13 de Janeiro pode ficar na história partidária: o dia em que o PSD deixou de competir com o PS e passou a concorrer com o PCP e o BE, como mais um pequeno lóbi da governação socialista. A confirmar-se essa opção, a alternância de orientações governativas em Portugal dependerá a partir de agora, não da rotação de partidos no governo, mas da capacidade de pressão e de persuasão dos vários grupos parlamentares junto dos ministros do PS. Pensem, por exemplo, na educação. Até ao fim de semana passado, para mudar a política de educação, o PSD lutava para substituir o governo de António Costa; a partir de sábado, lutará apenas para que António Costa substitua o ministro. Um tempo novo, sem dúvida.

Devo, porém, admitir que Rui Rio possa ter razão. Nos últimos vinte e três anos, desde 1995, o PSD esteve na oposição durante quinze anos, e só governou quando não havia dinheiro. Nunca, por isso, teve meios para competir com o PS na distribuição dos favores do Estado. Perdeu câmaras municipais, perdeu militância — só 25 mil militantes tinham as quotas em dia o ano passado, e mesmo depois dos pagamentos em massa de última hora, não votaram mais do que 41 mil, apesar do esforço heroico das carrinhas da cacicagem. No fim dos anos 70, o PSD de Sá Carneiro encabeçou um movimento reformista da sociedade civil. Hoje, a sociedade portuguesa está envelhecida e endividada. Talvez Rio esteja portanto certo, e seja tempo de o PSD desistir, terminar a sua carreira na primeira liga, e ingressar na segunda divisão. Os caciques das carrinhas pensam como ele. Mas será a vida mais fácil entre os pequeninos?

A primeira questão diz respeito à marca PSD. Para ser aceite como comensal pelos socialistas, importa ao PSD fazer-se passar por alguém da mesma família: um partido de “centro-esquerda”, “social democrata”. Nesse sentido, aliás, não irá combater a “frente de esquerda”, mas apenas discutir a configuração da “frente de esquerda”. Por outro lado, no entanto, o PSD precisará de uma “bandeira” própria, como todos os grupos de lóbi, para se justificar e diferenciar. A sua especialidade será provavelmente, à falta de melhor, o “défice zero”. Teremos portanto um PSD de “esquerda”, mas que de facto funcionará, dentro do regime socialista, como o lóbi da “austeridade”. Que sucesso eleitoral esperar para uma marca com horizontes tão cinzentos?

A segunda questão é esta: qual a previsível capacidade desse lóbi parlamentar para influenciar o PS? O PS é hoje duas coisas: por um lado, o clã das famílias e dos amigos que rodearam José Sócrates em 2005-2011; por outro lado, o “Partido-Estado” do regime, uma espécie de Frelimo ou de MPLA à portuguesa. Ou seja, nunca o PS foi tão pequeno na sua composição social e ideológica, e nunca o PS foi tão grande no seu poder e influência. Por isso, por mais que Francisco Assis estrebuche, é duvidoso que o clã socrático aceite um “Bloco Central” ou que dê sequer um qualquer tratamento preferencial ao pequeno lóbi de Rui Rio — mesmo que em 2019 um Rio desesperado lhes explique que, para sobreviver, precisa de ir para o governo, como Costa em 2015. Para quê dividir ministérios e direcções gerais, se for possível guardar tudo com o amparo parlamentar do PCP e do BE, os quais, com a concorrência do PSD, talvez ainda se portem melhor?

Em suma, dificilmente esta última manobra de caciques do PSD para se pendurarem no Estado socialista será um sucesso. O mais provável é que acabem apenas por privar o regime de uma força partidária capaz de protagonizar uma alternativa. Veremos se Rio tem razão e a sociedade portuguesa se conforma com esse vazio.

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