Quando Vladimir Putin e Emmanuel Macron dialogaram separados por uma longa mesa jamais imaginariam que a imagem que eternizou o momento se tornaria uma disputa de mobiliário. Há dois fabricantes de móveis a reclamar a autoria da peça de seis metros de comprimento e lacada a branco e ambos foram entrevistados pelos media locais. Se de um lado está o valenciano Vicente (cujo apelido não é mencionado), com produção em Alcàsser (Espanha), segundo o Nius Diario, o empresário italiano Renato Pologna contou primeiro a sua versão dos factos ao Corriella della Serra — história que acabou a ter mais eco internacional. Mas, afinal, quem está a dizer a verdade?

Italiano construiu a mesa que separou Putin e Macron. Hoje custaria 100 mil euros

Vicente garantiu que reconheceu a mesa mal a viu nas televisões como uma das muitas peças que fabricou para o Kremlin durante a primeira década deste século. Sobre os materiais, usou madeira de faia do sul dos Alpes, de árvores nascidas e cultivadas à sombra. “Até a ver embalada, não descansei. Não imaginam o sofrimento que aquela mesa foi para mim”, confessou ao jornal espanhol, admitindo que ainda hoje continua “a procurar falhas”.

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Fizemos muitas coisas para eles [russos]. É um orgulho, mas era uma responsabilidade muito grande, não se podia cometer erros e tínhamos de seguir rigorosamente as instruções [do Kremlin]”.

Rafael Pérez, secretário geral da Associação Valenciana de Empresas de Mobiliário (Fevama, no acrónimo espanhol) , assegurou que não é de estranhar que empresas valencianas especializadas em mobiliário clássico tenham participado na decoração de escritórios ou edifícios do Kremlin, assegurou ao El Confidencial. Aposta inclusive “com 99% de certeza” que é Vicente quem está a dizer a verdade, porque ele já encerrou a empresa, em 2020, e os filhos têm outro emprego. O El Confidencial tentou obter declarações de Vicente, mas sem sucesso.

Embora já tenha fechado portas, o site da empresa Vicente Zaragozá S.A. permanece ativo e nele é possível ver alguns projetos “especiais” realizados para clientes russos. “Fornecemos móveis para a reforma da ala presidencial do Kremlin de Moscovo, para a vila e escritório do presidente da Ucrânia e os escritórios dos presidentes do Uzbequistão e Tajiquistão, bem como para as casas oficiais dos deputados do Parlamento de Taiwan e o Conselho de Ministros do Camboja”, lê-se na descrição da referida categoria.

Nas imagens, há alguns móveis com uma estética lacada branca muito semelhante à mesa que separava Putin e Macron, porém as fotos relacionadas com os móveis feitos para o Kremlin têm um acabamento noutro tipo de madeira. Para além disto, a página de Facebook da empresa — que não é atualizada desde 7 de outubro de 2020 — apresenta descrições em inglês e em russo.

Em reação, Renato Pologna diz estar perplexo com as declarações do espanhol, acrescentando que há livros publicados em 2000 com fotos do interior do prédio, onde a mesa já lá está.

Este homem, que não conheço, diz que fez esta mesa em 2005 – portanto, alguma coisa não bate certo. Como prova temos todos os certificados pelo trabalho realizado, e até o reconhecimento do Presidente, que na época era Boris Yeltsin”. E atira: “Talvez o espanhol tenha feito uma cópia que foi para outro lugar, quem sabe. Estamos a falar de uma mesa, não de um avião”.

Antes da discussão sobre a crise ucraniana começar, Macron recusou realizar um teste PCR à Covid-19 em Moscovo, por não querer que o seu ADN ficasse nas mãos dos russos, por isso Putin exigiu que os dois se sentassem a uma distância segura numa mesa comprida. Já esta terça-feira, foi a vez de o chanceler alemão Olaf Scholz se sentar na extremidade oposta a Putin. Só Jair Bolsonaro esteve próximo do presidente russo, esta quarta-feira.

Bolsonaro submeteu-se a cinco testes PCR à Covid-19 para estar perto de Putin (ao contrário de Macron e Scholz)