1 — O vazio de liderança. Com Rui Rio, não vale a pena perder grande tempo. É tudo muito simples: não sabe ser líder, não consegue ser líder e, mais importante do que tudo o resto, não quer ser líder.

Já Assunção Cristas merece algumas linhas. Depois da candidatura a Lisboa (que correu inesperadamente bem) e dos devaneios napoleónicos sobre uma eventual ultrapassagem do PSD pelo CDS (que correu comicamente mal), a presidente do partido decidiu, por motivos misteriosos, entregar a liderança dos centristas a Adolfo Mesquita Nunes. Admito, apenas a benefício do debate, que “o Adolfo” seja o mais inteligente, o mais capaz e o mais bem preparado da sua geração; que faça os melhores discursos; que use os melhores argumentos contra Mariana Mortágua na televisão; que tenha o melhor currículo governativo. Mesmo assim, sobra um detalhe: a pessoa que os militantes do CDS escolheram foi Assunção Cristas. E a liderança, pela sua própria natureza, não se empresta, como se fosse um livro usado.

2 — O vazio de ideias. Com uma primeira sondagem que o deve ter deixado eufórico, Santana Lopes está a viver, como sempre, pela simples força da sua personalidade. Na carta de despedida que escreveu ao PSD, queixa-se, com inexplicável amargura, que o partido sempre “gostou muito de ouvir os seus discursos” mas sempre “ligou pouco” às suas ideias. E, logo a seguir, de forma involuntária, mostrou porquê. Santana escreve esta frase solene: “Quero sublinhar quatro áreas sobre as quais, ao longo dos anos, muito tenho dito, escrito e, quando é possível, feito”. Só que, depois, não “sublinha” quatro áreas — sublinha “cinco”. Nem havia muito para o baralhar, tendo em conta que o próprio Santana apresenta essas áreas com uns numerozinhos atrás e está lá, reluzente, no final, o número “5” (“5. A inovação, a investigação e a cultura”). No fundo, percebe-se a incongruência: Santana acha que tem quatro ideias fundamentais; na verdade, elas são cinco; mas até podiam ser seis; ou três; ou nenhuma.

Agora que começa uma nova aventura política, Santana Lopes deve perceber que existe uma diferença essencial entre uma ideia e um lugar comum. Anunciar ao mundo que pretende “combater a desertificação” ou apoiar a “criação de riqueza” tem a mesma utilidade que a velha máxima de Lili Caneças, segundo a qual “estar vivo é o contrário de estar morto”. São todas verdades incontestáveis, mas nenhuma vale um voto.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

3 — O vazio de estratégia. Aproveitando o Verão — quando, como se sabe, há filas para comprar jornais e as famílias se reúnem na praia para discutir o futuro da nação — Pedro Duarte revelou aquilo que toda a gente sabia há anos: quer muito, muito, muito ser líder do PSD. Mas, a acreditar nas suas palavras (e não há qualquer razão para duvidar), não faz a menor ideia de como esse antiquíssimo desejo se vai realizar. Quando o Expresso lhe perguntou de que forma pretende “forçar” o debate sobre a liderança do PSD, confessou: “Não pensei nisso”. Ou seja: para efeitos práticos, podia ter partilhado com os portugueses a sua irrefreável vontade de ser futebolista do Real Madrid, ou Papa. Se não sabe como se vai tornar líder do partido, então porque é que havemos de acreditar que saberá como tornar-se primeiro-ministro?

Além desta ligeira desorientação, Pedro Duarte baseia a sua candidatura estival num equívoco. Ao longo da sua entrevista ao Expresso, insiste que Rui Rio não tem “legitimidade política” porque “o PSD desistiu de apresentar uma alternativa ao PS e está empenhado em substituir o BE e o PCP no apoio ao Governo socialista, e essa estratégia não foi sufragada nas diretas”. Presume-se que Pedro Duarte tenha acabado de regressar do exílio porque, na verdade, foi precisamente essa a “estratégia” que os militantes do PSD sufragaram nas diretas. Rui Rio sempre disse que o seu plano era ocupar o lugar do PCP e do BE, para assim libertar o país da influência maléfica da extrema-esquerda; sempre afirmou que viabilizaria um governo minoritário do PS; e sempre defendeu a importância de “acordos de regime”, que seriam uma espécie de Bloco Central informal. O PSD pode estar arrependido, mas não foi enganado.

P.S.: Há um equívoco no caso Robles. O problema, ao contrário do que tem sido dito à exaustão, não é Ricardo Robles defender uma coisa e fazer o seu contrário — aí haveria apenas um problema moral. O problema é Ricardo Robles fazer uma coisa e tentar impôr aos portugueses, através da lei, o seu contrário — e aí reside um problema político. É essa, aliás, a diferença entre aquilo que faz o titular de um cargo público ou, por exemplo, um colunista de jornal: um político toma decisões sobre a vida de todos nós e força-nos a adequar a nossa vida às suas ideias. Já que tem o poder de fazer isso, o mínimo é que as aplique a si próprio.