A última semana terminou com a apresentação, por parte do Governo, de 15 medidas de emergência para a Educação. Ao Observador, representantes dos diretores de escolas e das associações de pais dizem-se satisfeitos, e até destacam como positivas algumas das medidas apresentadas pelo Governo, como a atribuição de bolsas a quem ingressar em cursos da área do Ensino. O mesmo acontece com os investigadores e professores do Ensino Superior, chamados para ajudar a colmatar a falta de professores. Já os docentes, representados pela Fenprof, esperavam mais e acusam o Ministério da Educação de ser “pouco ambicioso”.
A medida que maior destaque recebeu por parte da Associação Nacional de Diretores de Agrupamento e Escolas Públicas (ANDAEP) é a atribuição de 2 mil bolsas de estudo a quem ingressar em licenciaturas ou mestrados na área do Ensino. Foi uma medida que “agradou” o responsável da associação. “As medidas são todas a curto prazo, muitas delas a curtíssimo prazo. E destaco esta a médio e longo prazo. As 2 mil bolsas não me parecem suficientes, mas a juntar com as outras parece-me bastante razoável” para dar resposta à falta de professores, partilha Filinto Lima.
A dirigente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap) também elogia esta medida: “Não sabemos se as medidas vão surtir efeito”, mas, no que toca à atribuição de bolsas, Mariana Carvalho já começou a receber sinais de interesse. “Perguntaram-me como vai funcionar. Há interesse identificado por parte dos alunos”, diz a representante dos encarregados de educação ao Observador.
Os números, as soluções e as metas. “Plano de emergência” para as escolas custa 20 milhões de euros
A opinião é partilhada pelo responsável do Conselho de Escolas, António Castel-Branco, que alerta: “Faltou uma medida que diga respeito à criação urgente de cursos de ensino. Nos últimos dois anos já foi notória a falta de vagas para mestrados em ensino. Não há vagas, mas têm de ser criadas e espero que haja esse esforço.”
Por outro lado, a Fenprof — um dos sindicatos dos professores com mais associados e que ficou fora do acordo entre Ministério e sindicatos para a reposição do tempo de carreira congelado — diz que esta medida não irá resolver nada. Em comunicado, a organização alertou que as 2 mil bolsas para novos estudantes dos cursos de ensino “serão atribuídas a futuros professores, que apenas chegarão ao sistema dentro de cinco anos”, porém, “ o sistema educativo, só ao longo do ano letivo em curso, verá quase 5 mil docentes saírem para a aposentação”.
Diretores apoiam regresso de reformados ao ativo
O programa do Governo “é pouco ambicioso” e, naquilo “que é possível quantificar, [este programa] não vai além de 10% das necessidades”, critica o sindicato de Mário Nogueira. Apesar de a Fenprof considerar positivo o facto de o Governo reconhecer que faltam professores, o sindicato considera a estratégia do Governo “demasiado genérica”.
E diz que algumas medidas “colidem com o disposto no Estatuto da Carreira Docente”, como é o caso do “aumento do número de horas extraordinárias para 10”. Mário Nogueira critica ainda a a proposta de incentivar professores a continuarem a trabalhar ao invés de se reformar: “É pouco crível que se retenham mil docentes que estão para se aposentar, pagando até 750 euros quando, depois de se aposentarem, poderão receber até 1604,90€”.
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Mas a medida que mais críticas recebeu por parte deste sindicato foi atrair professores de volta ao ativo. “Não será atraindo aposentados (que foram desrespeitados no processo de recuperação do tempo de serviço) que se dará o inadiável rejuvenescimento da profissão docente”.
Por oposição, os diretores escolares veem com bons olhos esta ideia. O presidente do Conselho de Escolas, que também é diretor da escola secundária Ferreira de Castro, António Castel-Branco, admite que esta medida poderá ser apelativa em regiões como “o Alentejo ou o Algarve, com turmas mais pacatas e pequenas, em escolas onde não há tanto desgaste.” Já Filinto Lima, dirigente da ANDAEP, diz mesmo “não perceber” porque é que algumas pessoas fizeram “chacota” da medida. “Parece-me ser muito útil. Há uma pequena franja de professores que quer continuar o vinculo à escola.”
Fenprof elogia contratação de técnicos superiores
Finito Lima destaca ainda como positiva a aceleração do processo de contratação de novos professores: “Atualmente, só à sexta-feira de cada semana sabemos que professores são colocados na semana seguinte, o que demora mais de uma semana a acontecer e agora isto será diariamente”. Também o alargamento do período de substituição dos professores de baixa é “uma medida muito positiva”, remata o dirigente da ANDAEP.
“Vemos com muito bons olhos [esta medida] e parece-nos rápido de implementar”, elogia a representante das associações de pais. António Castel-Branco concorda e diz mesmo que “não tem sentido” contratar um professor apenas para a substituição durante um mês, mesmo sabendo que o professor responsável não irá voltar .
A Fenprof — apesar da opinião negativa relativa a este pacote de emergência — considera positiva não só a possibilidade de contratação diária e do alargamento do período de substituição, como também a contratação de 140 técnicos superiores para apoio administrativo.
Superior contra recrutamento de bolseiros para lecionar no secundário
Nas 15 medidas do Governo, três interferem diretamente com o Ensino Superior: bolseiros de doutoramento que dão aulas no superior poderão dar aulas no ensino secundário; será atribuída uma bolsa para atrair mestres e doutorados para a docência através de uma formação científica e a profissão será aberta a docentes e investigadores doutorados.
“Estamos solidários, percebemos o problema que é preciso enfrentar”, reconhece o presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup). Em representação dos professores e investigadores do Superior, José Moreira acrescenta que considera positiva a ideia de “contratar pessoas doutoradas e mestres com especialização cientifica”, mesmo sendo necessário “definir em que condições podem aceder à carreira docente”.
Contudo, há “duvidas na questão de recrutar bolseiros de doutoramento para colaborar” nas escolas. Estes investigadores “estão a trabalhar no doutoramento” e, podendo acumular até 10 horas para lecionar, ficam “sem tempo para se dedicarem” à investigação. “A questão tem de ser afinada”, remata José Moreira.
Reduzir em 90% número de aluno sem aulas é muito ambicioso
Para o presidente da ANDAEP, no pacote de 15 medidas destaca-se “a ausência de apoios na deslocação e estadia de professores”, medida que considera essencial e urgente. Já o presidente do Conselho de Escolas admite que, “de modo geral, as medidas são positivas” e, com alguma cautela, ressalva que “falta verificar depois a sua eficácia”.
A mesma preocupação tem o dirigente da ANDAEP, que admite mesmo a necessidade de reajustar as medidas inicialmente propostas pelo Governo, até porque “os 90% é uma meta muito ambiciosa”. Filinto Lima referia-se ao objetivo definido pelo ministro da Educação, Fernando Alexandre, de reduzir em 90% o número de alunos sem aulas até ao final do ano.
Para Filinto Lima, independentemente das medidas implementadas, a prioridade tem de ser manter o nível de ensino, especialmente quando o Governo propõe simplificar os procedimentos de reconhecimento de habilitações para a docência de professores imigrantes. A mesma preocupação tem António Castel-Branco: “Temos de ter cuidado para não baixar o nível”, independentemente de como tudo “se operacionaliza”.
Mariana Carvalho também partilha desta opinião, mas olha para a questão de outra forma: “Temos muitos alunos estrangeiros e estes professores podem ajudar do ponto de vista da linguagem e facilitar a comunicação. Pode ser vantajoso.”