Quem diria que chegaria o dia em que nenhuma das gerações anteriores poderia compreender o modelo de pensamento dominante da geração actual acerca do sexo e da sexualidade humana?

Quem diria que o facto de eu, sim, “euzinha”, ter brincado com brinquedos de rapaz, gostar mais de brincadeiras de rapaz e de brincar com rapazes, se devia ao facto de eu ter sido um rapaz?

Mas, não é que foi exactamente a essa conclusão a que chegou Jennifer Finney Boylan, em 2014, no seu artigo de opinião Tive uma infância de menino, uma vez”, publicado pelo New York Times? Ao escrever sobre os seus três filhos, sobre a vida deles durante o Verão e “o que significa ser um menino neste país, e como a infância de um menino mudou ao longo do tempo”, Jennifer surpreende-nos com uma revelação chocante: “também tive verões assim, nos anos 1960, e embora me tenha tornado uma mulher na idade adulta e lutado com a questão do género até lá, todavia, é verdade que tive uma infância de menino e que tive momentos felizes”.

Ainda que tivesse lido O segundo sexo, de Simone de Beuvoir, nenhuma geração passada encontraria qualquer sentido nessa declaração. Todavia, o seu artigo anuncia a chegada da revolução transexual.

Também em 2014, a capa da revista Time marcou uma etapa crucial na revolução transexual. Quase um ano depois da aprovação do casamento homossexual, pelo Supremo Tribunal, Katy Steinmetz (discípula de Judith Butler?), escreveu: «outro movimento de direitos civis está pronto para desafiar as normas e crenças culturais de longa data. As pessoas transexuais […] surgem das margens para lutar por uma posição de igualdade na sociedade».

De acordo com Steinmetz, a revolução transexual ainda estava longe de onde gostaria de estar, mas o tom geral do artigo e o facto de ser capa da Time indicava um momento cultural cheio de significado para o movimento trans. De acordo com Katy, as maiores dificuldades que a revolução transexual encontrava eram as definições pré-estabelecidas e binárias do sexo/género, que as pessoas possuíam.

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Ora, como todos nós sabemos, tal definição não é recente. O entendimento do sexo como binário – homem e mulher, masculino e feminino – é central à experiência humana e ao nosso entendimento acerca de nós mesmos. Nunca houve um momento, na História, em que não fosse assim. O avanço tecnológico, que permite “mudar” de sexo e fazer uma cirurgia de “mudança de sexo” – ainda que tudo se limite a uma operação estética que só muda as características físicas secundárias, pois o ADN e cada célula do corpo humano permanecem masculinas ou femininas – é tão novo que nem sequer foi considerado como uma parte proeminente no surgimento do movimento dos direitos homossexuais, na década de 1960.

Hoje, graças aos milhões de €€€ injectados na causa e aos activistas trans, a revolução transexual está ao rubro. A capa da Time pretendia apresentar as questões transexuais, de forma autoritária, à classe média americana e, claro, a todo o Ocidente. Steinmetz quis mostrar à sociedade que a revolução trans havia chegado e a razão pela qual deveria ser recebida de braços abertos. Ela tornou clara a sua posição quando disse de que maneira deveríamos entender a distinção entre sexo e género, e preferências sexuais:

«[…] as preferências sexuais, entretanto, são um assunto completamente distinto. Não há correlação concreta entre a identidade de género de uma pessoa e os seus interesses sexuais; por exemplo, uma mulher heterossexual pode começar a viver como um homem e ainda sentir-se atraída por homens. Uma explicação frequentemente citada é que a orientação sexual determina com quem você quer ir para a cama e a identidade de género determina se você quer ir para a cama como homem ou mulher.»

Como assim?

Este parágrafo vira toda a civilização, desde o princípio até aos nossos dias, de cabeça para baixo. O argumento de que se deve impor uma distinção clara entre com quem um indivíduo quer ir para a cama e como é que o indivíduo quer ir para a cama requer a desintegração total de toda uma cosmovisão e estrutura de pensamento, aniquila as bases das estruturas mais básicas da sociedade.

