Nervis Villalobos, ex-vice-ministro da Energia da Venezuela entre 2004 e 2006, diz que está a ponderar “intentar uma ação contra o Estado Português para exigir uma indemnização por todos os danos (patrimoniais e não patrimoniais)” pela “atitude persecutória” de que diz estar a ser vítima por parte da justiça portuguesa, lê-se num comunicado enviado ao Observador.

Para já, Villalobos diz que já “apresentou uma queixa disciplinar” contra a procuradora-geral adjunta Olga Barata, junto do diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP).

Olga Barata é a magistrada que assinou a última acusação do caso Universo Espírito Santo, revelada em exclusivo pelo Observador, e que visa precisamente 19 ex-responsáveis venezuelanos que terão sido alegadamente corrompidos por Ricardo Salgado, ex-líder do Banco Espírito Santo (BES), para investirem em títulos de dívida das várias holdings do Grupo Espírito Santo (GES) e para colocarem avultados fundos no BES e assinarem contratos de intermediação financeira entre a Petróleos da Venezuela (PDVSA) e o BES.

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Um desses ex-responsáveis terá sido Rafael Ramirez, ex-ministro da Energia e presidente da PDVSA entre 2004 e 2014. A investigação do DCIAP permitiu à procuradora-geral adjunta Olga Barata sustentar na sua acusação de que terá sido através da sociedade offshore Canaima Finance Limited que Salgado terá alegadamente pago a Ramirez cerca de 47,8 milhões de dólares (43, 6milhões de euros segundo o câmbio atual) via saco azul do GES e entre 2009 e 2014.

Este valor está bloqueado à ordem do processo criminal aberto pelo DCIAP.

Segundo a acusação do DCIAP, uma equipa do Grupo Espírito Santo liderada por Ricardo Salgado terá criado um conjunto alargado de sociedades offshore e aberto as respetivas contas bancárias no Espírito Santo Bankers, um banco do GES no Dubai. Por serem pessoas politicamente expostas, os nomes dos verdadeiros beneficiários desses fundos tiveram de ser ocultados nos registos do banco do GES, violando-se assim a lei de combate ao branqueamento de capitais existente na União Europeia e também nos Emirados Árabes Unidos.

No caso da sociedade offshore Canaima Finance Limited, o nome do beneficiário formal era Milagros Coromoto Torres Moran, mulher de Nervis Villalobos, segundo a acusação.

O DCIAP sustenta na acusação que tudo isto foi feito com o conhecimento de Rafael Ramirez, sendo que Nervis Villalobos seria apenas um testa-de-ferro do então todo-poderoso ministro da Energia e presidente da PDVSA.

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Nervis Villalobos foi detido em Espanha em 2018 por suspeitas de corrupção e branqueamento de capitais devido a transferências de 124 milhões de euros para um pequeno banco de Andorra,  e está igualmente sob investigação nos Estados Unidos devido a um outro alegado esquema de corrupção que já foi noticiado pelo Observador (ler aqui e aqui).

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As autoridades norte-americanas tentaram mesmo a sua extradição e, apesar de um primeiro pedido ter sido aceite pela Justiça espanhola, acabou mais tarde por ser revogado como referem os jornais El País e El Mundo.

O que diz Nervis Villalobos? “Nunca fui assessor formal ou informal de Rafael Ramirez”

Nervis Villalobos nega no seu comunicado que seja um alegado testa-de-ferro de Rafel Ramirez e diz que os factos que lhe são imputados na acusação são “totalmente falsos”.

“A procuradora-geral adjunta, dra. Olga Barata, refere-se ao declarante várias vezes na acusação, afirmando que ele era empregado da PDVSA e “assessor informal” do Sr. Rafael Ramírez e que, por supostas transações entre a PDVSA e o GES, recebeu o montante de 48 milhões de euros, factos que são totalmente falsos. Estas, entre outras afirmações da procuradora, envolvem uma investigação prospetiva ou uma investigação de direito penal, em que a investigação não incide sobre factos, mas sobre a forma de acusar uma pessoa”, lê-se no comunicado.

“Nervis Villalobos nega e repudia veementemente as afirmações contidas no escrito de acusação. Nunca foi empregado da PDVSA, nem ocupou cargo algum nessa empresa, nem teve poderes, expressos ou tácitos. Nunca foi assessor formal ou informal do Sr. Rafael Ramírez” e “nunca entregou dinheiro — muito menos 48 milhões de euros no âmbito das transações que supostamente facilitou ou intermediou, enquanto assessor do sr. Rafael Ramírez e funcionário da PDVSA, entre a PDVSA e empresas do GES”, afirma.

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O ex-vice-ministro da Energia venezuelano recorda no seu comunicado que “não foi imputado neste caso”, tendo a procuradora-geral adjunta Olga Barata ordenado o “arquivamento do caso por não ter encontrado provas de que ele tenha cometido algum delito em território português”.

“Nervis Villalobos tem a firme convicção de que a justiça portuguesa, em particular a Procuradora-Geral Adjunta, Dra. Olga Barata, responsável pela investigação acima identificada, adotou uma atitude persecutória contra ele, violando intoleravelmente os seus direitos de defesa e a presunção de inocência”, acusa.

“Além das falsas acusações contidas no escrito de acusação, a perseguição a Nervis Villalobos manifesta-se no facto de que a Procuradora-Geral Adjunta solicitou ao Tribunal que declare confiscados a favor do Estado os fundos, apreendidos desde 2017, que Nervis Villalobos e as pessoas e empresas vinculadas a ele possuem em contas bancárias abertas em bancos portugueses. E isto apesar de Nervis Villalobos não ter sido acusado de nenhum delito e de que, evidentemente, não há provas de que os fundos das supostas transações com o GES tenham sido transferidos para essas contas bancárias”, lê-se ainda no comunicado.