Penso, desde o início desta corrida eleitoral, que a coligação PSD/CDS parte de uma situação muito mais difícil mas tem uma mensagem muito mais simples e de fácil apreensão do que o PS.

Explico-me.

O Governo praticou uma política de austeridade duríssima e, bastas vezes, não a soube comunicar.

É irrelevante discutir se se foi ou não além da troika, até porque os dados são contraditórios. Às segundas, quartas e sextas diz-se que sim, que foram aplicadas medidas para além do que estava no memorando. Mas às terças, quintas e sábados já se critica o governo porque as metas previstas no memorando inicial não foram atingidas.

Certo é que os cortes foram fortes e feios, os impostos aumentaram até ao insuportável, o desemprego atingiu um pico que ninguém previa e os danos sociais são inegáveis. Contra si, pelo impacto directo sentido, o Governo e os partidos que o suportam têm largas fatias do eleitorado: função pública em sentido lato (o que inclui empresas do Estado) e algumas classes em particular, como os professores ou enfermeiros; reformados; pequenos empresários da restauração; desempregados.

Este é o lastro, pesado, que a coligação carrega. É um ponto de partida difícil, como se para uma corrida um atleta arrancasse uns bons metros lá atrás, de quase impossível recuperação.

Em contrapartida, PSD e CDS têm uma mensagem mais fácil de desenhar e de ser entendida pela generalidade do eleitorado, goste-se ou não da receita: a governação cumpriu os objectivos essenciais de terminar no prazo o programa da troika e recuperar a capacidade de financiamento nos mercados; o governo nunca fugiu à aplicação de medidas muito duras quando as entendeu necessárias; a responsabilidade financeira prevaleceu sobre as políticas facilitistas e isso começa a dar resultados. Por isso, a linha dos últimos quatro anos é para manter devidamente adaptada ao ciclo económico. Basicamente, “what you see is what you get”, aqui não haverá surpresas.

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Já o PS, partiu com a enorme vantagem de se poder constituir como alternativa e de poder atrair grande parte dos descontentes, zangados ou mesmo irados com o governo. E são muitos, como se percebe pelas palavras azedas que se ouvem contra a coligação.

Mas, em contrapartida, os socialistas têm uma mensagem muito mais difícil de definir. Preso ao seu passado na governação, muito fresco na memória da generalidade do eleitorado, o PS tem sempre que acrescentar um “mas” nos seus propósitos essenciais.

O PS quer fazer diferente deste governo. Mas sem fazer igual ao que fez quando governou. O PS quer acabar com a austeridade. Mas sem ser irresponsável ao ponto de voltar a torná-la obrigatória. O PS quer estimular a economia. Mas sem gastar dinheiro público que não temos. O PS quer reforçar as políticas sociais. Mas sem criar facturas insustentáveis.

Em comunicação – e uma campanha eleitoral é um momento prolongado de comunicação política – os “mas” facilmente são percebidos como zigue-zagues. O caminho é muito estreito e essa sensação é generalizada. Não há dinheiro, todos sabem. E os alívios têm de ser cautelosos. O PS, naturalmente, quer virar o volante para a esquerda. Mas não tanto que leve o país a sair novamente da estrada. Como a berma está logo ali, isso só se evita com nova correcção para a direita.

Os socialistas têm essa noção de forma muito clara e não é por acaso que “confiança” é a palavra-chave na sua mensagem. Confiança em quê? Que não caem nas ilusões da década passada. Que fazer diferente do governo não é optar pela irresponsabilidade. Que o oposto de austeridade não é o regresso ao regabofe de despesa que logo se vê como se há-de pagar.

A extrema preocupação do PS em fazer e mostrar todas as contas das medidas que propõe – nunca se viu este detalhe de números sujeito a escrutínio público, e isso é inteiramente de aplaudir – é a tentativa de resposta à desconfiança que sabe que uma parte importante do eleitorado tem em relação à sua responsabilidade financeira.

Estas questões são aquelas que os profissionais do marketing definem como dilemas de posicionamento: a percepção que o público tem de um produto que, neste caso, é uma proposta de políticas para a governação.

E não é fácil posicionar um partido nessa nesga que é a da responsabilidade mas mais suave do que a do principal concorrente. Até porque nem todos têm à mão um Jacques Seguela para tirar da cartola “A força tranquila” que ajudou à vitória de Miterrand há mais de três décadas.

Jornalista, pauloferreira1967@gmail.com