A revolução trans destrói qualquer entendimento da identidade humana baseada na tradição cristã, na trajectória da civilização ocidental e na cosmovisão que moldou o mundo ao longo dos séculos. Em alguns países da Europa já há infantários que proíbem o uso de pronomes que façam distinção de sexo. Por cá, a agenda avança e, de acordo com o Projecto de Lei 332/XV, do PS, aprovado no dia 21 de Abril, os professores serão obrigados a tratar aos alunos de acordo com os pronomes que estes escolherem: o João pode exigir ser tratado como Maria e a Maria como João (e os pais não podem opor-se!). Erradicar os pronomes, ou trocá-los, representa a negação da definição da nossa humanidade. É por isso que a revolução trans, principalmente no que diz respeito à imposição das suas reivindicações no campo da linguagem, representa um ataque à nossa identidade sexual, que é fundamental para nos conhecermos a nós mesmos.

Urge distinguir entre sexo e género. Devemos continuar a usar a palavra sexo para descrever homens e mulheres. Afinal, na década de 1960, movimento feminista foi descrito como “a guerra dos sexos” e não como a “guerra dos géneros”. A distinção entre sexo e género não é uma mera escolha linguística; ela é essencial à cosmovisão do movimento transgénero, que faz uma distinção clara (ou nem por isso) entre género com respeito ao entendimento/sentimento de um indivíduo e sexo, que se refere ao sexo biológico atribuído no seu nascimento. Fica por explicar porque é que, se sexo e género são coisas diferentes, se mutila o sexo e as características físicas desse sexo quando o género sentido não corresponde ao sexo.

Mas, eis que surge o conceito “omnigénero” (Virginia Ramey Mollenkott, Omnigender: A Trans- Religious Approach (Cleveland: Pilgrim Press, 2007), p. 8.), que promete superar o conflito do género em si.

Ao defender a sua noção de “omnigénero” na sociedade, Mollenkott antecipou um futuro em que todas as pessoas «terão uma sexualidade única, apaixonando-se por outra pessoa por causa da sua resposta emocional ao ser todo de um indivíduo, não à genitália do indivíduo» (p. 167). Além disso, em registos como certidão de nascimento e carta de condução não constaria o sexo ou o género. O novo futuro também garantiria ao indivíduo o direito de «controlar e mudar o seu próprio corpo» por meio de cirurgias estéticas e tratamentos hormonais, até à cirurgia de mudança total de género (não de sexo, porque é impossível). As casas de banho seriam todas “unissex”: «dentro, seriam como as casas de banho femininas de hoje em dia: sem mictório, apenas as sanitas individuais» (p. 168). E, então, as páginas 168 e 169, ela visiona um futuro em que as «crianças serão ensinadas a sentar-se para urinar, independentemente da sua genitália». Isso exigiria que «as casas de banho públicas estivessem sob vídeo-vigilância automática» (que mente tão depravada!). A revolução omnigénero exigiria uma mudança dos «pronomes binários (dele/dela) em favor de um vocabulário inclusivo de género». Além disso, prisões e desportos não seriam mais divididos por sexo ou género. Na verdade, nenhuma dimensão da sociedade permaneceria inalterada.

Et voilá! Em 2023, 16 anos após as previsões de Virginia, creio que só falta obrigar os homens a urinar sentados e legislar no sentido de implementar a vídeo-vigilância nas casas de banho.

Pais, para que a revolução trans ganhe a batalha cultural, é preciso transformar a maneira como as crianças pensam a respeito do sexo. É por isso que a ideologia do género foi imposta à Escola, e os activistas de serviço incutem na mente dos mais novinhos que devem entender a “identidade de género” não apenas em termos de meninas e meninos, mas também como “algo entre esses dois, ou algo fora dessas categorias”.

Todas as crianças se identificam com base no seu sexo biológico (quando isso não acontece, há um transtorno raríssimo da sexualidade, rebaptizado como “disforia de género” e, mais recentemente, como “incongruência de género”, que é preciso acompanhar e tratar). O sistema binário do sexo é fundado numa realidade biológica que não é socialmente construída. Mudar a linguagem e misturar conceitos como género e sexo – em mentes tão tenrinhas e indefesas – é essencial para que toda a sociedade seja despida do seu sexo e se torne omnigénero.