grécia, já que este tipo de ativos representa entre 30% a 40% da reserva mínima de capital dos principais bancos. No total, os quatro maiores bancos têm mais de 40 mil milhões de euros neste tipo de ativos contabilizados como capital, de acordo com os dados do BCE.

Estes novos regimes foram criados, pelo menos em Portugal e na Grécia, em colaboração com a troika, ou seja, tiveram a participação da própria Comissão Europeia e do Banco Central Europeu.

A investigação pode avançar se a Comissão Europeia decidir que este tipo de regimes representa uma ajuda de Estado, o que é considerado ilegal, uma vez que seriam os Estados destes países que teriam de avançar com capital caso os bancos caíssem. Se Bruxelas considerar que a medida é específica a um setor, e não suficientemente generalizada para ser considerada uma medida fiscal abrangente, a investigação deverá avançar.

Um dos exemplos em Portugal deste tipo de ativos é atualmente o Novo Banco. Na altura da resolução do BES foi constituída um grande volume, superior a 3 mil milhões de euros, de ativos por impostos diferidos, a favor do Novo Banco e, há cerca de duas semanas, a própria ministra das Finanças admitiu que se estes ativos tivessem ficado no BES, numa eventual liquidação, transformavam-se automaticamente em créditos fiscais exigíveis ao Estado juntamente com a restante massa falida.

Outra das questões relacionadas com este tipo de ativos está na forma de registo nas contas públicas deste tipo de ativos. Caso sejam considerados como créditos fiscais exigíveis ao Estado, os países têm de reconhecer nas suas contas públicas, o que levaria a um aumento dos défices e das dívidas. A questão está a ser analisada pelo Eurostat desde o ano passado, inicialmente devido à situação espanhola, mas ainda não foi tomada uma decisão.

Os regimes, apesar de terem sido acompanhados pelas mesmas instituições, são diferentes de país para país, o que pode significar a abertura de investigações em apenas alguns destes quatro países.