Esta solução política, de um Governo apoiado e apenas viabilizado pelos partidos de extrema esquerda, tem por base uma posição ideológica que privilegia o Estado e o sector público em detrimento do sector e da iniciativa privada.

Este é um aspecto fundamental que deve ser avultado na opinião pública, pois o desenvolvimento económico e social, nas sociedades democráticas e com maiores níveis de prosperidade, tem sido sempre baseado em economias de mercado, de iniciativa privada, onde o Estado assegura o exercício das funções de soberania e de promotor de politicas públicas , quer no campo económico (regulação e prevenção de abusos e posições dominantes) quer na área social (combate às desigualdades sociais e protecção social).

Com efeito, é a iniciativa privada que gera a riqueza (e não o Estado ) e é a base do crescimento económico que possibilita os melhores níveis de vida da população.

O custo deste preconceito ideológico é pago pela população, pela continuação de baixos níveis de vida e rendimentos (o salário hora médio é hoje em Portugal o mais baixo da União Europeia com excepção da Bulgária) e pela ausência de perspectivas que esta situação possa ser alterada com esta solução governativa (a curto prazo prevê-se que Portugal esteja na cauda da Europa, em termos de PIB per capita, tendo sido já ultrapassado quase na totalidade pelos países atrasados saídos da ex-União Soviética).

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Este preconceito ideológico condiciona mesmo aspectos decisivos para o futuro do país: a maior parte dos 12,9 milhões de euros que constituem a primeira tranche dos fundos que Portugal receberá da UE no âmbito do Programa de Recuperação serão aplicados na órbitra do Estado e não destinados ao apoio às empresas.

Mas não é apenas na área económica que esta posição do Governo se manifesta, estando também presente no domínio social. A área da saúde é disso testemunha, nestes tempos de pandemia.

Nos primeiros meses da pandemia o colapso do SNS foi evitado, fundamentalmente, pelo comportamento da população ,pelo confinamento rápido e pela suspensão da assistência aos doentes não Covid.

Hoje sabe-se que esta suspensão está na base do excesso de mortalidade que o INE, para o período de 2 de Março (data do primeiro caso registado em Portugal) a 27 de Dezembro de 2020, refere ser de 12.852 mortes a mais do que a média dos últimos 5 anos para o mesmo período de tempo. Deste nº de mortes, em excesso, apenas 52% são justificados pelo vírus.

Aquela decisão de suspensão de assistência determinou, também, a dificuldade de acesso ao SNS e o aumento das listas de espera para cirurgias e consultas, agravando ainda mais a situação, já grave, pré-existente ao início da pandemia.

Face a esta situação a decisão óbvia, para tentar evitar o aumento da mortalidade e de não abandonar os doentes não Covid, seria a de, desde o início da pandemia, recorrer aos recursos de todo o Sistema de Saúde negociando e contratualizando com as iniciativas privada e social que dispõem de cerca de 13.000 camas e de recursos humanos.

Este Governo, por razões ideológicas, foi adiando e preterindo esta solução, com enormes custos para os portugueses, falando agora na requisição civil daqueles recursos, em termos que, para a opinião pública, se aproximam do conceito de confisco.

Nas vacinas para a gripe o Governo, sabido que neste ano de pandemia existiria uma procura muito mais elevada, em lugar de articular a distribuição com a rede de farmácias que está presente em todo o território, preferiu não o fazer tendo por resultado a carência de vacinas nas farmácias, deixando uma parte da população sem acesso às vacinas , mesmo grupos de risco, ao mesmo tempo que se registavam casos de pessoas idosas em filas de espera no exterior dos centros de saúde.

Cabe aqui perguntar porque é que essa articulação com as farmácias não foi feita. Por serem privadas?

Também nas prioridades para a aplicação das vacinas contra a Covid-19, quando divulgadas inicial e publicamente, não constavam os profissionais de saúde dos hospitais dos sectores privado e social. E de novo se coloca questão. Por não serem públicos? Não é prioritário esses profissionais estarem protegidos tal como os do sector público? Os doentes tratados por esses profissionais não merecem a mesma protecção (e consideração)?

Mas um outro facto recente veio demonstrar e confirmar o preconceito ideológico do Governo face ao sector privado, com prejuízos para o país e para os portugueses.

O Governo autorizou, recentemente, a inscrição de cerca de 100.000 funcionários públicos com contrato individual de trabalho e seus familiares (aproximadamente 60.000 pessoas), na ADSE, um subsistema de protecção na doença da função pública.

A finalidade da ADSE, que funciona como um seguro de saúde público, é o de garantir cuidados de saúde aos seus associados (que pagam em contrapartida, mensalmente, 3,5% dos seus vencimentos) através da contratualização da prestação daqueles cuidados com empresas privadas do sector da saúde.

Esta medida tomada pelo Governo é um acto de justiça pois aqueles trabalhadores, embora possuindo um vínculo diferente à função pública (contratos individuais de trabalho) não deixam de ser funcionários públicos e a sua não inscrição na ADSE configurava uma situação discriminatória.

Mas esta medida do Governo demonstra também a contradição e a duplicidade do Governo (e dos partidos da extrema esquerda que o viabilizam) quanto ao papel da iniciativa privada na prestação de cuidados de saúde à população.

É sabido que o Governo tem vindo a eliminar progressivamente as PPP-Parcerias Público-Privadas na área da saúde, ou seja, a contratação de entidades privadas para a prestação de cuidados de saúde à população através da gestão de hospitais públicos (que continuam a ser de acesso generalizado e gratuito), tendo mesmo, com o apoio daqueles partidos, consagrado na nova Lei de Bases da Saúde princípios que, na prática, quase eliminam o recurso às PPP.

Esta actuação e atitude do Governo, quanto às PPP, só pode ser justificada por preconceitos ideológicos que penalizam os interesses do estado, dos contribuintes e da população.

De facto é indesmentível que os hospitais públicos cuja gestão e prestação de cuidados de saúde foi contratualizada com a iniciativa privada , não só obtiveram um melhor desempenho quanto a custos , com poupanças para o Estado e para os contribuintes, como revelaram uma qualidade elevada dos cuidados de saúde prestados.

Estes dois aspectos determinantes – custos mais baixos, beneficiando o Estado e os contribuintes – e qualidade elevada, com satisfação dos utentes – estão comprovados por entidades públicas, credíveis, como o Tribunal de Contas, a UTAP (organismo do Ministério da Finanças) e a Entidade Reguladora da Saúde.

À luz desta realidade, o preconceito ideológico e a contradição do Governo, são ainda mais flagrantes: por um lado abre-se, e bem, pelo Governo, a inscrição de 160.000 pessoas (funcionários públicos e seus familiares), na ADSE que só contrata a iniciativa privada para a prestação de cuidados de saúde, mas por outro lado, o mesmo Governo não quer essas entidades privadas (as mesmas que a ADSE, sob tutela do Estado, contratualiza para os funcionários públicos e suas famílias) na prestação de cuidados de saúde à população em geral.

Isto é, a iniciativa privada é boa para prestar cuidados de saúde aos funcionários públicos mas não serve quando se trata de prestar esses cuidados à população em geral.