Continuamos em Portugal a aceitar a declaração de IRS praticamente como único instrumento a considerar para obtenção de determinados apoios por parte do Estado.

Ora, como é do conhecimento comum, a declaração de IRS não é, de todo, a forma mais fiável para que se possa avaliar o merecimento de apoios sociais. Com efeito, são inúmeros os casos sobre os quais vamos tendo conhecimento, através dos meios de comunicação social, de pessoas que ficam fora desses apoios por míseros euros, enquanto temos milionários que, em comissões parlamentares, declaram que só têm uma garagem em nome próprio.

É culturalmente aceite utilizar uma empresa para poder deslocar rendimentos da declaração de IRS, declaração que serve depois para aceder a determinados apoios, como são igualmente aceites outros expedientes com o mesmo fim. Obviamente que tudo é feito de forma legal, porque as leis vigentes o permitem. Mas este tipo de procedimento, aceite por grande parte dos decisores políticos, deve ser alterado.

O que se pede, na próxima legislatura, é que se olhe para esta questão com seriedade e vontade efetiva de a corrigir. Seria importante estudar a possibilidade de se encontrarem outros instrumentos que atestem a real situação financeira das famílias, para que estes tipos de processos se tornem mais justos, dando possibilidade de acesso aos que mais necessitam.

Em Itália, por exemplo, existe um mecanismo chamado ISEE, sigla para Indicador da Situação Económica Equivalente, que é um método de cálculo, avaliação e comparação da situação económica de uma família.  A vantagem deste mecanismo é que considera ativos e não apenas receitas.

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Este mecanismo não se limita a verificar os rendimentos recebidos, mas também leva em consideração a situação económica e, portanto, também os bens, imóveis e móveis, que se encontrem em nome da família, assim como as empresas que estejam no nome de familiares, até ao segundo grau. Assim, garante-se com mais rigor que a situação declarada é o mais próximo possível do real. Com este sistema passariam a ser contabilizados não só os rendimentos do trabalho mas também os dos negócios, os depósitos bancários e os eventuais investimentos.

Poderá estar a pensar que seria uma verdadeira caça às bruxas, mas na realidade é apenas uma sugestão para que a sociedade se possa tornar um pouco mais justa e, sobretudo, para que apenas quem realmente precisa possa usufruir dos apoios do Estado que não são mais que o apoio que todos nós podemos dar.

Esta ferramenta, que aqui expliquei, é só um exemplo que poderia bem ser o ponto de partida para que se tornasse todo o sistema fiscal e social mais inclusivo, sério e justo. Não podemos continuar a ignorar esta questão, que tanto prejudica uns, em benefício de outros, que ainda se vangloriam dos seus feitos de “fuga” aos impostos.