Não é fogo, é capitalismo
(Bloco de Esquerda, Faísca – Juventude Anticapitalista e Revolucionária, Partido Revolucionario dos Trabajadores ou Organización Anarquista de Córdoba, comentando incêndios na Austrália, Amazónia, Patagónia, etc. nos últimos anos)

Sumário:

  1. O fogo no Mundo tem diminuído;
  2. O fogo em Portugal não está a aumentar;
  3. O problema não deriva das Alterações Climáticas;
  4. Logo, não é a Ação Climática ou o fim do Capitalismo que o vai resolver, pelo contrário.

Passaram 6 anos sobre um dos mais trágicos episódios que vivemos em matéria de incêndios. A tinta verde que atingiu o Ministro Duarte Cordeiro tinha como objetivo acelerar a ação climática por forma a nos livrarmos destas catástrofes. Será esta a solução?

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A extrema esquerda por todo o mundo tem associado o Capitalismo às Alterações Climáticas, e é aqui que encontra as razões para incêndios sem precedentes. O movimento ambiental acompanha-os, ao ponto do livro de Greta Thunberg se intitular A nossa casa está a arder.

Uma convicção, todavia, generalizada, de jornalistas (como Andreia Sanches, que há uns dias, escreveu um editorial no Público onde, para ilustrar que “vemos as AC a mudarem dramaticamente a nossa vida”, recorreu à “Grécia, que teve este Verão um inferno de chamas”) aos jovens que movem o processo contra a maioria dos Estados da Europa no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (dizem-se movidos, entre outras coisas, pelos incêndios desde 2017 para cá…), passando por políticos (“A humanidade abriu as portas do inferno” disse ainda há uns dias António Guterres) ou por homens mais ligados à ciência (por exemplo Filipe Duarte Santos, Presidente do Conselho Nacional de Ambiente, a prever um futuro com áreas ardidas muito maiores, ou Jorge Paiva, famoso biólogo, a dizer que não esperava ainda chegar a ver – fez recentemente 90 anos – incêndios com mortes…).

Compreende-se. A associação é básica: os incêndios preferem o calor, pelo que se o planeta está a aquecer, vai arder cada vez mais. Só há um pequeno problema neste pensamento simplista que não distingue meteorologia de clima: está errado!

Se o planeta tem aquecido nos últimos dois séculos, e especialmente nas últimas duas décadas, e isso significasse uma maior piro-atividade, então as estatísticas globais mostra-lo-iam. Todavia, e contrariamente à percepção pública, o que análises várias nos têm mostrado é precisamente o contrário: nas últimas décadas não há mais fogo no mundo, há sim cada vez menos (Doerr & Santin, 2016 – https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4874420/. Arora & Melton, 2018 – https://www.nature.com/articles/s41467-018-03838-0. Andela et. al, 2018 – https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6047075/)

E em Portugal? Em Portugal não há tendência de longo prazo: arde o mesmo agora, há 20 ou há 40 anos. O problema que temos por cá, e cada vez mais notório, é que o padrão de fogo tem-se alterado: arde cada vez menos na maioria dos anos, e depois temos anos excepcionais em que arde o que não ardeu nos anos anteriores (nos anos 90, o pior ano, 1998, respondeu por 20% da área ardida; na década seguinte, 2003 representou 32% da ázrea ardida; e na década passada, foram 42% em 2017).

Como em 2018, 19, 20 ou 21, este ano de 2023 ardeu muito pouco. Mas isso não merece festa. Como no Euromilhões, os prémios, desgraçadamente, acumulam para os próximos sorteios. Porque o clima ainda vai ser mais agreste? Não, já que vários destes também foram anos excecionalmente quentes. Não, porque o clima é só uma entre múltiplas variáveis a considerar (O prof. Paulo Fernandes até consegue mostrar efeitos isolando tudo o resto, mas na vida real, tudo está interligado). Mas sim porque o que é verdadeiramente relevante para esta problemática, a acumulação de combustíveis nas paisagens e como a gerir, é descurado. E também é descurado por se puxar por estas questões laterais – o acessório é inimigo do essencial.

Num par de dias, além de meia centena de mortes e de centenas de casas, empresas, etc. destruídas, arderam mais de 200 mil hectares. Felizmente choveu, porque sem a chuva, e segundo simulações da Comissão Técnica Independente, mais um dia e eram 500 mil. Foi há 6 anos. Em muitos desses locais as cicatrizes já mal se notam. Mais alguns anos e temos um gigantesco barril de pólvora. E não, não é com menos economia, com o decrescimento que os radicais de esquerda defendem que se resolve o problema, porque ele se deve precisamente à falta de economia (dada a miserável, quando não inexistente, rentabilidade das florestas ou da pecuária) que pague a gestão dos matos. Assim, com ou sem alterações climáticas (notem que o passado foi estudado, via pólens e via carvões, na Serra da Estrela, na Charca da Candeeira, e os 14 mil anos estudados mostram 14 mil anos de fogo recorrente), o desfecho seria inevitavelmente o mesmo.

Compreender o papel natural e cultural do fogo (que abominam e reduzem a emissões de carbono – já agora, recentemente estudou-se o arrefecimento causado pelas partículas libertadas pelos fogos de há uns anos na Austrália, assim como uma erupção vulcânica ou um meteorito que ao bloquearem a luz do sol reduzem a temperatura) para o equilíbrio e segurança das nossas paisagens, incluindo a sua importância (como ferramenta que pode ser usada de forma eficaz, barata e segura) para evitar tragédias? É mais fácil e mais aliciante o aproveitamento das desgraças para impor uma agenda, tal como pintar montras e mostrar o rabo é mais fácil do que roçar mato. Mas não se iludam, por mais SUVs elétricos que os ricos comprem com o dinheiro dos pobres ou por mais painéis solares que se ponham nos telhados, por mais minas de Lítio ou dietas vegan (e como o fogo, também o gado pode ser uma importante ferramenta de gestão da paisagem, mas se ninguém os comer, também ninguém os vai criar), não é isso que vai evitar o próximo e (por favor anote, Sr. Presidente da República) previsível monstro de chamas…

PS: Os incêndios de 15 de Outubro de 2017 são indissociáveis do furacão Ophelia. Um furacão? Será isso uma evidência de AC? Porquê? Nunca cá tivemos furacões? Sim, tivémos vários: Gordon 2006, Vince 2005, Jeane 1998, Francis 1992, Bob 1991, Arlene 1987, Irene 1981, Chloe 1967, Dolly 1953, etc. Recuando mais, chegamos até a 1842 e ao que ficou conhecido como o Grande Furacão de Espanha… Seguindo, por exemplo, o que diz o NOAA, nenhum evento isolado pode ser atribuído às AC. O efeito destas traduz-se em tendências de mais ou menos furacões no longo prazo. Nenhum furacão pode ser atribuído às AC. É meteorologia o que vemos, não clima. O clima são médias em séries longas. Não se vê ou sente!