Sócrates foi para mim o pior PM na história da democracia portuguesa. Não foram só a corrupção e a falência nacional, foram também o autoritarismo e a falta de cultura democrática.

O F.C. do Porto é o meu clube. Quando era miúdo, via o Porto sempre que jogava em Lisboa. Hoje, só por razões muito importantes é que perco um jogo do Porto. Planeio as minhas viagens em função dos jogos do Porto. Sofro, muito mais do que desejava, e fico feliz pelo Porto. Quando o Porto perde, fico mal disposto; e se perde com o Benfica, fico doente. É incompreensível, mas é a verdade. Se o leitor juntar estes dois pontos, entende como me custou escrever este artigo. Gostaria muito de nunca o ter escrito. Mas por vezes temos que escrever artigos difíceis.

No último ano, o défice do Porto foi de mais de 50 milhões de Euros. O passivo é de 445 milhões. São números socráticos. Tal como a União Europeia e o FMI foram obrigados a intervir em Portugal, também a UEFA intervém no Porto. Neste momento, o Porto é um clube falido e com soberania limitada. Está na sua fase socrática. No entanto, deve haver gente a ganhar muito dinheiro com os negócios feitos com jogadores que chegam e partem do Porto, quase em pacotes. Nos últimos dois anos, comprámos três defesas direitos estrangeiros que nunca foram titulares do Porto. Já se foram todos embora. E não foram baratos. Quem ganhou dinheiro com jogadores que nada deram ao Porto?

Como foi possível o clube permitir que, no ano passado, jogadores como Herrera e Brahimi saíssem a ‘custo zero’? O ‘custo zero’ é uma mentira. No futebol de hoje, nenhum jogador se transfere de graça. Houve quem ganhasse dinheiro com essas transferências. Quem nada ganhou foi o Porto. Ou seja, o ‘custo zero’ só se aplicou ao Porto. Se Herrera e Brahimi tivessem sido vendidos pelos seus valores de mercado, cerca de 30 a 40 milhões cada um, o Porto teria tido contas positivas o ano passado.

Nos últimos anos, o Porto também vendeu jogadores formados no clube por valores incompreensíveis. Ruben Neves e Diogo Dalot, que serão a curto prazo seguramente jogadores de nível mundial, foram vendidos, cada um, por menos de vinte milhões de Euros. E há muitos outros exemplos de jogadores que foram caros e nada deram ao Porto. São estes erros de gestão que explicam uma dívida de quase 500 milhões de Euros. Essa dívida é ainda mais inexplicável visto que o Porto foi o clube português com maior sucesso na Europa desde 2000; e de longe.

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Aliás, é quase um milagre o modo como Sérgio Conceição tem conseguido manter o Porto a lutar por todas as competições nacionais. A sua capacidade de retirar o melhor dos seus jogadores e de construir uma equipa competitiva é admirável. O milagre só não chegou à Europa, onde esta temporada foi má de mais. As grandes conquistas internacionais do Porto de Pinto da Costa começaram com a memorável vitória de Viena contra o Bayern de Munique em 1987. Mais de três décadas depois, o Porto foi esmagado pelo Bayer Leverkusen, por 5 a 2 no total dos dois jogos. Estes dois exemplos dizem tudo sobre o declínio do Porto na Europa.

Pinto da Costa vai para mais um mandato como Presidente do Porto. Terá que mudar radicalmente a sua equipa dirigente, e contratar profissionais competentes e portistas, que queiram servir o clube e não apenas enriquecer à custa do Porto. Por exemplo, é patético ver um antigo político do partido mais despesista de Portugal (o PS), como Fernando Gomes, à frente das finanças do clube. Não espanta que o Porto acumule défices.

Pinto da Costa enfrenta o maior desafio da sua vida como Presidente do Porto: de que modo irá terminar a carreira de dirigente com mais sucesso na história do futebol português? Se for capaz de despedir os incompetentes e gananciosos que se juntaram à sua volta, e contratar pessoas capazes, poderá terminar como começou, com sucesso e vitórias. Se não o fizer, o seu fim será penoso. E os adeptos do Porto, daqui a uns anos, não pensarão noutra coisa senão em ter um novo Presidente.