Investir adoptando critérios ESG significa avaliar até que ponto uma empresa opera em benefício de objetivos sociais que estão para além dos lucros dos seus acionistas. Neste contexto, o E (environment) remete para critérios ambientais, onde temos a sustentabilidade (ex “impacto”) ambiental e, sobretudo, a emergência (ex “crise”) resultante das alterações climáticas (ex “aquecimento global”); o S (social) remete para critérios sociais como por exemplo a diversidade de género (ex “sexo”) nas contratações; e o G (governance) remete para critérios como igualdade (ex “justiça social”) no pagamento entre todos (ex “dois sexos”) os géneros existentes.

O que é o ESG (de facto)?

Poderia argumentar-se que não há nenhum problema em ter critérios ESG para efeitos de investimento, o que seria, à primeira vista, inteiramente verdade. Idealmente, cada investidor é livre de ter os critérios que bem entende, e sem dúvida que uma empresa que pisa o risco em matéria de poluição, ou que tem uma política remuneratória inadequada, ou que regista conflitos de interesses significativos nos órgãos de administração deveria ser penalizada pelos investidores em matéria de decisões de investimento, designadamente através da exigência de um prémio de risco superior (cotações mais baixas) para investir. Todavia, é o mercado que naturalmente pondera e mede essas questões, procurando quantificá-las de forma a calcular iterativamente e continuamente o valor da empresa. Por sua vez, a versão oficial do ESG oferece algo completamente diferente, isto é, apresenta-nos uma interpretação dos governos, sempre em nome do suposto bem comum, sobre este conjunto de temas, transformando-os em algo obrigatório num formato centralmente definido. Em suma, o acto de investimento para ganhar dinheiro transmuta-se num acto político supostamente virtuoso.

Hoje em dia, praticamente não há empresa com alguma dimensão que não tenha na sua missão palavras como “diversidade”, “stakeholders”, “inclusão” e, claro está, “sustentabilidade”, numa profusão de “lero lero” que, na maioria das vezes, não passa de conversa fiada para entreter o mercado e as autoridades. Porventura, a generalização é injusta porque haverá muitas excepções. No entanto, a partir da altura em que a moral ESG passou a ter força de lei (e ainda estamos longe do fim desta espiral obsessiva) é natural que as depuradas missões resultem muito mais de um esforço de sinalização de virtude do que de uma sincera declaração de vontades e propósitos.

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Quem estiver familiarizado com as guerras culturais facilmente perceberá que dentro da Hidra monstruosa que é a praga Woke, o movimento ESG apresenta-se como um dos seus braços financeiros. Trata-se, de facto, de um grande esquema com ligações complexas e mutuamente vantajosas entre os seus principais protagonistas. A pretexto da sinalização da virtude nos investimentos, o movimento ESG tem ou terá as seguintes consequências: enriquecer fundos, auditores e consultores com departamentos “verdes”; aumentar a presença dos estados e dos reguladores nas decisões livres das empresas, o que descoordena a alocação de recursos; reforçar a actual tendência de organização económica e social do tipo corporativa/fascista, na qual as decisões de investimento estão cada vez mais condicionadas por valores morais ditados de cima para baixo. Os valores em causa são, evidentemente, os valores do novo progressismo Woke, disfarçados, ou às vezes nem isso, de causas supostamente universais.

Funciona assim:

As empresas auditoras pressionam os legisladores no sentido de aumentarem as exigências às empresas em matéria ESG. Sugerem requisitos e declarações periódicas cada vez mais complicados que, por um lado, tornam estas auditoras indispensáveis e, por outro lado, justificam a intervenção estatal. Entregam os dados auditados às empresas de score ESG e criadoras de índices ESG, as quais medem o material recebido e criam scores, rankings e índices ESG, obtendo receitas ao vender este produto a investidores e fundos. Estes últimos criam fundos passivos e activos com a marca ESG, obtendo receitas extra. Adicionalmente, pressionam as empresas de score e índices ESG no sentido da criação de mais índices ESG que possam ser replicados em mais produtos. Estas fazem-no de bom grado a troco de mais receitas. Para além disso, os maiores acionistas das empresas de score e criação de índices são os fundos que são seus clientes e que os pressionam para mais criação ESG. Um conflito de interesses gritante! Por último, os consultores ESG, que na prática são os departamentos vizinhos do departamento de auditoria (mais conflitos de interesses…), recolhem informação sobre os critérios para construir scores e carteiras de investimento ESG e assessoram as empresas rumo ao “ESG compliant”. Para assegurar que este círculo não se quebra é importante, ainda, garantir que: a) persista a ameaça de força por parte do estado, através de mais e mais regulamentos, leis, multas e impostos sobre os prevaricadores; b) se reitere a transmissão da ideia de que o investimento ESG é uma “win/win situation”, isto é: embora imponha restrições de escolha às empresas, é preciso repetir que o ESG gera retornos adicionais face às alternativas non-ESG.

