A informação sobre o Programa de Estabilidade que o Governo enviou na passada sexta-feira aos partidos que o suportam no Parlamento não contemplava ainda as medidas concretas que o Executivo prevê aplicar nos próximos quatro anos, apurou o Observador. Nem sequer há um esboço do tão falado plano B para compensar um eventual crescimento económico mais baixo. O conteúdo do documento — que tem sido mantido em segredo absoluto e que segundo fontes do Governo ainda não estava concluído na segunda-feira — será discutido esta terça-feira ao fim da tarde com o Bloco de Esquerda, o PCP e Os Verdes, em reuniões separadas com o Governo.

A parcela do Programa de Estabilidade que os partidos já conhecem inclui apenas os indicadores macroeconómicos de 2016 até 2020. As previsões não são tão pessimistas quanto António Costa fez crer durante o debate parlamentar de sexta-feira — apurou o Observador –, quando afirmou que as perspetivas de crescimento económico não eram boas para Portugal, considerando a conjuntura internacional. “O Programa de Estabilidade tem de assentar em perspetivas realistas. Em matéria de previsões convém não ser voluntarista, convém ser previdente e conservador”, afirmou o primeiro-ministro aos deputados. “Não há uma uma revisão em baixa significativa”, diz ao Observador uma fonte que já contactou com o documento.

Este domingo, no seu comentário na SIC, Luís Marques Mendes avançava que o Governo se preparava para rever as previsões de crescimento económico para 1,4% ou 1,5%, ficando assim em linha com as projeções do Banco de Portugal e do FMI, mas é certo que o Executivo tem sido o mais otimista em relação às previsões sobre o desempenho económico deste ano. No Orçamento do Estado para 2016 previa um crescimento de 1,8% do PIB.

Depois de, a 12 de abril, o FMI ter revisto em baixa (de 1,5% para 1,4%) as previsões de crescimento para Portugal, esta segunda-feira foi a vez de um novo relatório da Comissão Europeia, sobre a terceira missão pós-programa, ter levantado ondas. No relatório conhecido esta segunda-feira, Bruxelas sublinha os riscos de Portugal se desviar “de forma significativa” do objetivo de redução estrutural do défice, continuando a pedir um corte de 0,6% no défice estrutural. A Comissão pede por isso mais austeridade, alertando nomeadamente que a subida do salário mínimo pode ter o efeito perverso de agravar o desemprego de longa duração.

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Programa de Estabilidade não vai a votos?

Não é provável que o Programa de Estabilidade, que tem obrigatoriamente de ser discutido na Assembleia da República mas que não tem de ir a votos, venha a gerar uma crise nos partidos da “geringonça”. Só se algum dos partidos apresentar um projeto de resolução é que o documento é votado, podendo ou não ser aprovado. Foi assim, de resto, que caiu o Governo de José Sócrates, depois de o PEC IV ter ido a votos e ter sido chumbado no Parlamento.

Do lado do Governo não há intenções de sujeitar o documento aos votos dos seus parceiros, e o mesmo deverão fazer os partidos da esquerda, que preferem negociar nos bastidores em vez de terem de se vincular ao texto publicamente. Restavam os partidos da direita, que podiam querer obrigar a “geringonça” a assinar de cruz as metas. Mas o PSD deixou já claro que é aos partidos do Governo que cabe esse papel, com Passos Coelho a dizer que lhe interessa mais as propostas concretas que se seguirão ao PE, isto é, as medidas para o Orçamento de 2017, ou para um eventual retificativo. Essas sim, terão de ser votadas.

No domingo, Pedro Passos Coelho voltou a pressionar o Governo a apresentar o documento, à semelhança do que Assunção Cristas tem feito numa base regular. “É natural que o Governo precise de concertar com a sua maioria, mas quanto mais rápido for e puder comunicar com transparência, melhor”, disse.

Resta saber se o CDS apresentará uma resolução para o Programa de Estabilidade ir a votos. Os centristas acham que o Bloco e PCP para serem coerentes, deviam querer votar o documento, como aliás fizeram nos últimos anos. No fim de semana, Assunção Cristas desafiou os partidos “mais radicais de esquerda” a “conferirem e aferirem” o documento “através de uma votação” no Parlamento. Esta estratégia corre o risco de reforçar a unidade dos partidos da chamada “geringonça”: uma fonte parlamentar de um dos partidos diz que “se a direita quiser levar o documento a votos, tendo em conta os termos em que apresentarem a resolução, será fácil o BE e o PCP votarem contra”.

Quando estava em campanha eleitoral, o Presidente da República tinha sido claro quanto à necessidade de um apoio claro ao Programa de Estabilidade por parte dos quatro partidos que suportam o Governo. “Tem de haver um acordo sólido em torno daquelas ideias”, disse Marcelo Rebelo de Sousa numa entrevista à Sábado. “O país não se pode dar ao luxo de ter uma crise política a seguir a tudo o que vivemos neste ano eleitoral, portanto, significa que tem de haver um acordo em torno no plano de médio prazo apresentado em Bruxelas.”

O Programa de Estabilidade vai ser aprovado esta quinta-feira em Conselho de Ministros, chegando ao Parlamento no mais tardar no dia seguinte. No dia 27, vai ser discutido pelos deputados em plenário da Assembleia da República.