Os atletas em todo o mundo que vão disputar os Jogos Olímpicos de Inverno em Pequim foram alertados para não proferirem discursos de oposição à China e para optarem por levar telemóveis descartáveis quando forem representar os seus países na capital chinesa.

Várias organizações de direitos humanos e grupos de apoio a atletas avisaram ainda os participantes para não contarem com o apoio do Comité Olímpico Internacional.

“Tenho a certeza que qualquer expressão em linha com o espírito Olímpico será protegida, e todo o comportamento ou discurso contra o espírito Olímpico, especialmente contra as leis e regulamentos chineses, serão também sujeitos a um certo castigo“, afirmou a vice-diretora do Departamento de Relações Internacionais dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2022, Yang Shu, citada pela BBC.

Yaqiu Wang, uma representante da Human Rights Watch na China, explicou ao The Guardian que o desaparecimento da tenista chinesa Peng Shuai foi “um bom indicador do que poderá acontecer” caso os atletas profiram discursos contra o regime chinês.

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As leis chinesas são bastante vagas em relação aos crimes que podem ser utilizados para condenar os discursos das pessoas”, explicou. “As pessoas podem ser acusadas de incitar brigas ou provocar problemas. Existe uma variedade de  crimes que podem ser agregados a discursos críticos e pacíficos, além de que na China a taxa de condenação é de 99%”, concluiu.

A diretora da mesma organização na China, Sophie Richardson, explicou que embora tenha sido notória a tecnologia utilizada pelas autoridades chinesas nos Jogos Olímpicos de 2008, que mesmo essa tecnologia está completamente datada, tal como escreve o The Guardian, em comparação com o atual “Estado de vigilância Orwelliano” .

As autoridades em todo o país utilizam atualmente ferramentas como Inteligência Artificial e policiamento preditivo, bases de dados da Big Data, vigilância extensiva nas redes sociais, o que impede as pessoas de terem certo tipo de discussões. Quem viajar para o país por causa dos Jogos [Olímpicos de Inverno] — jornalistas, atletas, treinadores — tem de ter atenção ao tipo de vigilância de que pode ser alvo”.

O esquiador norte-americano Noah Hoffman já afirmou que a equipa dos Estados Unidos da América alertou os seus atletas para não abordarem assuntos relacionados com direitos humanos para sua própria segurança.

Rob Koehler, diretor da Global Athlete, a maior organização de apoio a atletas, exigiu ao Comité Olímpico Internacional que anunciasse o seu apoio aos concorrentes que defendem causas de direitos humanos. “O silêncio revela cumplicidade e é por isso que estamos apreensivos. Portanto, estamos a aconselhar os atletas a não se manifestarem. Queremos apenas que eles compitam, e que utilizem a sua voz quando regressarem a casa”.

Atletas aconselhados a levar telemóveis descartáveis para Pequim

Vários grupos de cibersegurança, como o “Citizen Lab”, ou a firma “Internet 2.0”, já aconselharam os atletas a levar telemóveis descartáveis quando viajarem para a China.

Isto por considerarem que a aplicação oficial dos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim, a My2022, tem várias falhas de segurança que deixam expostos os dados dos seus utilizadores.

A aplicação foi desenvolvida para monitorizar o estado de saúde diário de cada indivíduo em relação à Covid-19, mas oferece igualmente outras ferramentas como conversas de voz, transferência de ficheiros e ler notícias sobre os Jogos Olímpicos de Inverno.

Num relatório, o Citizen Lab, segundo a BBC, afirma ter encontrado uma lista de censura com palavras-chave, assim como uma opção que permite aos utilizadores sinalizarem outras expressões politicamente sensíveis. Nesta lista estão incluídos os nomes de vários líderes chineses, agências do governo da China, assim como referências ao massacre da Praça de Tiananmen.

Já a firma Internet 2.0, também segundo um relatório a que o canal britânico teve acesso, aconselha não só ao uso de telemóveis descartáveis, como também a criar novos emails específicos para utilizar durante a estadia em Pequim. Segundo as leis de segurança da China, as autoridades podem requisitar o acesso a dados de qualquer indivíduo.

As leis de segurança nacional de dados da China não foram projetas segundo os valores ocidentais de privacidade e liberdade e não oferecem o mesmo nível de proteção”, concluiu o relatório da Internet 2.0.

Todos os visitantes dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2022 são obrigados a instalar a aplicação 14 dias depois da sua partida para a China. Além disso, terão de colocar na aplicação dados pessoais como detalhes de passaporte e históricos médico e de viagens.