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No Rio de Janeiro bateu-se o recorde de sensação térmica de 60,2º. Até quanto calor aguenta o corpo humano?

O fim do verão no Brasil traz a expectativa de temperaturas mais baixas, depois de uma onda de calor em que os termómetros rondaram os 40.ºC. Afinal, como reage o corpo a temperaturas muito elevadas?

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A última semana de verão trouxe ao Brasil uma onda de calor marcada por temperaturas 5.ºC acima da média em vários estados brasileiros. O calor sufocante não deu tréguas e no fim de semana o Rio de Janeiro atingiu um novo recorde: uma sensação térmica de 62,3.º C — a mais elevada desde o início dos registos, em 2014 –, apesar de os termómetros não terem ultrapassado os 40.ºC.

A incidência maior de ondas de calor e o aumento da temperatura têm sido descritos como o “novo normal” no Brasil, palavras da coordenadora do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Geografia do Clima (GeoClima), Núbia Beray. Só nos primeiros três meses do ano registaram-se três vagas de calor. Estes episódios não se limitam ao Brasil e são vários os pontos do globo em que se vão registando temperaturas extremas. Mas como lida o corpo humano com estas temperaturas e o que podemos esperar este ano?

Como é que o calor extremo afeta o corpo humano?

Em Guaratiba, bairro na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro e formado por bairros pobres e periféricos, foi medida no domingo de manhã uma sensação térmica de 62,3ºC. Em declarações à imprensa brasileira, os moradores queixavam-se da falta de água para beber e descreviam uma “sensação horrível” devido à temperatura elevada.

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Numa situação como esta, os sistemas mais afetados são o cardíaco e o respiratório, que estão interligados. “As alterações respiratórias potenciam as cardíacas e vice-versa”, começa por explicar ao Observador o pneumologista Agostinho Marques, vice-presidente da Fundação Portuguesa do Pulmão.

O desconforto ao respirar é um dos principais problemas e é transversal às diferentes camadas da população, já que “mesmo as pessoas completamente saudáveis perdem a eficiência na respiração”, refere. É que o excesso de calor, que provoca a perda de água e sais minerais, faz com que os próprios músculos necessários à respiração se tornem menos eficientes.

[Já saiu o quarto episódio de “Operação Papagaio” , o novo podcast plus do Observador com o plano mais louco para derrubar Salazar e que esteve escondido nos arquivos da PIDE 64 anos. Pode ouvir o primeiro episódio aqui, o segundo episódio aqui e o terceiro episódio aqui]

Que mecanismos existem para regular a temperatura corporal?

Chama-se sistema homeostático e comanda e mantém tudo em equilíbrio para nos manter vivos, incluindo a temperatura. “É um sistema complexo e que trabalha harmoniosamente para tentar manter a temperatura dentro dos níveis que permitem sobreviver”, diz o cardiologista Manuel Carrageta. É sobretudo ao nível do aparelho cardiovascular e da pele que se vai estabelecer o equilíbrio da temperatura interna. Mas, ressalva o médico, isso faz-se à custa de um “grande esforço”.

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Na onda de calor do Rio de Janeiro foi registada uma sensação térmica de 62,3.º C

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“Os pequenos capilares da pele dilatam muito, dá-se também o aumento da sudação. Isso exige uma sobrecarga do aparelho cardiovascular e o coração começa a trabalhar mais depressa e com mais força porque tem que fazer circular o sangue mais ativamente pela rede de vasos capilares, os pequenos vasos à superfície da pele”, refere. Tudo isto é uma sobrecarga para o nosso organismo e gera vários desequilíbrios, levando à desidratação e à perda de sais minerais, nomeadamente de potássio. No extremo, “pode levar a arritmias e pode levar a morte”.

Para além do aumento dos batimentos cardíacos, verifica-se também um aumento dos movimentos respiratórios. “Nós respiramos 16 a 18 vezes por minuto, e o número de movimentos respiratórios aumenta muito, para lá dos 30, como se estivéssemos a fazer um grande esforço”, acrescenta o pneumologista Agostinho Marques.

Quais são os grupos de risco?

São, já se sabe, os mais frágeis, em particular as crianças, os idosos e pessoas com doenças crónicas. “São todos aqueles que não têm o sistema homeostático, o aparelho cardiovascular e renal a funcionar em pleno. É o caso das crianças e depois das pessoas mais velhas, que já têm um sistemas mais gasto — já que muita função se vai perdendo a partir dos 35 anos e em geral os nossos órgãos perdem cerca de 1% ao ano”, refere o cardiologista Manuel Carrageta.

A Direção-Geral da Saúde, que descreve a exposição a períodos de calor intensos como as onda de calor como uma “agressão para o organismo”, deixa uma série de recomendações específicas para a população e em particular para estes grupos. Aconselha, nomeadamente, a que se procure ambientes frescos e arejados; a que se beba água com regularidade e mesmo que não se tenha sede e se evite a exposição direta ao sol nas horas de maior calor.

As recomendações da DGS para dias de temperaturas elevadas

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  • Procurar ambientes frescos e arejados;
  • Beber água ou sumos naturais com regularidade e mesmo que não tenha sede;
  • Evitar o consumo de bebidas quentes, alcoólicas, gaseificadas, com cafeína e ricas em açúcar;
  • Evitar a exposição direta ao sol nas horas de maior calor, nomeadamente entre as 11h e as 17h;
  • Aplicar protetor solar com fator 30 ou superior de 2 em 2 horas
    usar roupas leves, soltas e de cor clara e preferencialmente de algodão e utilizar chapéu e óculos de sol;
  • Evitar atividades que exijam grandes esforços físicos, como desporto e atividades no exterior;
  • Não permanecer dentro de viaturas estacionadas e expostas ao sol;
  • Fazer refeições leves e comer mais vezes ao dia;
  • Ter uma atenção especial face aos grupos de pessoas mais vulneráveis ao calor.

