O crescimento de novas forças políticas nas próximas eleições autárquicas, nomeadamente do Chega e da Iniciativa Liberal, pode implicar um corte nas subvenções atribuídas aos partidos tradicionais que pode chegar aos 10%.

Tal como indica a lei eleitoral, têm direito à subvenção “os partidos, coligações e grupos de cidadãos eleitores que concorram simultaneamente aos dois órgãos municipais [Câmara e Assembleia Municipal] e obtenham representação de pelo menos um elemento directamente eleito ou, no mínimo, 2% dos votos em cada sufrágio”.

O cálculo dessas subvenções faz-se da seguinte forma: 25% do bolo é distribuído de forma igual pelos partidos, coligações e grupos de cidadãos eleitores que consigam preencher as condições anteriores; e os restantes 75% são distribuídos na proporção dos resultados eleitorais obtidos para a assembleia municipal.

Ora, olhando para a tendência consolidada das sondagens é previsível que Iniciativa Liberal e, sobretudo, Chega, dois partidos que enfrentam este ano as suas primeiras autárquicas, consigam eleger vereadores e/ou deputados à Assembleia Municipal. O que pode baralhar as contas dos partidos em dezenas de milhares de euros.

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O exercício implica sempre alguma cautela até porque existem muitas variáveis: número de candidaturas em jogo, resultados conseguidos, deputados municipais eleitos e vereadores conseguidos. Mas olhando para números das últimas eleições autárquicas e fazendo as contas é possível chegar a alguns exemplos práticos.

Em Lisboa, por exemplo, o PSD recebeu em 2017 mais de 88 mil euros. Se der o caso de dois outros partidos conseguirem ter direito à subvenção, esse valor pode descer para os 82 mil euros. O mesmo vale para o PS: dos 139 mil euros de 2017, neste cenário poderia receber cerca de 133 mil euros.

O mesmo acontece em Faro. Há quatro anos, o PSD recebeu 65 mil euros; se tiver a concorrência de mais dois partidos, esse valor pode descer para os 62 mil. O PS passaria de 63 para 61 mil euros.

Idem para Loures. Em 2017, o PSD conseguiu quase 87 mil euros de subvenção. Se outros dois partidos assegurassem a representação municipal, poderia passar para os 83 mil euros. O PS ia dos 127 para os 123 mil euros.

Em Faro igual. Há quatro anos, o PSD conseguiu uma subvenção de 65 mil euros. Teria direito, se IL e Chega conseguissem intrometer-se nesta luta autárquica, por exemplo, a ‘apenas’ 62 mil euros. O PS passaria dos 63 para os 60 mil euros.

O caso do Porto é mais delicado. Apesar da força que já conseguiu demonstrar nas urnas, é pouco provável que a Iniciativa Liberal avance com uma candidatura própria. Assim, nesse cenário, só o Chega conseguiria intrometer-se na corrida eleitoral. Ora, havendo mais um partido a ter direito à subvenção, a quebra será menor. Mas existirá: o movimento de Rui Moreira perderia quase 4 mil euros, o PS cerca de 3 mil e o PSD quase 4 mil euros.

Vistos isoladamente, estes valores podem parecer minimais. Mas alargando o exercício a todos os concelhos do país, a perda de subvenções pode chegar aos 10%, segundo estimativas feitas pelos próprios partidos.

Claro que este exercício encerra um problema de partida: em muitos concelhos, é bastante provável que as composições político-partidárias se mantenham inalteradas, sem entrada de novas forças nas autarquias e/ou assembleias municipais. Mas o aviso fica feito.

Os cofres dos partidos

Os maiores partidos atravessam momentos diferentes no que diz respeito à saúde financeira. De acordo com as contas relativas a 2019 entregues à Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP) — o último documento oficial disponível –, PSD e PS estão em extremos opostos e o CDS está em falência técnica.

Assim, de acordo com aquele documento, o PSD lidera a lista com 19,8 milhões de capitais próprios. Daí para cá, a direção de Rui Rio tem apostado muito na consolidação financeira do partido. Para estas eleições autárquicas, a direção social-democrata definiu regras muito claras para o controlo de gastos com outdoors, as sondagens e até brindes.

Em 2019, o PS estava no fundo da tabela com 3,8 milhões de euros de capitais próprios negativos. Daí para cá, Luís Patrão, membro da comissão permanente e responsável pela gestão do partido, tem conseguido inverter a tendência, ainda que não não existam números mais atuais reconhecidos pela ECFP.

O PCP era o segundo partido com mais fulgor financeira, tendo registado capitais próprios de 16,7 milhões de euros, apesar de as contas do partido merecerem a preocupação dos responsáveis comunistas — ano após ano, tem diminuído as receitas e as contribuições para o partido.

Em 2019, o Bloco de Esquerda registava um prejuízo de 360,9 mil euros. Nesse ano, os bloquistas gastaram quase o dobro da subvenção eleitoral a que tiveram direito. E há sinais de alarme: este ano, os dois candidatos da esquerda (Marisa Matias e João Ferreira) não tiveram direito a subvenções o que vai previsivelmente entrar nas contas de Bloco e PCP, respetivamente.

Em maus lençóis está também o CDS. Em 2019, os democratas-cristãos, tal como os socialistas, estavam em falência técnica, com cerca de 84o mil euros de capitais próprios negativos. Segundo a própria direção partidária, a situação financeira está agora a recompor-se.

Nesse relatório, os três mais novos partidos do sistema — PAN, Chega e Iniciativa Liberal — estavam em terreno positivo e nada indica que tal se tenha alterado.