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Andreas Schierenbeck foi presidente executivo da alemã Uniper, cliente da Gazprom, e agora lidera projetos de hidrogénio verde na Alemanha
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Andreas Schierenbeck foi presidente executivo da alemã Uniper, cliente da Gazprom, e agora lidera projetos de hidrogénio verde na Alemanha

Andreas Schierenbeck foi presidente executivo da alemã Uniper, cliente da Gazprom, e agora lidera projetos de hidrogénio verde na Alemanha

Especialista alemão. "Era mais fácil e rápido" fazer gasoduto que França não quis do que alternativa pelo Mediterrâneo

O gasoduto que França não quis era mais rápido e fácil de fazer que a alternativa por mar que Espanha e Portugal aceitaram, diz ex-CEO da Uniper e consultor do Governo alemão para hidrogénio verde.

Portugal e Espanha têm espaço para exportar gás e hidrogénio verde para o centro da Europa, mas teria sido mais rápido e fácil avançar com o gasoduto que estava a planeado há anos para fazer a interconexão com a França do que desenvolver um novo projeto para um pipeline alternativo pelo Mediterrâneo. Esta posição é defendida por Andreas Schierenbeck, gestor alemão que foi presidente da Uniper, a empresa cliente da Gazprom, e que agora está no negócio da produção de hidrogénio verde com a empresa que fundou, a HH2E.

Em entrevista ao Observador, o gestor e consultor do Governo alemão para o hidrogénio admite que, com a mudança da interligação dos Pirenéus, onde já existia um projeto, para a uma ligação marítima entre Barcelona e Marselha — parte do corredor verde anunciado pelos três países há um mês, uma opção que já gerou críticas duras do PSD em Portugal —, França consegue ganhar tempo. E, na prática, desviar a pressão de que estava a ser alvo, inclusive, por parte da Alemanha para deixar de bloquear as interligações de gás entre a Península Ibérica e o resto da Europa.

Gestor que veio do gás para o hidrogénio

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Andreas Schierenbeck é um dos fundadores e administrador da HH2E. O gestor foi presidente executivo da Uniper entre 2017 e 2019, tendo saído de comum acordo antes do final do mandato. É membro do Conselho Nacional de Hidrogénio do governo federal alemão. A HH2E tem em marcha o projeto para desenvolver uma capacidade de produção de 4 GW de hidrogénio verde através de unidades que juntam energia solar e eólica com eletrólise e baterias. Este mix de tecnologias promete fazer a diferença ao assegurar a produção de hidrogénio sem a necessidade de inputs permanentes de eletricidade. A primeira fábrica vai ser construída no próximo ano em Lubmin, na Alemanha. A empresa está envolvida com um pipeline de projetos na ordem dos quatro mil milhões de euros.

Para Schierenbeck, é possível transportar o hidrogénio numa boa parte dos gasodutos atuais, ainda que sejam necessárias adaptações sobretudo nas instalações acima do solo. Mas a ausência de uma rede operacional de transporte é ainda o principal obstáculo ao avanço em larga escala do hidrogénio verde porque gera grande incerteza, sobretudo ao nível do preço de venda. Daí que a opção, para já, seja produzir localmente junto dos clientes.

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Antes de fazer a sua própria transição energética — dos combustíveis fósseis para a energia renovável — o gestor foi presidente executivo da Uniper entre 2017 e 2019, a empresa que o Estado alemão vai nacionalizar por causa das perdas colossais geradas pelo fim da chegada do gás russo. Andreas Schierenbeck reconhece que a Alemanha cometeu um “erro estratégico” ao deixar-se ficar dependente de um único fornecedor — a Rússia — sobretudo quando na última década deixou cair a regra de diversificar fontes de gás.