“Se as pessoas se expõem ao sol e fazem esforços, quer dizer, isso pode ser fatal. Nestas alturas uma pessoa tem que se abrigar num lugar à sombra, fresco, hidratar-se, beber bastantes líquidos e não fazer esforços. São medidas de defesa”, sublinha o médico.

Qual a temperatura máxima que o corpo humano suporta?

A tolerância humana ao calor extremo não depende somente dos valor da temperatura. Importam também fatores como a humidade, mas também a idade, o estado de saúde e as características de cada pessoa, lembra o cardiologista Manuel Carrageta. Entre a comunidade científica vários tentaram testar e quantificar os limites da sobrevivência humana e para isso tem-se estudado a “temperatura de bulbo húmido”. Inicialmente medida cobrindo a ponta do termómetro com um pano embebido em água, esta reflete a forma como o corpo humano arrefece com o suor.

Um estudo de 2010 publicado na revista científica norte-americana National Academy of Sciences estimou que a temperatura de bulbo húmido de 35.ºC seria, em teoria, o limite para a adaptabilidade humana ao calor extremo e que caso essa temperatura persistisse durante períodos prolongados poderia induzir hipertermia e no extremo levar à morte.

Uma investigação mais recente, publicada há dois anos no Journal of Applied Physiology, aponta noutro sentido. “Foi teorizado que uma temperatura de bulbo húmido de 35°C seria o limite da adaptabilidade humana ao calor extremo, uma preocupação crescente face às contínuas e previstas alterações climáticas aceleradas. Embora este limiar teorizado tenha por base princípios fisiológicos, não foi testado utilizando dados empíricos. O nosso estudo examinou a temperatura crítica de bulbo húmido na qual o stress térmico se torna incompensável em adultos jovens e saudáveis que executam tarefas em taxas metabólicas modestas, imitando atividades básicas da vida diária”, começa por clarificar.

Os investigadores avaliaram em laboratório a reação de indivíduos a ambientes húmidos com temperaturas do ar entre 36.ºC e 40.ºC. A conclusão foi que o stress térmico incompensável em ambientes húmidos se verifica em adultos jovens e saudáveis em temperaturas de bulbo húmido muito inferiores aos 35.ºC. Os investigadores apontavam que o limite para o stress térmico não é um número fechado, mas estaria dependente de diferentes combinações de temperatura de ar e humidade relativa. Estimavam ainda assim que os limites da adaptabilidade do organismo humano ao calor estariam na verdade mais perto da temperatura de bulbo húmido à volta de 31.ºC. Numa situação real, isto pode traduzir-se, por exemplo, num ambiente com uma temperatura do ar de 38.ºC e 60% de humidade relativa do ar.

As ondas de calor provocam um aumento da mortalidade?

Nas ondas de calor há sempre um aumento de mortalidade, refere o pneumologista Agostinho Marques, acrescentando que nem sempre se tem consciência imediata da proporção. “Se um doente tem um problema de coração e num momento destes morre, a declaração de óbito vai dizer que ele morreu por descompensação da doença cardíaca. Não fica registado como sendo relacionado com o calor diretamente. Mas depois quando se olha para os grandes números de uma população de uma região qualquer vê-se que há um aumento grande relacionado com um fator único que é o calor. Mata, de facto, muita gente”, refere.

As vagas de calor que varreram a Europa no verão de 2022, por exemplo, podem ter provocado mais de 61 mil mortes, segundo um estudo publicado no ano passado na revista Nature Medicine. A taxa de mortalidade mais elevada verificou-se em Itália, na Grécia, em Espanha e em Portugal (2.212 mortes). Um outro, divulgado no final de 2023, estimava que até meados do século, o número de mortes por acidentes cardiovasculares desencadeados pelos extremos de temperatura pode triplicar.

Mortes por problemas cardíacos devem aumentar com o cada vez maior número de dias de calor extremo

As ondas de calor estão a aumentar?

O que é certo é que há locais onde, por norma, não existiam com tanta frequência ondas de calor e que agora estão não só a começar a tê-las com maior frequência, mas também a registar mais extremos de temperatura, clarifica o climatologista Mário Marques ao Observador. “Cada vez estamos a verificar que existem maiores extremos, maiores antagonismos em termos de padrões atmosféricos, nomeadamente com recordes de temperatura a serem batidos e também em áreas onde não era muito normal”, aponta.

O climatologista acrescenta que Portugal poderá cada vez mais sofrer de extremos, antecipando que deixará de existir o equilíbrio de um verão dito normal. “Nos próximos anos, poderá ser que tenhamos aqueles verões em que podemos mudar numa questão de poucos dias de temperatura. Tanto estarão 40 graus como passados os outros dias estarão 25”. “Essas oscilações vão acontecer cada vez mais, não só em Portugal, mas em toda a Península Ibérica, que sofrerá muito com isso. Poderemos ter grandes fluxos e contínuos de ar quente, seco e com intrusões do Norte de África com maior frequência, mas também grandes diferenças em termos de equilíbrio ao longo do ano”, remata.

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