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ANTÓNIO COTRIM/LUSA

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

"Eduardo Cabrita não estava a conduzir. Não contarão comigo para retirar ilações políticas"

Em entrevista, Pedro Marques defende a revisão das regras orçamentais sob pena de se criar "uma década de estagnação". Noutro plano, o socialista avisa: Costa "está cheio de energia para continuar".

Pedro Marques era a grande aposta de António Costa para comissário europeu mas, as difíceis negociações em Bruxelas, fizeram com que a escolha acabasse por recair sobre Elisa Ferreira. Agora, na qualidade de eurodeputado e vice-presidente da bancada do S&D no Parlamento Europeu, é um dos rostos da família socialista europeia.

Em entrevista ao Observador, a partir de Estrasburgo, o antigo ministro elogia os méritos da Presidência Portuguesa da União Europeia, acusa PSD e CDS de terem tentado desde o minuto zero prejudicar a imagem do país na Europa e aponta a porta de saída a Viktor Órban. “Ou Orbán muda ou tem de ser mudado pelos húngaros”, diz.

O socialista acabar por falar também sobre o Governo, afastando qualquer cenário de remodelação, por defender Eduardo Cabrita (“que eu saiba o ministro não ia a conduzir”) e por deixa um aviso aos que, no PS, se preocupam com sucessão de António Costa. “Esses processo longos de preparação de sucessões, em particular no PS, não têm sido particularmente felizes no passado.”

“Certificado digital não é um flop”

Começando pela Presidência Portuguesa da União Europeia, que terminou há dias e foi reconhecida como regular e positiva. Ainda assim, são-lhe apontadas duas falhas estruturais: a primeira relacionada com a vacinação, onde assistimos a vários momentos de descoordenação entre Estados-membros. Não se exigia mais à diplomacia portuguesa neste aspeto?
A diplomacia portuguesa não esteve envolvida na coordenação do processo de vacinação. O processo per si, de entrega de vacinas, de contratação, etc, foi da responsabilidade da Comissão Europeia. O envolvimento da presidência portuguesa foi sobretudo na questão do certificado digital e aí foi um sucesso muito grande.

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Houve países tomarem decisões diferentes e contraditórias sobre determinadas vacinas, como a Astrazeneca, por exemplo. Não se exigia ao Governo português uma voz mais firme?
Não é uma competência da presidência rotativa. O primeiro-ministro referiu mais do que uma vez que a EMA, a agência europeia, devia ter aqui mais competências para coordenar essa diferente ação dos Estados-membros, a própria comissão não tem competências nessa matéria, muito menos a presidência portuguesa. E repito: foi aprovada em tempo recorde por parte da presidência portuguesa e do Parlamento o certificado digital, que é o melhor instrumento que nós temos para a coordenação, mesmo não isento de dificuldades, com países que tomam decisões que porventura não iriam no sentido da utilização plena do certificado. Mas também aí com pressão política para tentar alterar essa situação. É um processo difícil e aí a pressão política resultou em relação à Alemanha, resultou. A Alemanha começou por tentar impor barreiras adicionais e depois recuou nessa matéria. Será sempre um processo difícil, mas naquilo que a presidência podia fazer, no certificado e na aprovação dos recursos próprios para a recuperação económica, entregou resultados positivos que são reconhecidos por toda a gente.

Há quem aponte dificuldades óbvias à questão da aplicação deste certificado digital e à falta de regras harmoniosas entre os vários Estados-membros. O certificado digital não é um flop?
Não é um flop. O processo há-de ter as suas complicações nesta fase inicial. estamos no começo e numa fase muito difícil por causa das novas variantes altamente contagiosas e é preciso recordar que a legislação relativa ao certificado digital admitia a possibilidade em situações muito excecionais os Estados-membros poderem impor restrições mesmo na verificação do certificado.

Mas isso não esvazia de valor o certificado?
Não, não esvaziou. Mesmo o maior Estado da União Europeia no momento em que teve uma primeira tentação de impor em relação a um Estado médio [Portugal] uma restrição adicional depois acabou por recuar porque reconheceu que tinha aprovado um certificado digital de circulação europeia e que lhe tinha que dar valor. Portanto, nesse sentido valeu a pena o esforço do certificado e vai valer mais a pena ainda agora com a normalização da sua utilização. Estamos apenas nas primeiras semanas, literalmente nos primeiros dias de aplicação, portanto fazer balanços desse tipo — que foi um flop ou que não valeu a pena — por dois ou três dias ou semanas de utilização, não faz sentido. Mas, no seu primeiro teste, o maior Estado europeu a tentar ir para além das regras do certificado em termos de liberdade de circulação, foi um importante fator político para que depois a própria Alemanha acabasse por recuar.