Foi presidente da Uniper e esteve envolvido no projeto do Nord Stream II. As críticas feitas à Alemanha, de se ter colocado nas mãos dos russos no abastecimento de gás, são justas?
Sim e não. A dependência alemã do gás russo era definitivamente muito alta. Mais de 50% do gás vinha da Rússia o que não foi claramente uma política de bom senso. Mas temos de separar as duas coisas. Construir os pipelines Nord Stream foi correto naquela altura porque ajudou a assegurar contratos de fornecimento de gás. Mas a alta dependência de uma única fonte de gás, não ter terminais portuários com capacidade para receberem GNL (gás natural liquefeito), reduzir o fluxo que vinha da Holanda e o não procurar outras fontes… Isso foi definitivamente um erro estratégico.

Mas antes da crise deste ano com a Rússia, havia a noção desse erro? Ou ninguém falava nisso porque o gás russo era barato?
Eu não diria que o gás russo era barato. Era comprado ao preço de mercado e não era mais barato que o gás que vinha da Holanda ou da Noruega. Mas foi também uma decisão económica. A infraestrutura já tinha sido construída há vários anos e numa altura em que a Alemanha e outros países não queriam estar dependentes de uma fonte única, mas esta regra foi quebrada na última década.

Acha que os gasodutos do Nord Stream vão voltar a ser usados?
É difícil dizer. Acho que os danos podem ser reparados. Tecnicamente não penso que seja um grande problema. Voltar a usá-los será uma decisão política de certificá-los. Mas penso que a quantidade de gás importada por estes pipelines não voltará a atingir o mesmo nível de antes da guerra.

O chanceler alemão tem apelado à construção ou operacionalização de uma rede de gasodutos a partir da Ibéria para fornecer a Alemanha. Acredita que esta pode ser a solução para garantir a segurança do abastecimento no futuro? Não seria um processo rápido…
Mas poderia ser um processo rápido. O projeto para construir o MidCat estava praticamente pronto e podia ser construído de forma muito rápida. Penso que o lado espanhol estava quase concluído, pelo menos é o que eles diziam. Ainda que do lado francês fosse necessário construir 260 quilómetros de pipeline, isso poderia ser feito rapidamente. Mas isto não está a acontecer. É claro que ter uma rede interconectada de gás na Europa para gás natural e mais tarde hidrogénio faz muito sentido. Os dois gases podem se importados a partir dos muitos terminais de GNL em Espanha e Portugal se existir essa disponibilidade de pipeline para transportar a partir de várias fontes.

"França nunca foi um país de gás. Sempre foi um país de energia nuclear e nunca quis concorrência para essa forma de energia. E se os pipelines estiverem lá, haverá mais acesso ao gás natural. Provavelmente quiseram pôr um fim a este projeto antes de ele arrancar. Para mim faz mais sentido do que construir um novo pipeline entre França e Espanha através do Mediterrâneo quando já existia um projeto e uma rede..."
Andreas Schierenbeck, co-fundador e administrador da HH2E

Porque pensa que França se opôs? Será porque querem ser eles a fornecer o gás à Alemanha?
França nunca foi um país de gás. Sempre foi um país de energia nuclear e nunca quis concorrência para essa forma de energia E se os pipelines estiverem lá, haverá mais acesso ao gás natural. Provavelmente quiseram pôr um fim a este projeto antes de ele arrancar. Para mim faz mais sentido do que construir um novo pipeline entre França e Espanha através do Mediterrâneo quando já existia um projeto e uma rede.

Então não considera melhor o projeto anunciado pelos três países — França, Espanha e Portugal — para contornar os Pirenéus e construir a interconexão com a Europa no Mediterrâneo, entre Barcelona e Marselha?
Eu diria que é mais difícil do que terminar a construção de um pipeline que já estava meio construído. Por outro lado, demorará muito tempo. Pelo menos cinco a dez anos. É o tempo que têm demorado outros pipelines do género. Pode ser feito mais depressa se houver a vontade política de o fazer. Mas se essa vontade política existisse seria sempre mais rápido concluir o que já estava no terreno do que lançar um novo projeto.

