Nas redes sociais está a circular a tese de que o Papa Francisco apoiou uma campanha do Fórum Económico Mundial que serviria para sacrificar pessoas com autismo, alcoolismo e outras doenças e deficiências menores para ajudar a humanidade a combater a chamada mudança climática. Como tal, a seguinte afirmação tem sido reproduzida como sendo verdadeira: “O Papa Francisco diz que alcoólicos, autistas e pessoas com deficiência devem ser sacrificados para lutar contra as mudanças climáticas.”

Sempre que o Papa fala há motivo de notícia, em particular quando estão em causa posicionamentos da Igreja Católica (o que aconteceria com tal afirmação). Mas não há qualquer referência destas declarações em nenhum órgão de comunicação fidedigno, pelo contrário.

Tal como aconteceu na viagem a Portugal, por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, o Papa Francisco tem feito questão de referir que a Igreja é para “todos, todos, todos”, sem exceções, e, como tal, não faria qualquer sentido promover o sacrifício de alcoólicos, autistas e pessoas com deficiência para combater as alterações climáticas — mesmo que o ambiente seja uma das preocupações levantadas pelo chefe da Igreja Católica.

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Mais do que isso, a Igreja (e o Papa faz questão de o referir sempre que possível) é contra a eutanásia. Portanto, que sentido faria promover a morte de alguém fosse porque razão fosse? Não há resposta para a pergunta nas dezenas de publicações que estão a ser partilhadas nas redes sociais.

Aliás, no primeiro discurso em Portugal depois de aterrar em Lisboa para a JMJ, e perante as mais altas figuras do Estado, da política e da sociedade civil, Francisco não perdeu a oportunidade: “Para onde ides se, perante o tormento de viver, vos limitais a oferecer remédios rápidos e errados como o fácil acesso à morte, solução cómoda que parece doce, mas na realidade é mais amarga do que as águas do mar?” Criticou aquilo a que chamou as “leis sofisticadas da eutanásia” e nem sequer é a primeira vez que o faz: no dia da aprovação da lei em Portugal, Francisco reconheceu estar “muito triste”. “No país onde apareceu Nossa Senhora foi promulgada uma lei para matar. Mais um passo na grande lista dos países que aprovaram a eutanásia”, disse o líder da Igreja Católica.

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No mesmo sentido, na celebração do Dia Mundial de Consciencialização do Autismo, o Papa Francisco recebeu uma delegação da Federação Italiana de Autismo no Vaticano, apelou a uma cultura de inclusão e a “uma mudança de mentalidade” para quebrar “preconceito, desigualdade e discriminação”. “Espero que as próprias pessoas com deficiência se tornem cada vez mais protagonistas desta mudança”, disse na altura, uma postura que também desmente as alegadas palavras do Papa sobre as pessoas com autismo.

Além do posicionamento da Igreja e de não haver quaisquer declarações públicas do Papa que corroborem estas publicações, os locais onde a alegada notícia foi partilhada, inicialmente o The People’s Voice e depois o Tribuna Nacional, são conhecidos pela divulgação de conteúdo falso —  e nem sequer revelaram onde teriam sido feitas as declarações em causa.

Conclusão

Não há qualquer prova de que o Papa Francisco tenha dito que alcoólicos, autistas e pessoas com deficiência devem ser sacrificados para combater as alterações climáticas. As publicações inicialmente partilhadas pelo The People’s Voice e depois pelo Tribuna Nacional não têm base verídica — as declarações em causa não foram publicadas em nenhum órgão de comunicação social fidedigno e os sites em causa são conhecidos pela publicação de conteúdos falsos. Mais do que isso, a Igreja Católica é contra a eutanásia, pelo que não permitiria nem incentivaria o sacrifício de um ser humano, tendo em conta que a defesa da vida humana está nos ideais base da Igreja.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do k este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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