Há pelo menos um sítio em Portugal onde a vacinação da gripe não correu mal. Não houve queixas e todos os que habitualmente são vacinados, foram vacinados a tempo e horas. Esse sítio é a freguesia da Estrela, em Lisboa, e o segredo do sucesso da operação tem um nome: farmácias locais.

Na freguesia da Estrela, o autarca a quem foram confiadas as vacinas para administração local, teve como prioridade o pragmatismo em vez de procurar ganhar louros políticos ou inventar de novo a roda. Entregou as vacinas recebidas às farmácias que a administraram, como sempre fizeram, aos grupos mais vulneráveis. Simples e eficaz.

Agora que finalmente está a chegar a vacina contra a Covid-19, vale a pena olhar para o processo passado e aprender com os erros. Retirar as farmácias da equação deste processo é pura ideologia e, neste caso, de uma ideologia que pode matar. As entidades públicas não têm conhecimento, experiência nem alcance para chegar a todos os que precisam. As farmácias têm. É um facto.

Não, o que está dito acima não é nenhum ataque ao Serviço Nacional de Saúde. O que enfraquece o SNS é colocar-lhe em cima toda a responsabilidade que ao longo dos anos sempre foi partilhada com outros parceiros.

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As farmácias têm uma capilaridade ímpar no território nacional. Abrangem toda a população, esteja ou não inscrita no SNS. Têm mesmo contacto com faixas mais marginalizadas e fragilizadas da população, como é o caso de toxicodependentes e população sem-abrigo, já que é nas farmácias que são distribuídos gratuitamente preservativos e seringas para estes grupos.

É sabido que o processo de vacinação tem o problema de conseguir chegar a largas franjas da população portuguesa que não está inscrita nos centros de saúde. Logo pergunta-se: porquê excluir as farmácias? Pura ideologia. As farmácias são negócios privados, não pertencem ao Estado, por isso, conclui a ministra, não podem prestar um serviço público. Erro capital.

Marta Temido enfrenta, como Ministra da Saúde, o maior desafio sanitário do século, só por isso deve ser respeitada, sem dúvida. É natural que se lhe desculpem algumas falhas ou erros, certamente, mas não é desculpável que, perante as dificuldades, sobreponha ideologias do século passado à eficácia e ao pragmatismo, ainda para mais, quando falamos em salvar vidas.

O ódio à iniciativa privada já não existe, nem sequer em regimes que ainda se dizem comunistas, e inutilizar o serviço das farmácias num tempo como este é criminoso.

Ainda vamos a tempo de optimizar o processo que mais esperança traz ao mundo no início de um novo ano. É urgente abandonar dogmas ideológicos e incluir as farmácias no processo de vacinação da Covid-19.

P.S. 1: Não tenho qualquer ligação pessoal ou política com o autarca da freguesia da Estrela, sou apenas freguesa.

P.S. 2: Não sou dona, aparentada ou amiga de qualquer farmácia ou farmacêutico.