E o MidCat (gasoduto que ligaria Espanha e França através dos Pirenéus) conseguiria dar uma resposta mais rápida?
Estava já planeado, tinha financiamento, estava pesquisado. Estava tudo feito. Exceto construir o lado francês.

Esta pode ter sido uma forma da França desviar a pressão sobre o tema ou adiar a interligação para o gás?
É uma típica habilidade de gestão. Todos os bons gestores conhecem o jogo.

Concorda com as medidas que a Europa está a adotar, no curto prazo, para lidar com a falta de gás?
No passado tentei desenvolver terminais na Alemanha e falhei porque não havia a vontade política para o fazer. Mas agora a Alemanha tem sido muito rápida a construir e a contratar terminais flutuantes de GNL que poderão estar operacionais no final do ano quando em situações normais demorariam mais tempo.

E faz sentido a Alemanha começar agora a construir terminais de GNL fixos?
É certo que para descarbonizar precisamos de nos livrar do gás natural, mas isso ainda vai demorar tempo, e ter fontes múltiplas de abastecimento faz sentido. E podemos sempre construir pipelines para usos múltiplos, para transportar e armazenar hidrogénio ou amónia ou metanol. Precisaremos sempre de importar algum tipo de molécula.

Podemos usar as mesmas infraestruturas para todos essas moléculas. Os tubos são os mesmos?
A maioria dos pipelines pode ser usada para hidrogénio, mas não as estações de compressão e o armazenamento. Tudo o que está acima do solo envolve modificações. Os tubos podem precisar de ligeiras modificações, mas não é preciso construir uma nova rede. Se recuar na história, antes de o gás natural chegar da Rússia e ser mais barato, a maioria da infraestrutura de gás nas cidades era usada para transportar gás que tinha 70% a 80% de hidrogénio. Temos já alguma experiência com o transporte de hidrogénio. Não precisamos de novos tubos. É verdade que podemos transportar mais gás natural do que hidrogénio nesses tubos, mas isso não quer dizer que não possamos usá-los também para o hidrogénio.

Gestor considera que a crise está a acelerar a transição para o hidrogénio verde por causa da preocupação com a segurança de abastecimento

Do ponto de vista económico, é racional importar hidrogénio verde do sul para o norte da Europa?
Certamente que haverá espaço para exportar hidrogénio do sul, de Portugal e Espanha, para o norte. Se tivermos uma rede operacional de gasodutos será a forma mais barata de transportar o hidrogénio. De outra forma, convertê-lo para o transportar (por camião ou barco) tem um custo elevado. É importante que a Península Ibérica se consiga ligar à rede europeia para o transporte de gás ou hidrogénio. Isso traria muitos benefícios até porque poderemos também ter hidrogénio verde a vir do norte de África. Mas faz todo o sentido em relação a Espanha e Portugal onde já há grandes empresas a investir em renováveis. Têm mais espaço e mais sol do que temos na Alemanha.

Mas essa infraestrutura terá de ser financiada com dinheiro público. Não se paga a si própria….
Pode ser necessário porque estamos a criar uma nova indústria. Mas a infraestrutura do gás natural liquefeito não foi construída com financiamentos públicos. Foram os operadores do mercado que a fizeram. É verdade que existiram outras razões e porque o gás de xisto era barato e a indústria estava a desenvolver-se. Admito que será necessário financiamento público no início e quando estamos a falar de interligações as empresas não bastam, os Estados têm de estar envolvidos. Mas penso que numa fase posterior o mercado vai entrar com força.

Estamos sempre [em Portugal] a ouvir falar em investimentos de milhares de milhões no hidrogénio, mas parece que não saem do papel. Sei que a vossa empresa está já a construir unidades na Alemanha. Porque demora tanto tempo a executar estes projetos? É um problema de preço?
É um mercado novo e há muitas coisas que ainda não estão claras. Não há um mercado para fixar os preços do hidrogénio verde.

