A resposta a essa pergunta é um redondo sim.

Na minha consulta de Roncopatia, é comum ver a maioria dos doentes chegarem por influência direta da pessoa com quem compartilham a cama, pouco preocupados com o seu próprio problema. “Estou aqui porque a minha mulher me mandou” é a frase mais ouvida. “A mim não me incomoda, mas o meu casamento está por um fio” também ocupa o pódio. No entanto, quem o enviou, embora por vezes mais incomodado do que preocupado, pode estar a salvá-lo de um desfecho mais trágico do que apenas uma dor de costas por dormir no sofá.

O acidente vascular cerebral (AVC), infelizmente o campeão indesejado da mortalidade em Portugal, pode estar mascarado pelo ressonar. Este ruído noturno pode ser um sinal de alerta para um problema de saúde grave, a Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS).

Mas não se fica por aqui. As doenças cardiovasculares – como  o enfarte agudo do miocárdio, que tiram a vida a mais de 35 mil portugueses todos os anos –, também estão intimamente ligadas à SAOS.

A apneia do sono é um distúrbio que interrompe o nosso descanso fazendo com que a respiração pare e recomece repetidamente durante o sono. Isto pode acontecer devido a uma obstrução das vias aéreas superiores, muitas vezes causada pelo relaxamento dos tecidos moles na garganta, ou devido a um problema no cérebro que afeta a regulação da respiração.

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Acredita-se que, em Portugal, a prevalência da SAOS esteja a aumentar, em grande parte devido ao aumento da obesidade. As estimativas sugerem que a SAOS afeta entre 2 e 4% da população adulta em geral. Quanto ao ressonar, este é um problema comum que afeta entre 20 e 30% da população. No entanto, a partir dos 35 anos, a prevalência do ressonar aumenta para 40 a 60%, sendo mais comum em homens do que em mulheres.

Estas interrupções na respiração levam a quedas súbitas dos níveis de oxigénio no sangue, o que aumenta a pressão arterial e sobrecarrega o sistema cardiovascular. Isto acontece porque o corpo precisa de trabalhar mais para garantir que o oxigénio seja distribuído para todos os órgãos vitais. O coração, sendo um de esses órgãos vitais, é particularmente afetado por estas mudanças.

Assim, a apneia do sono está associada a um risco aumentado de hipertensão, sendo esta um fator de risco significativo para doenças cardiovasculares, incluindo doença cardíaca coronária e AVC.

Além disso, a apneia do sono pode aumentar o risco de arritmias cardíacas, que são ritmos cardíacos anormais, como a fibrilhação auricular. Estima-se que os doentes com apneia do sono têm duas a quatro vezes mais hipóteses de desenvolver arritmias cardíacas do que as pessoas sem SAOS. Esta síndrome aumenta também o risco de insuficiência cardíaca e o risco de doença cardíaca coronária  em 30%.

A apneia do sono tem igualmente um impacto significativo nas doenças cerebrovasculares. Estudos mostram que a apneia do sono está associada a um risco aumentado de AVC. Isto acontece porque as quedas nos níveis de oxigénio no sangue e o aumento da pressão arterial podem danificar os vasos sanguíneos no cérebro, aumentando o risco de um AVC.

Acredito firmemente que um melhor entendimento da etiologia da apneia do sono, juntamente com um diagnóstico precoce, seja essencial para uma melhor abordagem deste distúrbio, subtratado no ambiente clínico. Portanto, encorajo todos a fazerem exames regulares de saúde e a procurarem ajuda médica se tiverem sintomas sugestivos de apneia do sono, mesmo que seja um simples ressonar. Lembre-se: um sono saudável é o sinónimo de um coração e um cérebro saudáveis.

Agora, quando se alguém se queixar de que ressona, pense que o pior problema pode ser seu. É tempo de voltar para a cama e sair do sofá.

Marco Menezes Peres é otorrinolaringologista, especialista em roncopatia e apneia do sono no Hospital dos Lusíadas de Lisboa e no Hospital Cuf Sintra. É ainda assistente hospitalar no Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca, responsável pela consulta de Rinosseptoplastia Estética e Funcional.

Arterial é uma secção do Observador dedicada exclusivamente a temas relacionados com doenças cérebro-cardiovasculares. Resulta de uma parceria com a Novartis e tem a colaboração da Associação de Apoio aos Doentes com Insuficiência Cardíaca, da Fundação Portuguesa de Cardiologia, da Portugal AVC, da Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral, da Sociedade Portuguesa de Aterosclerose e da Sociedade Portuguesa de Cardiologia. É um conteúdo editorial completamente independente.

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