Ainda assim, se a Europa assistir a novas vagas de transmissão de coronavírus, se novas variantes surgirem, há alguma garantia que este certificado digital vá ser respeitado no futuro?
Podemos construir os cenários teóricos que entendermos sobre essa matéria, o que sabemos é que temos um instrumento de circulação que só admite em situações muito excecionais e devidamente justificadas qualquer tipo de restrição adicional dos Estados-membros. Se for preciso algum tipo de ajuste também ainda se poderá fazer. O que é certo é que nós em dois meses, como em tantas outras coisas, Portugal conseguiu com muito mérito do Governo de António Costa e da nossa diplomacia pegar numa série de dossiers difíceis e entregar resultados, como na Lei do Clima, como na questão na reforma da PAC, na Agência Europeia do Asilo e Migração, no certificado digital. São dossiês dificílimos a nível europeu, que a diplomacia portuguesa e a influência do Governo de António Costa permitiram desbloquear.

"Mesmo o maior Estado da União Europeia, no momento em que teve uma primeira tentação de impor em relação a um Estado médio [Portugal] uma restrição adicional, acabou por recuar"

“PSD e CDS tentaram provocar dano a Portugal no início da Presidência”

Há dois casos que, no fundo, coincidem com o início e o fim desta Presidência Portuguesa da União Europeia. No início, tivemos a nomeação do novo procurador europeu, que foi um caso muito delicado para o Governo português. E esta presidência da UE termina com a revelação que a Câmara Municipal de Lisboa enviava dados de manifestantes para países terceiros. Estes dois casos não mancham a imagem pública do país?
O primeiro caso em particular foi um exemplo de aproveitamento político da oposição de direita, do PSD e do CDS, para tentar fazer dano. Com impulso claramente do PPE, a que pertencem PSD e CDS.

O Parlamento Europeu condenou por ampla maioria a escolha.
Não. O Parlamento Europeu fez debate sobre essa matéria e houve vários grupos que consideraram que o procedimento não tinha sido o mais adequado, mas também é verdade que depois com os esclarecimentos prestados, quer pelo Governo português, quer pelo próprio Conselho Europeu em relação ao procedimento de seleção que foi seguido, esse assunto acabou. Houve uma tentativa de exploração clara do PSD e do CDS para provocar dano a Portugal no início da Presidência. Vamos ser claros. Foi isto que aqui aconteceu porque Portugal indicou um procurador que foi escolhido por uma entidade independente do Governo. O Conselho Superior da PGR nada tem a ver com o Governo, como sabemos. São juízes, são magistrados que escolheram autonomamente uma lista de hierarquia que foi respeitada pelo Governo português.

Embora não tenha sido escolhido candidato mais bem posicionado. 
Não foi escolhido o candidato que outras entidades prefeririam, mas foi escolhido de forma independente do Governo. O Governo não teve nada que ver com essa priorização. Indicou o candidato que esta entidade independente judicial selecionou. Vai daí, veja o alarido que foi feito em Portugal e aqui no Parlamento Europeu pelo PSD e pelo CDS, na altura, e veja que estão completamente calados agora quando a nova presidência, da Eslovénia, da família política destes dois partidos portugueses, não indicou, de todo, o procurador. Não é uma questão de ter indicado um diferente da entidade europeia. Não indicou. O primeiro-ministro esloveno optou por não indicar procurador algum porque não gostava daquele que resultou do processo de seleção. Aí o PSD e o CDS estão em completo silêncio. É só para os portugueses perceberem que o problema destas coisas, às vezes, é o dano que se faz sobre a imagem de Portugal à procura de ganhos políticos de curto prazo.

A oposição tem legitimidade para trazer estes casos para o Parlamento Europeu.
A oposição tem legitimidade para fazer o que entender, mas tem que o fazer com verdade e depois tem que ser equilibrada nas atitudes que tem. Porque é que o PSD e o CDS não estão agora a levantar a situação da Eslovénia e a pedir debates em plenário e condenações ao primeiro-ministro esloveno? Acho que os portugueses devem ter em consideração, também na sua avaliação da atitude da oposição, a forma como eles se comportam com dois pesos e duas medidas.

