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Saiu das eleições deste domingo uma Assembleia da República “bloqueada”, dizem as agências de rating, já que nenhum partido obteve uma maioria clara. Em tal cenário, as mesmas agências admitem que o Chega, um partido que descrevem como sendo de “extrema-direita”, pode funcionar como “fazedor de reis”, isto é, o partido que tem a chave para a formação de um Governo mais sólido.

A agência S&P assinalou, num comentário divulgado esta tarde de segunda-feira que, apesar da vitória da Aliança Democrática (AD), esta coligação de centro-direita e o Partido Socialista (PS) obtiveram um número muito próximo de deputados – 79 contra 77, respetivamente, sem haver ainda os deputados da emigração.

É neste contexto que “o partido de extrema-direita Chega pode ser o fazedor de reis [a expressão anglo-saxónica kingmaker] em eventuais negociações para criar o próximo Governo” – isto depois de o partido de André Ventura ter “quadruplicado a sua representação parlamentar para 48 deputados”.

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A mesma expressão – kingmaker – já tinha sido utilizada algumas horas antes por outra agência – a DBRS Morningstar, que também é uma das quatro agências reconhecidas pelo Banco Central Europeu (BCE). Também a DBRS admitia “a possibilidade de que [o Chega] poderá assumir o papel de fazedor de reis na formação de um governo de centro-direita“. Isto mesmo tendo Luís Montenegro garantido, novamente, que não pretende um acordo parlamentar com o Chega.

We are not far right

We are not far right“, ou seja, “não somos de extrema-direita”. Quem o garantiu foi André Ventura, no domingo das eleições, aos microfones dos jornais internacionais que o entrevistaram minutos depois de o líder do Chega votar. Ventura recusou a qualificação, mas é assim que o Chega é referido por estas duas agências de rating, entidades que fazem análise de risco de crédito de países e empresas para informar os investidores sobre o risco de investir na dívida desses mesmos países e empresas.

“O partido de extrema-direita foi o principal beneficiário da forte queda do PS nas urnas de voto”, escreveu a DBRS, salientando a “significativa perda de votos por parte dos dois partidos do centro”.

“We are not far right”, afirmou André Ventura, questionado por um jornalista estrangeiro que o descreveu como tal.

A eleição de 10 de março criou um cenário que, para a DBRS, pode ser difícil para o Governo aprovar legislação. E, a confirmar-se essa suspeita, “no final deste ano ou no início do próximo” pode haver novas eleições antecipadas em Portugal. Isso não parece preocupar muito esta agência de rating já que a DBRS acredita que um governo liderado por Luís Montenegro irá “continuar a aplicar uma política orçamental prudente” e “manter a redução da dívida pública”, potencialmente “usando a margem orçamental que exista para reduzir impostos”

Mais do que a questão orçamental, o que preocupa a agência de rating é o facto de ter saído das eleições um parlamento “bloqueado”, sem maioria clara e com um Governo potencialmente “instável” que torne mais complicada a execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

Na nossa opinião, mais do que nas finanças públicas, o risco mais claro a curto prazo é um possível atraso na implementação das reformas e investimentos do Plano de Recuperação e Resiliência de Portugal”, diz Javier Rouillet, vice-presidente da DBRS Morningstar.

O ainda ministro das Finanças, Fernando Medina, sublinhou esta segunda-feira em Bruxelas, à entrada para uma reunião do Eurogrupo, que não foi ele que convocou eleições antecipadas mas, tendo sido marcadas e realizadas, agora não resta grande alternativa a Portugal que não… “esperar”. “Agora é esperar que o país tenha de novo Governo e em plenitude de funções, com capacidade de mobilizar uma máquina administrativa, com a complexidade da máquina portuguesa, e que tudo retome uma velocidade elevada como estava a ter”, afirmou.

Atrasos no PRR? Fernando Medina diz que não foi ele quem convocou novas eleições.

Ainda assim, a agência de rating S&P mostra-se confiante de que todo este processo “não deverá perturbar” o desembolso dos 13,7 mil milhões que ainda falta entregar a Portugal, que correspondem a 65% do valor do plano europeu de investimentos lançado após a pandemia. A S&P também acredita, tal como a DBRS, que o Governo que vier a ser formado “irá manter a mesma prudência orçamental que tem existido“.

A S&P salienta que existe um orçamento do Estado em vigor, o que funciona como um fator que mitiga a incerteza que poderia existir num cenário de eleições sem maioria absoluta. E a expectativa desta agência de rating é que Portugal “continue a registar pequenos excedentes orçamentais no horizonte próximo, entre 2025-2027“.

Esta tranquilidade demonstrada pelas agências de notação financeira, em relação a Portugal, poderá ter contribuído para que não tenha havido qualquer reação discernível nos mercados de dívida pública, em relação às obrigações do Tesouro. A taxa implícita nas obrigações a 10 anos agravou-se em cinco pontos-base, para 2,99%, mas foi um movimento alinhado com o ligeiro agravamento dos juros também de países como Espanha e Itália – num dia em que até a dívida alemã viu as taxas agravarem-se em três pontos-base.

O Observador questionou, também, a agência Moody’s, que não se disponibilizou a comentar. Já a Fitch, também contactada, não pode emitir opiniões porque está a poucos dias da revisão periódica do rating de Portugal, publicação que está agendada para a sexta-feira 22 de março.