É evidentemente ilógico que seja uma “win/win situation”. Se há mais restrições, não pode haver mais valor para os acionistas. O que provavelmente acontece é que as empresas realmente boas têm mais meios para comprar o seu certificado de virtude e assim mitigar os seus problemas face a um ecossistema empresarial e político cada vez mais hostil. Portanto, não é por ter critérios ESG normalizados que uma empresa é boa; pelo contrário, é por ser boa que uma empresa pode comprar o seu salvo-conduto de bom comportamento.

Nos últimos anos, a intervenção dos governos e das autoridades monetárias pautou-se pela injeção massiva de dinheiro, o qual foi canalizado para projectos mais arriscados e longínquos, cujo valor disparou em virtude do ambiente de taxas de juro perto de zero. Com as medidas a pretexto da COVID, a situação acelerou quer ao nível da expansão monetária, quer, sobretudo, quanto à ideia de que estaríamos a caminho de um mundo novo impecavelmente limpo.

A orgia monetária e as particularidades dos tempos de COVID criaram a ilusão de que caminharíamos para uma economia da Netflix, do Facebook e do teletrabalho. Acresce que o desinvestimento na velha economia non-ESG ao longo dos últimos anos e o estrangulamento das cadeias de distribuição provocado pelas medidas alarmistas dos governos provocaram uma escassez de oferta de bens essenciais a preços aceitáveis.

Esta mega descoordenação induzida por erros de política económica, da qual o disparo da inflação é o sinal mais evidente, pôs também a nu a falácia do ESG em matéria de performances. É hoje claro para quem quiser ver que, nos últimos anos, as performances superiores de títulos com alto score ESG nada tinham a ver com esse suposto factor mas sim com outras características intrínsecas dos títulos. Para além disso, a persistente sub alocação por parte dos fundos a investimentos tradicionais non ESG terá tido um contributo significativo no aumento do custo de capital destas empresas e consequentemente na fraca resposta da oferta energética, o que acentuou a crise de preços actual.

O fascismo climático e alguma esperança

Sem surpresa, a diversidade de opinião não se aplica a desvios à doutrina na religião ESG. Recentemente, Stuart Kirk, responsável de investimentos responsáveis do HSBC, na Moral Money Conference (um nome que parece dizer tudo…), pôs-se a jeito ao criticar os alarmistas das alterações climáticas. Não negando a questão em causa, não deixou de referir que esta temática está longe de ser o maior dos problemas da humanidade, e que se estão a perder recursos que poderiam ser aplicados de uma forma mais útil. Fez umas simulações, contextualizou, fez e apresentou umas contas fora da cartilha oficial. Foi suspenso pela HSBC!

Em Setembro de 1970, Milton Friedman publicou no NY Times aquela que viria a revelar-se uma peça essencial da sua doutrina. O título era poderoso: a responsabilidade social dos negócios é aumentar os seus lucros. Mais recentemente, Vivek Ramaswamy, autor do livro Woke, Inc, no qual aprofunda a temática deste artigo, anunciou a criação de um fundo de investimento que resgata a ideia de Friedman e, ao mesmo tempo, anuncia-se como anti-Woke e anti-politização da gestão de fundos por parte do “cartel ideológico da BlackRock, Vanguard e State Street.”

Que tenha muito sucesso, embora esta seja uma causa quase perdida.

No fundo, são as que valem a pena.

Os pontos de vistas expressos pelos autores dos artigos publicados nesta coluna poderão não ser subscritos na íntegra pela totalidade dos membros da Oficina da Liberdade e não reflectem necessariamente uma posição da Oficina da Liberdade sobre os temas tratados. Apesar de terem uma maneira comum de ver o Estado, que querem pequeno, e o mundo, que querem livre, os membros da Oficina da Liberdade e os seus autores convidados nem sempre concordam, porém, na melhor forma de lá chegar.