Como é normal em novos partidos com grande dinâmica de crescimento, o Chega (CH) vai atraindo crescentemente simpatizantes, militantes e ex-dirigentes de outros partidos para as suas fileiras. Esta imigração é naturalmente muito desejada pelo CH. Não só por reforçar as suas estruturas mas principalmente porque para um partido radical que nasceu na periferia do sistema atrair figuras de outros partidos é um importante mecanismo de credibilização.

Importa aqui recordar que vários dos melhores quadros jovens da IL tiveram passagens pelo CDS e pela JP e que algumas das principais figuras do partido foram no passado militantes ou pelo menos próximas do PSD. Estamos, portanto, perante fenómenos migratórios perfeitamente expectáveis, que vão flutuando em função das perspectivas de sucesso eleitoral de cada partido em cada ciclo eleitoral. Ora, com um resultado ao nível das sondagens mais recentes, o CH poderá eleger um grupo parlamento com 30 a 40 elementos, pelo que não surpreende que seja um destino atractivo para políticos em busca de oportunidades.

No caso do CH, esta atracção natural é mitigada pelos elevados custos reputacionais que ainda existem para quem se encontre associado ao partido. O que ajuda a perceber que, nesta fase, as figuras de outros partidos atraídas pelo CH sejam na sua generalidade quadros de segunda ou terceira linha, habitualmente sem espaço no partido de origem.

Caso a trajectória de crescimento do CH continue, é de esperar que o potencial de atracção do partido aumente desproporcionalmente à medida que se vai “normalizando”. Como muito bem explicou Vicente Valentim, postdoctoral fellow no Nuffield College em Oxford em antecipação do seu livro (que sairá no final do Verão):

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“Quando há uma norma social forte contra a direita radical (ex, PT pré-2019), a classe política muitas vezes subestima o potencial eleitoral desses partidos. Por isso, mesmo políticos que estariam dispostos a concorrer nas listas da direita radical acabam por não fazer. Em vez disso, muitas vezes integram as listas de partidos mainstream. Mas, quando a direita radical começa a crescer, estas pessoas apercebem-se que, afinal, é possível ter sucesso sendo de um destes partidos. O resultado é que muitas pessoas que antes integravam partidos mainstream se juntam à direita radical depois de esta ter sucesso.”

O caso da AfD, destacado por Valentim como ilustração, é paradigmático, com cerca de metade dos deputados a terem origem noutros partidos alemães mainstream: quase 30% da CDU/CSU, 10% do FDP e até cerca de 5% oriundos do SPD (o equivalente alemão ao PS português).

O que podemos esperar em Portugal se a trajectória do CH se mantiver é algo similar ao que se passou na Alemanha. Como explica Valentim: “(…) este padrão faz parte de uma tendência geral de normalização da direita radical. Costumava haver normas sociais que faziam subestimar o potencial eleitoral da direita radical. Quando estas normas enfraquecem, mais políticos estão dispostos a juntar-se às suas listas.”

Ou seja, se o CH continuar a crescer, as famosas “linhas vermelhas” tenderão a ficar gradualmente mais ténues e, para alguns, até deixarão de ser visíveis, permanecendo apenas como uma reminiscência difusa do passado.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa