Há um ano, Joe Biden, com a mão sobre a Bíblia, jurou “preservar, proteger e defender” a Constituição dos Estados Unidos, tornando-se assim o 46º Presidente dos norte-americanos. Entre a poesia de Amanda Gorman e um discurso sobre “unir o país e sarar a América”, a tomada de posse teve as suas peculiaridades:  Donald Trump faltou, como avisou que faria, já que não aceitava a derrota; e Kamala Harris foi a primeira mulher, e de ascendência africana e asiática, a tomar posse como vice-presidente do país.

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Há um momento indiscutivelmente marcante no ano de presidência de Joe Biden: a saída do Afeganistão, ou pelas palavras do próprio, “acabar com a guerra mais longa da América”. “Quantas gerações mais de filhas e filhos da América gostariam que mandasse para lutar na guerra civil do Afeganistão, quando as tropas afegãs não o farão?”, questionou, numa altura em que a decisão unlilateral chocava os aliados, acendia um coro de críticas de grandes líderes mundiais e a vida dos afegãos — principalmente das afegãs–  debaixo do regime fundamentalista talibã afligia a Europa.

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Porém, o desconforto mundial não o abalou, insistindo sempre que foi a decisão “correta” e que a solução para aquele país não passa por “intervenção militar”, mas sim por “pressão diplomática”.

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Ao mundo prometeu lutar contra o autoritarismo, estando de olho no “Eixo do Mal”: Rússia, China, Irão, entre outros. Não hesitou quando teve de tomar partidos: sete anos após a anexação da Crimeira, permanece ao lado da Ucrânia, afirmando que “nunca reconhecerá a suposta anexação da península” pela Rússia; reivindica uma “desnuclearização completa”  da Coreia; impôs sanções a Cuba, condenando “inequivocamente” as sentenças injustas que levaram para a prisão “todos aqueles que ousaram protestar contra aqueles que querem silenciar o povo cubano”; e reconhece a soberania de Taiwan e de Hong-Kong, defendendo a sua liberdade e democracia.

Já dentro das fronteiras norte-americanas, fez de um tema de campanha uma promessa cumprida: voltou a assinar o Acordo de Paris. O combate às alterações climáticas, que Biden descreve como “uma ameaça existencial” de largo espectro, foi das primeiras linhas vermelhas que traçou para se distinguir do antecessor. Para ele, a “ciência é inegável” e é necessário “preservar o planeta”. Aliás, basta olhar para os desastres naturais, desde tornados a incêndios, que tornam cidades norte-americanas irreconhecíveis e deixam milhares desalojados.

Sucederam-se decisões de Trump derrubadas, algumas logo nas primeiras horas de Joe Biden como Presidente: revogou um relatório que pretendia promover a “educação patriótica” nas escolas— os historiadores criticaram amplamente o documento, que apresentava uma versão falsa e desatualizada da história norte-americana, ignorando décadas de investigação; reverteu a proibição que impedia as pessoas transgénero de ingressarem nas Forças Armadas dos EUA; retirou o pedido de anulação da lei de saúde Obamacare.

Apesar de ter parado a construção e cancelado as verbas para a construção do muro com o México, vozes críticas não distinguem muito a sua política de migração e as imagens das péssimas condições em que os migrantes eram mantidos nos centros de detenção não vieram ajudar.

Ainda na senda de desfazer decisões da administração anterior, revogou a decisão de banir a rede social Tik Tok, deixando-a numa lista de aplicações controlados por estrangeiros que podem representar um risco de segurança para os americanos e os seus dados. Pelo meio, a mensagem era clara: o que considerou serem os retrocessos da era Trump, nome que não pronunciou durante o seu discurso de tomada de posse, não passariam dali.

A pandemia não lhe deu, porém tréguas, apesar dos progressos feitos com a vacinação.  Os EUA continuam a ser um dos países com maior número de casos e de mortos por um milhão de habitantes. Ainda no início de janeiro bateu o máximo mundial com um milhão de casos num dia liderando no número médio de mortes diárias — uma em cada cinco — e de infeções — 4 em cada cinco — no globo. (Dados da universidade John Hopkins e da Reuters)

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A escalada da inflação, que subiu para 6,8% — a marca mais alta desde 1982 — pode deitar por terra grande parte do plano económico de Biden, e é preciso esperar por março para assistir à reação dos mercados às medidas tomadas pela Reserva Federal para conter a escalada de preços.

Um ano depois, Biden admitiu que vai recandidatar-se, mesmo sabendo que a sua taxa de aprovação pelos norte-americanos situa-se nos 44%, um mínimo histórico desde que assumiu o cargo, e 60% discorda da gestão económica e 55% discorda da da pandemia. Mesmo dentro do próprio partido, encontrar um equilíbrio entre os moderados e os progressistas revelou-se um enorme desafio.