Deste nome ainda ninguém se tinha lembrado: e se a candidata a Belém fosse Manuela Ferreira Leite? Mais estranho ainda: e se a sugestão viesse de um militante socialista? Verdade: o mote foi lançado pelo ex-dirigente do PS Pedro Adão e Silva e parece recolher os primeiros apoios nas fileiras do PSD e do PS. “Candidata forte e com influência”, atira João Cravinho; “Solução ideal”, assume António Capucho. Bloco central entre Belém e São Bento?

Num artigo de opinião publicado no Expresso, Pedro Adão e Silva defendeu que, perante uma eventual vitória de António Costa, o ainda presidente da Câmara Municipal de Lisboa teria mais a ganhar em ter Manuela Ferreira Leite em Belém porque alargaria “o espaço de influência” do PS, abrindo um consenso político mais amplo do que, acredita Adão e Silva, se levasse para Belém “alguém que reproduza a base social de São Bento”.

Sobretudo quando é necessário um “compromisso político” entre as duas maiores forças políticas para “ultrapassar o bloqueio em que se encontra o país”, escreveu Adão e Silva.

Bastou a sugestão para uma parte do país político se agitar. Ao contacto do Observador, Ferreira Leite nada quis dizer. Mas uma fonte próxima da ex-ministra mostra pouca surpresa com a ideia do socialista: “Quando alguém anda nesta vida, é normal que seja considerado para isto ou para aquilo. Quando alguém expõe as suas ideias e luta contra o que acha que está errado, isso é quase inevitável”, diz a mesma fonte.

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A questão, porém, é o que dirá Ferreira Leite quando for questionada esta quinta-feira na TVI24, onde é habitual comentadora. Os seus mais próximos guardam o jogo.

Uma corrida de obstáculos (dos dois lados)

Paulo Mota Pinto, ex-mandatário da candidatura de Ferreira Leite à liderança do PSD, foi um dos que recusaram comentar uma eventual candidatura da ex-ministra. Outros, como Paulo Rangel, seu ex-líder parlamentar, também preferem nada dizer.

Há porém, entre os sociais-democratas mais próximos da antiga líder quem aceite falar sob anonimato. Dois desses ex-dirigentes dizem ser “muito improvável” ou “impossível” uma candidatura da ex-líder. “Mesmo que fosse para acontecer, o facto de a sugestão vir do lado do PS diminui logo a candidatura”, diz um deles. E, no fim das contas, “o PS não a apoiará nunca e este PSD também não”, concordam estas fontes.

Mas há quem, vindo do mesmo partido, quem não tenha dúvidas em dar-lhe já esse apoio. Exemplo de António Capucho que  descreve Manuela Ferreira Leite como “a solução ideal para Presidente da República”. Nunca foi uma “seguidista da linha do partido. Quando gosta, gosta, quando não gosta critica. Tem total autonomia e independência”, argumenta Capucho, que entregou o cartão de militante do PSD há dois anos.

Significa isto que entre os críticos de Passos Ferreira Leite colhe apoios? É possível. Mesmo no PS, como atesta João Cravinho: apesar de insistir que não é “proponente de uma potencial candidatura de Manuela Ferreira Leite”, Cravinho elogia os argumentos de Pedro Adão e Silva e admite que a ex-governante “tem um perfil para ser uma boa candidata” a Belém. E qual é o principal trunfo de Ferreira Leite? O facto de “não se identificar exclusivamente com o universo PSD” e, por isso, ser capaz de lançar as pontes entre as várias forças políticas.

Claro que daqui até haver um apoio da direção do PS vai um caminho enorme – mais difícil ainda quando a moção de António Costa ao último congresso aponta para um perfil bem definido para rumar às presidenciais: um militante ou de alguém da área política do PS.

Um programa comum?

Mas há coincidências a anotar nesta proposta com apoios comuns. Um exemplo: Ferreira Leite, Cravinho e Capucho estão entre os subscritores do manifesto 74, lançado em março de 2014 que defende a reestruturação da dívida pública portuguesa. Um documento muito criticado por Passos Coelho, também por Paulo Portas.

Ferreira Leite não se tem coibido de criticar, semana após semana, várias opções do Governo. Também as opções da troika, tomadas nos três anos de ajustamento.

José Silva Peneda, também ele ex-ministro de Cavaco Silva, ainda presidente do Conselho Económico e Social, também ele muitas vezes crítico da governação de Passos, é cauteloso no que respeita ao futuro da ex-líder do PSD.

“É um assunto sério e como não tenho mais elementos sobre isso não quero comentar. A própria é que tem que dizer se quer ou não. Não faço ideia”, respondeu ao Observador.

E os outros à direita?

Mas é claro, neste jogo das presidenciais há outros nomes no caminho. Um deles, não muito distante do mundo de Ferreira Leite. É Rui Rio, que uma fonte social-democratas anota poder construir as mesmas “pontes” entre a direita e a esquerda num próximo ciclo político. Rui Rio com quem, aliás, o secretário-geral do PS, António Costa, mantém uma boa relação.

E o que diz o outro pré-candidato da mesma área às presidenciais? Em declarações aos jornalistas no sábado, Marcelo Rebelo de Sousa atribuiu a proposta de Pedro Adão e Silva a uma estratégia que está a ser utilizada tanto à esquerda como à direita para criar a “confusão” no adversário.

“À direita há um grande gozo com a multiplicação de nomes de candidatos possíveis à esquerda (…). Quanto mais [candidatos] forem, mais perturbam. À direita, a mesma coisa: porque é que não pode ser Pedro Santana Lopes, mais Rui Rio, mais Marcelo Rebelo de Sousa, e então se for possível mais Manuela Ferreira Leite? E, por que não, Paulo Portas? (…) Eu acho que isso faz parte do jogo. Um jogo tático [que tem como objetivo] desgastar as figuras de um lado e do outro”, defendeu Marcelo Rebelo de Sousa.

Ainda assim, numa altura em que a corrida a Belém parece ser pequena demais para tantos candidatos, quer à esquerda, quer à direita, conseguiria Ferreira Leite agradar a gregos e a troianos, que é como quem diz recolher o apoio de socialistas e social-democratas? António Capucho acredita que sim, que a antiga líder do PSD “seria uma candidata muito forte no centro do espetro político”. Mesmo numa altura em que o PSD “não morre de amores por ela”. São conhecidas as críticas duras que a ex-ministra das Finanças tem feito a este Governo, desde os cortes às pensões de reforma à forma como soube (ou não) negociar com a troika.

Um problema que ficaria resolvido se Manuela Ferreira Leite “decidisse avançar e lançasse a candidatura de forma atempada”. Aí, sublinhou Capucho, “não haveria candidato social-democrata à altura, salvo em duas situações: caso Rui Rio decida avançar, ainda que eu prefira vê-lo a encabeçar uma alternativa a Passos Coelho, ou caso Marcelo Rebelo de Sousa avance, mas ele parece não estar para aí muito virado”.