1 A paródia da desinformação. As notícias sobre a falência da Segurança Social são desinformação? As revelações sobre a muito provável origem do vírus do Covid num laboratório chinês ainda são desinformação ou desde que Biden sucedeu a Trump deixaram de ser? O Avante a garantir a felicidade dos povos na defunta URSS é desinformação?… Convém saber porque esta semana o PR promulgou uma lei que os deputados votaram favoravelmente em Abril a que pomposamente chamaram Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital. A coisa para não lhe chamar pior é sinistra: no seu artigo 6º pretende assegurar-nos um “Direito à proteção contra a desinformação” que põe nada mais nada menos que o Estado a proteger “a sociedade contra pessoas singulares ou coletivas, de jure ou de facto, que produzam, reproduzam ou difundam narrativa considerada desinformação”. E o que se entende por desinformação? Tudo o que belisque o poder ou seja “toda a narrativa (…) que seja susceptível de causar um prejuízo público, nomeadamente ameaça aos processos políticos democráticos, aos processos de elaboração de políticas públicas e a bens públicos.” Perante esta definição só resta perguntar: o que não corre o risco de ser classificado como desinformação? Todas as censuras em qualquer lugar do mundo apresentam-se assim: proteger a sociedade face à mentira. O tempo apenas muda os nomes do que se entende por desinformação.

Note-se que nenhum deputado votou contra esta monstruosidade. Repito, nenhum deputado votou contra: a referida carta foi aprovada com os votos do PS, PSD, BE, CDS, PAN, das deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues. Abstiveram-se o PCP, PEV, Chega e a Iniciativa Liberal.

Escapam a este controlo as sátiras ou paródias. Pelo que como atrás ficou explicado, esta coluna de opinião passa muito adequadamente a coluna de paródia num país cujo regime é ele mesmo uma paródia da democracia que se propôs ser.

2 Os parodiantes a fazer pela vida. A informação chegou-nos naquele linguarejar em que a mentira é inverdade:  “O parlamento aprovou hoje em votação final global uma lei-quadro de criação, modificação e extinção de freguesias, que prevê um regime transitório para a correção das agregações ocorridas em 2012/2013.” Assim falam os paladinos do combate à desinformação: não se diz que podem vir a ser criadas centenas de novas freguesias anuncia-se “que se prevê um regime transitório para a correção das agregações ocorridas em 2012/2013“. Percebido? Pessoalmente adoro este “correção das agregações”! Os partidos precisam de colocar a sua gente e para tal não hesitam em acrescentar camadas e camadas à máquina estatal. As juntas de freguesias tornaram-se agências florescentes de emprego, de contratação de serviços e, não menos importante, de estímulo ao clientelismo. Para a paródia ser ainda mais paródia só falta acrescentar que o PSD votou a favor desta lei. Ou seja o PSD votou contra a reforma que enquanto esteve no governo levou a cabo em 2013. Obviamente  o Prémio Parodiante do Ano segue sem desinformação alguma para Rui Rio.

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3 A paródia da irresponsabilidade. Os socialistas são de tal forma amigos da paródia que resolveram exercer o poder sem assumir qualquer responsabilidade. Há lá coisa mais aborrecida que uma pessoa com a mania da responsabilidade? A festa do título do Sporting é o último exemplo dessa forma peculiar de paródia: a Câmara de Lisboa não autorizou mas talvez tenha autorizado e à cautela acusa a PSP; o secretário de Estado do Desporto, João Paulo Rebelo, tinha conhecimento de que havia algumas autoridades a tratar do assunto mas não ele que não tem nada a ver com isso; o ministro da Administração Interna pede uma investigação à actuação da PSP e a PSP desmente o MAI. Que isto é uma paródia não duvido:  de cada vez que olho para o ministro Eduardo Cabrita tenho um irreprimível  ataque de riso!

4 A paródia dos comissários. Esta semana a Comissão da Carteira de Jornalista (CCPJ) informou António Abreu que o seu pedido de carteira profissional de jornalista foi indeferido. O caso arrasta-se há dois anos. António Abreu desenvolveu o site Notícias Viriato mas a CCPJ recusa passar-lhe a carteira profissional alegando que maioria das publicações do Notícias Viriato “representam o oposto daquilo que o jornalismo defende”. O oposto de que jornalismo?

Jornalistas que trabalham em jornais ou televisões de clubes desportivos têm carteira profissional mas o redactor do Notícias Viriato não pode ter porque, segundo a CCPJ, as notícias desse site “representam o oposto daquilo que o jornalismo defende”  e também porque o ISCTE “identifica o Notícias Viriato como um projeto de propaganda e desinformação, perfilhando uma visão ideológica que o afasta de poder ser um órgão de comunicação social tal como é entendido pela maioria dos profissionais jornalistas, académicos e público em geral”. Isto não é uma paródia, é uma verdadeira pândega! Sinistra, mas pândega!

O que está a acontecer a António Abreu perante a indiferença total da classe não é novo: em 1974, no meio de proclamações eufóricas sobre o fim da censura sucediam-se as multas e as suspensões de jornais e revistas mais ou menos marginais como eram o Bandarra, Resistência, o Clarim,  Templário, A Voz de Fátima ou o João Semana cujos artigos são logo no Verão de 74 classificados como “propaganda estéril e negativa” pela Comissão Ad Hoc aos Orgãos de Imprensa. Também a publicações de extrema-esquerda como o Luta Popular começam a ser acusados de “ir contra o MFA”. Depois foi a  vez da Gaiola Aberta ser suspensa por perturbação da ordem pública… Claro que ninguém se solidarizava com estas publicações. Até que um dia se acordou o jornal República ocupado. Usando a linguagem daqueles que então o ocuparam ou a de agora da CCPJ  (a vida é uma paródia de coincidências!) o jornal República era um projecto de propaganda ( no caso do PS) sem notícias dignas desse nome.  Mas nada disso legitimava a sua ocupação!

Mais cedo ou mais tarde alguém de esquerda ver-se-á apanhado nas garras destas comissões, entidades, observatórios… e então, sim, teremos caso. É o que se chama uma paródia com vários capítulos.

PS. Polícias cercadospor grupos armados (Fréjus), ataques a comissariados (Essonne), um agente morto a tiro (Avignon) e outro ferido com gravidade numa emboscada (Loire): é este o balanço da violência urbana nos últimos dias em França. Como o francês continua a ser uma língua praticamente desconhecida neste planeta e a França um país mais desconhecido ainda sobre estas factos continua  a cair um espesso silêncio.