"Houve uma tentativa de exploração clara do PSD e do CDS para provocar dano a Portugal no início da Presidência. Vamos ser claros"

E a questão de Fernando Medina e a Câmara Municipal de Lisboa?
Foi uma questão profundamente infeliz que o presidente da câmara de Lisboa reconheceu como tal, como uma situação de erro que ocorreu na altura. Ele próprio qualificou como erro e infeliz a situação.

Traz dificuldades à imagem do país?
Não foi significativo aqui a questão. A questão foi colocada na comissão LIBE e, sendo colocada, o presidente da comissão LIBE escreveu à câmara de Lisboa a pedir esclarecimentos adicionais. Imagino que a Câmara de Lisboa enviará a informação que tem sobre a matéria, já tendo reconhecido que havia uma situação infeliz. Não há mais nada a dizer sobre isso, o próprio presidente da Câmara de Lisboa reconheceu nesses termos, alterou os procedimentos e fez as reformas internas que tinha de fazer sobre a matéria e nada mais. Foi uma situação difícil que ele reconheceu, assumiu as consequências práticas que foi alterar todos os procedimentos internos de um procedimento administrativo errado que a câmara vinha assumindo ao longo de anos.

“António Costa não desautorizou Elisa Ferreira”

Concorda com Elisa Ferreira quando a comissária europeia diz ‘ser penoso ver que Portugal com estes anos todos de apoio ainda está entre os países mais atrasados’?
Acho que a notícia que está aqui em causa, e a alteração significativa, é termos conseguido em poucos meses ao contrário de outras alturas em que levou anos a conseguir qualquer coisa deste género, conseguir em poucos meses a ratificação de todos os parlamentos relativamente aos recursos próprios. Temos uma oportunidade enorme para o futuro para a Europa. Na nossa família política o objetivo é que aquilo que agora é temporário — a capacidade de orçamental adicional para responder à crise — se torne permanente para o futuro. Criarmos verdadeiramente uma capacidade orçamental europeia que sirva de estabilizador quando há crises simétricas ou assimétricas. Vínhamos reclamando isto há muito tempo, reclamando as eurobonds há muito tempo, e finalmente conseguimos na resposta a esta crise. A Europa tem sido feita um pouco assim, no contexto da resposta às crises é que se têm produzido os grandes avanços europeus.

Imagino que esteja portanto mais de acordo com António Costa quando o primeiro-ministro diz que não nos devemos auto-flagelar com o nosso historial de aplicação de fundos.
Não certamente. Se virmos no contexto europeu somos sempre dos países com mais taxa de absorção dos fundos ao longo do período de implementação.

A questão não é necessariamente a execução; são as escolhas.
Retirando a fase inicial do PSD e governos de Cavaco Silva, em que era muito injetar dinheiro e fazer algumas obras até duvidosas que depois vieram a ser refeitas e melhoradas, como algumas das IPs, se falarmos do ciclo de aplicação de fundos a partir do ano 2000 vemos um ciclo de concentração cada vez maior na inovação, no tecido empresarial mais inovador, para lhe dar capacidade para enfrentar esse choque de competitividade. Se vir, em particular depois da crise de 2010 e da resposta austeritária de Passos Coelho, quando começa o ciclo António Costa em que se volta a apostar na lógica de aumento das exportações, e com consumo interno e procura interna, tem um resultado muito significativo. As empresas portuguesas conseguiram mesmo outra vez aumentar muito as exportações, em particular nesse período. Com a tal alternativa europeia que António Costa apresentou à Europa começa a ter um ciclo de crescimento da procura interna e depois de crescimento significativo das exportações.

Termos uma Comissária Europeia, Elisa Ferreira, a dizer o que disse e depois o primeiro-ministro a dizer que não devemos olhar assim para o nosso historial. Isto não foi António Costa a desautorizar publicamente Elisa Ferreira?
Não, de todo. Não acho nada isso. Acho que é positivo que tenhamos uma capacidade de debater e sermos inquietos relativamente ao nosso processo de desenvolvimento. A senhora comissária é muito conhecedora da realidade do nosso desenvolvimento regional, pelo papel que já teve no passado no país como ministra do Planeamento, como presidente da CCDR-Norte conhece bem essa realidade. Conhece também os vários ciclos de desenvolvimento do país relativamente a todas estas dimensões. Também é verdade que ficámos, a certa altura, um bocadinho na armadilha dos países do chamado médio-crescimento, que é muito difícil fazer aquele salto competitivo para o clube seguinte, mais elevado. Fomos conseguindo fazer, com investimento cada vez mais na ciência, no empreendedorismo, na digitalização. São tudo prioridades que agora estão no Plano de Recuperação.

“Os falcões da direita querem o regresso das velhas regras”

Noutro plano, começa agora uma discussão sobre se a União Europeia será ou não capaz de rever as regras orçamentais. É uma discussão que tem condições objetivas para chegar a bom porto?
Tem condições para ser positiva e mais que em muitos outros momentos certamente. Desde logo porque temos um comissário muito empenhado nisso mesmo, o comissário Paolo Gentiloni, da nossa família política. Temos o debate que temos feito aqui a nível do Parlamento Europeu que tem criado alguma margem para que esse debate vá abrindo e vá abrindo oportunidades de resultados. Temos um conjunto de parceiros europeus nesse sentido, o European Fiscal Board, por exemplo, muito focado nessa possibilidade também como grande estrutura de aconselhamento das instituições europeias para o efeito, muito orientado para uma revisão de regras. O Banco Central Europeu a dizer que a política monetária fez o que podia na resposta a esta crise mas que precisamos de mais do lado da política orçamental e uma consciência grande que a dívida Covid, em particular a resultante do processo de apoio às empresas e às famílias no tempo do Covid não pode ser tratada como o resto da dívida no contexto da recuperação da situação das finanças. Parece-me que há algumas condições para não voltarmos às velhas regras orçamentais

Mesmo com os países chamado frugais e as posições historicamente assumidas pela Alemanha.
É evidentemente que vamos ter mais dificuldades, não escondo isso. Temos de esperar pelo resultado das eleições alemãs; sabemos que teremos certamente dificuldades com alguns países nórdicos, como a Holanda… Mas temos um comissário europeu, Paolo Gentiloni, bem orientado para essa necessidade de libertar capacidade para o investimento social e verde e não estrangular o crescimento económico com uma diminuição demasiado rápida da dívida Covid.

Mas ultrapassado este clima de emergência sanitária em que quase todos os Estados-membros, se não todos, têm consciência de que é preciso acudir aos riscos imediatos, não corremos o risco de enfrentar novamente um bloqueio da UE nas regras orçamentais?
É um risco, evidentemente. Conseguimos consenso europeu para fazer aquilo que ninguém imaginava, para a solidariedade na resposta a essa crise; já ouvimos alguns desses falcões da direita europeia a falar em regressar às velhas regras e à consolidação orçamental. Acho que se isso acontecesse a Europa podia enfrentar uma década de estagnação. Aquilo de que precisamos agora é crescimento económico, recuperação do emprego e dar esperança às pessoas, e não de lhes dizer que durante uma ou duas  décadas vamos estar numa corrida acelerada para a redução de uma dívida que hoje nem sequer tem o mesmo peso nas nossas contas públicas.

“Ou Orbán muda ou tem de ser mudado pelos húngaros”

Outro dos passos dados nesta presidência prende-se com a questão da Hungria e da Polónia. Mas sabendo que toda e qualquer sanção será sempre bloqueada porque estes dois países votarão sempre alinhados, não há um risco de trazer algum descrédito às instituições europeias?
Tenho uma resposta dupla para isso. Primeiro: se chegarmos ao fim nos processos do chamado artigo 7º, de sanção por razões de Estado de Direito, e a única coisa que conseguirem for bloquear a finalização do processo e a condenação por veto cruzado, isso também tem consequências políticas nos seus países. As pessoas nesses países compreendem que as instituições europeias estavam preparadas para sancionar, mas que só não aconteceu porque combinaram a votação um com o outro. Mas acrescentámos ao nosso leque de instrumentos europeus o regulamento de condicionalidade no uso dos fundos de recuperação. Ainda agora a Comissão Europeia suspendeu a análise e eventual aprovação do plano de recuperação húngaro porque foi pressionada pelo Parlamento Europeu para que o fizesse. E o regulamento europeu diz agora de forma clara que se houver significativos riscos de má utilização dos fundos é para parar mesmo os pagamentos ao Estado membro. Este regulamento, se for aplicado em situações de grave incumprimento, vai provocar dano nestes países, e então o Estado de Direito terá de ser levado muito mais a sério. Neste caso há um efeito financeiro no bolso do Governo.

