A presidente do Conselho das Finanças Públicas (CFP), Nazaré da Costa Cabral, pede “responsabilidade” não só ao governo como também aos restantes partidos políticos, devido à atual configuração parlamentar, para não aumentarem em demasia a despesa de forma a que coloquem em causa a redução da dívida pública. E pede que o novo Executivo quantifique de forma adequada as novas medidas com que quer avançar para se saber o efeito que terão no saldo primário.

“Todos têm de ter uma responsabilidade no sentido de perceber que vamos ter de assumir um compromisso muito firme em termos de redução da dívida pública e isso está fortemente dependente do comportamento do saldo primário [que exclui os encargos com juros] e desde logo da despesa líquida primária que venha a ser traçada”, disse Nazaré da Costa Cabral.

A líder do CFP deixa uma mensagem de “prudência” aos protagonistas políticos para que o saldo primário não se deteriore com aumentos muito significativos da despesa, “devido à importância que o saldo primário tem na trajetória da dívida pública”. Além disso, pede que as novas medidas sejam devidamente quantificadas para que se saiba o seu impacto no presente e no futuro. Nalguns casos, “pode fazer a diferença” fasear as medidas.

Entre as medidas que podem vir a ter maior expressão orçamental, e para a qual chama a atenção da necessidade dessa quantificação, está a recuperação do tempo de serviço dos professores, a atribuição do suplemento de risco à PSP e à GNR ou o aumento do complemento solidário para idosos, que podem ter impacto não só este ano mas ao longo da legislatura, assim como a promessa da redução da carga fiscal.

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“Dadas estas restrições orçamentais que o país tem de enfrentar vai ser preciso muita cautela da forma como os responsáveis políticos olham e anunciam as medidas do lado da despesa e da receita. Tem de haver um dosear, um calibrar, para que o objetivo da manutenção do saldo primário em valores positivos no sentido de assegurar a manutenção sustentada da dívida pública portuguesa que isso seja assegurado e continuado”, afirmou.

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Sobre a lei de enquadramento orçamental, que determina que os excedentes orçamentais devem preferencialmente ser usados para abater na dívida pública, Nazaré Costa Cabral diz que é isso que a lei dita, mas não de forma taxativa, pelo que dá alguma discricionariedade aos governos para decidir. Logo, dá margem ao atual governo para decidir aplicar excedentes em aumentos da despesa.

Já sobre a necessidade de um Orçamento retificativo, diz que dependerá da quantificação das tais medidas adicionais que o Governo quiser vir a implementar.

Quanto à apresentação do programa de estabilidade, que até aqui era obrigatório até 15 de abril, Nazaré da Costa Cabral diz que como os programas de estabilidade serão descontinuados este ano, não é claro para o CFP que o Governo venha a ter de entregar o documento naquela data. Isto porque os programas de estabilidade este ano “vão deixar de existir” e até setembro os países têm de apresentar um novo documento “com uma filosofia e estrutura diferente”.

“Este novo plano é o grande exercício que os governos devem estar concentrados em fazer. O programa de estabilidade, tal como nós conhecemos, vai deixar de existir. Já está virtualmente revogado porque revogado está o regulamento europeu que consagra a apresentação destes programas de estabilidade”, afirmou. Costa Cabral admite, também, que possa ter de ser entregue uma versão mais “simples” face ao habitual.

O CFP apresentou esta terça-feira as perspetivas económicas e orçamentais até 2028, onde projeta que o crescimento da economia abrande para 1,6% este ano e o excedente para 0,5%, mas avisa que estas previsões não têm ainda em conta as promessas eleitorais feitas pela AD, como a recuperação do tempo de serviço dos professores, o pagamento do subsídio de missão à PSP e GNR ou o reforço dos apoios aos pensionistas de menores rendimentos.

Isto porque essas matérias poderão constar no programa do Governo, que só será apresentado esta quarta-feira, e discutido nos dois dias seguintes, não conhecendo o CFP o seu teor.

Por outro lado, são consideradas nas projeções medidas expectáveis como as atualizações salariais na função pública ou o efeito da revisão das regras do sistema de avaliação na administração pública (o SIADAP) feitas pelo anterior governo.