A instabilidade das cotações da eletricidade e do gás também não ajuda…
Sim e não. Essa instabilidade agora é muito elevada, muito também por causa das renováveis, mas quando projetamos para o futuro essa instabilidade baixa. Se criarmos um mecanismo, os preços podem ser calculados. O que falta é uma referência de preço para esse mecanismo sobretudo por causa do transporte. O custo de ter hidrogénio depende muito do transporte e quando este não existe…. não há ofertas. É um problema do ovo e da galinha. É certo que posso começar a produzir e transportar, mas não consigo um compromisso de compra por causa do preço. É uma espécie de jogo do espera. Quem vai assumir o risco de fechar um contrato de muitos milhares de milhões de dólares quando os compradores não têm a certeza e os produtores também não e o transporte não está assegurado? Há muitos elementos de risco.

Como se sai deste ciclo vicioso?
Produção local. Produzir onde está o cliente. É isso que a HH2, a empresa da qual sou acionista, está a fazer na Alemanha.

Por isso vemos muitos projetos de produção associados a indústrias que precisam de descarbonizar a sua produção. Mas há também transportes?
Há o mercado da amónia e do hidrogénio cinzento que já estão preenchidos. Já o hidrogénio verde, a amónia verde o metanol — que não são baratos — é difícil colocá-los no mercado. Mas está a surgir um novo mercado no setor dos transportes. E não temos ainda produção de hidrogénio verde para camiões, mas há procura e está a puxar pelo mercado na Alemanha. Há um projeto europeu de garantir uma rede de abastecimento de hidrogénio verde para esta frota, mas a maior parte da procura está na Alemanha.

"O custo de ter hidrogénio depende muito do transporte e quando este não existe... não há ofertas. É um problema do ovo e da galinha. É certo que posso começar a produzir e transportar, mas não consigo um compromisso de compra por causa do preço. É uma espécie de jogo do espera". A solução é a "produção local" (produzir onde está o cliente). 
Andreas Schierenbeck, co-fundador e administrador da HH2E

A vossa empresa está centrada na Alemanha, mas veio a Portugal (participar na Web Summit). Podem estar interessados em investir em Portugal?
Já existem grandes empresas em Portugal e Espanha — EDP, Iberdrola, Acciona — que estão a investir em energias renováveis. E todas querem ir para o hidrogénio verde. Estamos à procura de parceiros fortes em todo o lado. Algumas destas empresas estão presentes na Alemanha. Nós também trazemos algo para a mesa como a experiência, a tecnologia e projetos que podem ser transferidos para Portugal e Espanha. Mas como uma empresa alemã não iríamos sozinhos para estes países. Podemos entrar como parceiros tecnológicos. Quando entramos num país precisamos de um parceiro local porque a energia é sempre política.

É dos que defendem que esta crise de energia vai atrasar a transição ou acelerar?
Sou sempre um otimista. Quando temos uma situação difícil, temos de tirar o máximo partido quando não podemos mudar as coisas. Acho que a transição para sustentabilidade e para o hidrogénio verde começou há anos. Mas está a acelerar com esta situação que está a revelar os seus trunfos como é o caso de segurança de abastecimento (para produzir hidrogénio verde basta eletricidade renovável barata). Toda a gente sabia que este risco (da Rússia ou de outros fornecedores) existia, mas ninguém estava preocupado. Esta situação mostrou-nos uma fraqueza que temos de ultrapassar e acho que é um empurrão para as renováveis e para nos afastarmos dos combustíveis fósseis. O hidrogénio verde tem outras vantagens como ajudar as redes a lidar com a volatilidade. A produção elétrica renovável, quando é gerada em excesso, pode perder-se, mas podemos absorver o excesso, produzindo hidrogénio verde. Os eletrões não podem ser guardados, mas as moléculas de hidrogénio podem ser guardadas tal como o gás natural.

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