Mantendo-se neste caminho a saída da Hungria é inevitável? E desejável?
Não. A saída da Hungria do projeto europeu não é desejável. A saída do Governo húngaro desta deriva autoritária e contra o Estado de Direito é que é desejável, claramente. Felizmente, também vamos tendo sinais de que os húngaros vão percebendo que esta deriva autoritária e contra as regras do estado de Direito é gratuita e não corresponde aos valores que muitos húngaros defendem. Começa a haver sinais de que, do ponto de vista político e eleitoral, poderá haver mudanças no futuro na Hungria. Ou Orbán muda ou tem de ser mudado pelos húngaros.

Esse tipo de sanção não pode ter um efeito contraproducente de tornar ainda mais fortes os movimentos populistas e conservadores?
Há quem diga isso, mas pelas reações que vamos tendo agora em particular da Hungria, não tem sido esse o caso. A população compreende que a Europa não está a querer penalizar a Hungria nem os húngaros, mas os comportamentos do senhor Orbán. Este caminho de desvio do projeto europeu é inaceitável.

"Já ouvimos alguns desses falcões da direita europeia a falar em regressar às velhas regras e à consolidação orçamental. Acho que se isso acontecesse a Europa podia enfrentar uma década de estagnação"

É conhecida a admiração que o primeiro-ministro esloveno, que terá a presidência da União Europeia, tem por Orbán. Não espera que haja retrocessos nestes processos?
Estamos muito preocupados com essa situação e mais uma vez só ouvimos um silêncio ensurdecedor do lado do PSD e do CDS, e do PPE a nível europeu. Foram muitos vocais noutras alturas, nunca foram capazes de expulsar Orbán do PPE — foi Orbán que saiu pelo seu próprio pé — mas na verdade o que vemos é silêncios e o PPE sem fazer nada em relação à situação da Eslovénia, que se degrada cada vez mais, cada vez mais encostada à narrativa de Orbán e a pôr em causa a questão do Estado de Direito na liberdade dos órgãos de informações e dos órgãos judiciais; trata-se de um Governo que não nomeou um procurador europeu… Vemos ali uma deriva também autoritária e muito significativa, e que esperaríamos que se alterasse. Sobretudo, enquanto presidência do Conselho Europeu, seria inaceitável que não fosse uma presidência atuante.

Mas está otimista?
Não estou otimista. Era inaceitável se acontecesse, será denunciado por nós, e ficará como um exemplo de como o PPE tem um discurso mas a sua prática política é completamente diferente — e também espero que PSD e CDS venham responder sobre isso.

Também a propósito desta ascensão de forças populistas — não só, mas também –, António Costa antecipou uma Europa a várias velocidades. Isso não seria o fim do projeto europeu?
Uma coisa é o projeto europeu a várias velocidades em matérias de cooperação económica, de aprofundamento das políticas sociais, políticas fiscais ou mesmo em matérias de desenvolvimento de política externa. Fizemos isso com Schengen, com o Euro… Se estivermos a falar de uma Europa a várias velocidades em matéria de valores, isso já não pode ser. Não podemos ter uma Europa que respeita o Estado de Direito e outra que não. É impossível. Estar no projeto europeu é respeitar os valores básicos da União Europeia.

Se de repente tivermos uma vaga que resulte na ascensão de forças populistas ao poder? Em França, por exemplo, Macron está com grandes dificuldades… Como é que ficará o projeto europeu?
Se acontecesse eleições desse género num número significativo de países ou num país grande como França ou Alemanha, a Europa teria dificuldades importantes. Quero acreditar que os projetos democráticos nos países fundadores do projeto europeu vão continuar a ser maioritários.

"Começa a haver sinais de que, do ponto de vista político e eleitoral, poderá haver mudanças no futuro na Hungria. Ou Orbán muda ou tem de ser mudado pelos húngaros"

“Eduardo Cabrita não estava a conduzir”

António Costa é insistentemente apontado para ocupar um cargo europeu. Há condições objetivas para tal?
António Costa tem um enorme prestígio que um dia poderá ser reconhecido. Não julgo que isso esteja de todo nos seus horizontes por agora. Mesmo agora no contexto das eleições a meio de mandato essa questão não se deve colocar. A estabilidade do funcionamento das instituições e do Governo português não apontarão nesse sentido. António Costa podia ter sido o que quisesse ser no início deste mandato e escolheu continuar a servir o país. E já deu sinais muito claros de que a sua prioridade é continuar a servir o país. Ninguém quer passar por uma crise destas, mas se temos de passar por uma crise destas que seja com um primeiro-ministro como António Costa.

Fala na questão da estabilidade e na resposta à crise sanitária, social e económica e leva-me a outra pergunta: o Governo parece dar sinais de grande desgaste. Uma remodelação nesta altura do campeonato seria desejável?
Esses sinais de remodelação interessam sempre muito aos comentadores políticos e fazem sempre muitas páginas de jornal. António Costa tem conseguido manter sempre um nível de coesão muito grande nas suas equipas, tem sido muito resiliente, escolhe trabalhar com equipas com as quais trabalha durante muito tempo. Essa estabilidade que o primeiro-ministro dá é muito boa porque as pessoas sentem que há confiança e que há condições para trabalhar.

"Eduardo Cabrita não estava a conduzir e mesmo que estivesse a conduzir as circunstâncias do acidente teriam de ser consideradas. Não contarão comigo para retirar ilações políticas de um acidente rodoviário"

Há vozes no PS já a pedirem essa remodelação.
Pode haver vozes de muitos lados. A escolha, no final das contas, é do primeiro-ministro. Veja as coisas que disseram sobre a ministra da Saúde e agora é considerada uma das melhores ministras do Governo, uma campeã da estabilidade e da serenidade.

Em contra-ciclo, Eduardo Cabrita é apontado como um dos ministros mais fragilizados. Acha que tem condições para continuar no cargo? 
Eduardo Cabrita tem sido um ministro muito próximo do primeiro-ministro, muito leal e António Costa tem escolhido sempre premiar essa lealdade e essa estabilidade. E é nesse contexto que continua a equacionar a sua equipa como um todo, não o ministro A ou B.

Eduardo Cabrita viu-se envolvido num acidente rodoviário que resultou numa vítima mortal. Se a investigação provar que o carro onde seguia o ministro circulava em excesso de velocidade, Eduardo Cabrita tem condições para continuar no cargo?
Que eu saiba, Eduardo Cabrita não ia a conduzir, estava em funções governativas. Ao inquérito a decorrer e eu não contribuirei para essa tentativa de retirar consequências políticas de um acidente de viação.

É o ministro da Administração Interna, tem, no fundo, a tutela da segurança rodoviária. 
Eduardo Cabrita não estava a conduzir e mesmo que estivesse a conduzir as circunstâncias do acidente teriam de ser consideradas. Não contarão comigo para retirar ilações políticas de um acidente rodoviário. É uma coisa que não se deve mesmo fazer.

“António Costa está cheio de energia para ser líder do PS e primeiro-ministro”

A luta pela sucessão de António Costa é cada vez mais uma evidência. Já se imagina a ser liderado por Pedro Nuno Santos?
Esses processo longos de preparação de sucessões, em particular no PS, não têm sido particularmente felizes no passado. António Costa já disse que está para ficar, é um líder relativamente jovem, está cheio de energia para ser líder do PS e primeiro-ministro.

Que avaliação faz do seu sucessor, o ministro Pedro Nuno Santos?
Não faço. Tenho tido sempre um ponto de honra: não faço comentários sobre o trabalho do mesmo Governo que integrei na pasta em que assumi responsabilidade. Qualquer comentário que pudesse fazer iriam apenas gerar confusão. Continuo a ser um membro da equipa. Não iria nunca condicionar a ação dos meus colegas de Governo.

Mas teria gerido o dossiê TAP da mesma forma?
Não faço mesmo comentários.

Voltando à luta pelo futuro do PS. A pergunta da praxe: põe-se fora dessa corrida?
Não é o tipo de questão que me ocupe agora. Não ocupa a minha cabeça o papel que desempenharei no futuro do PS ou no futuro do meu país. Tenho um gosto enorme no que estou a fazer agora e que o país e o partido sejam liderados por António Costa e acredito que o vai fazer por um bom número de anos.

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