O ritmo dos primeiros dias de campanha de Sebastião Bugalho desacelerou. Os mercados e contactos com população estão mais comedidos e o cabeça de lista da AD passou para o ambiente mais controlado das salas e salinhas. Enquanto isso, lá fora, o Governo da mesma AD acelera medidas em algumas áreas, destrunfando planos, cartas para eleitorados de peso (professores e pensionistas) e vagas em creches. Jura-se que não há “nacionalização” da campanha europeia, mas ter em funções um Governo da cor da candidatura ajuda. E noutras frentes, obriga a refrear.
“Qualquer ajuda é bem-vinda“. A frase é do próprio candidato que, confrontado com os jornalistas sobre se se sente ajudado pelo Governo, esta terça-feira não deixou de dar esta resposta, ainda que logo de seguida tenha garantido que a “ajuda” com que “conta” é a dos eleitores. Pouco depois destas declarações teria pela terceira vez Luís Montenegro na campanha ao seu lado em Pombal, num jantar-comício. Tinha estado também no arranque, em Évora, e ainda uns dias depois, em Santa Maria da Feira.
O candidato independente teve muitas vezes ao seu lado membros do Governo e isso vai continuar na reta final. Até aqui, já esteve o ministro da Coesão, Manuel Castro Almeida, o ministro da Defesa, Nuno Melo, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, e ainda vai estar o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, e novamente o primeiro-ministro. Os secretários de Estado também povoaram algumas arruadas e comícios, como por exemplo o da Agricultura (João Moura), Ambiente (Emídio Sousa) ou Administração Interna (Telmo Correia). Quem falou foi sempre para atirar forte à oposição, sobretudo naquilo que a AD diz ser a radicalização do PS — o problemático (para Montenegro) apoio no Chega para aprovar projetos no Parlamento.
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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR
Além destas ajudas políticas em pessoa, durante esta semana e meia de campanha oficial, o Governo ainda aprovou o prometido Plano de Emergência para a Saúde — mesmo nos primeiros dias da campanha em que a AD tem como principal adversária a antiga ministra da Saúde Marta Temido –, aprovou o Plano de Ação para as Migrações e ainda avançou com a facilitação do acesso a creches gratuitas.
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No aquecimento da campanha, dias antes de começar, já tinha fechado acordo com os professores e mexido nas regras do complemento solidários para idosos, tocando num grupo eleitoral de peso para o PS. Foi já durante a campanha que “a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social enviou uma carta aos pensionistas a informar sobre o aumento do CSI para 600 euros mensais, a eliminação dos rendimentos dos filhos como critério de exclusão e a comparticipação total de medicamentos prescritos”. E anunciou-o nas redes sociais do Governo — na semana anterior, o ministro da Educação tinha feito o mesmo com os professores.
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Entre a vertigem legislativa do Governo, a campanha de “proximidade” que Bugalho pregava nos primeiro dias acabou por ir para dentro, programando-se que volte apenas mas a esse contacto nos últimos dias — em ações naturalmente mais encorpadas (com Montenegro e Ursula Von der Leyn, onde o contacto próximo fica sempre mais dificultado). Mas o candidato recusa que exista eleitoralismo nesta frente que o Governo programou precisamente para estas semanas. Nos primeiros dias, perante o Plano de Emergência para a Saúde, falava em “feliz coincidência”, agora tenta dar a volta ao texto para perguntar à oposição se “estavam à espera que Governo suspendesse atividade governativa?”. E para aproveitar a deixa para atacar os oito anos de socialismo.
Sebastiãozinho dos mercados? Salta, pede bolos e beijinhos como um preferido das avós
Neste ponto em concreto teve a ajuda de Montenegro, que sempre que foi à campanha foi para comparar os seus dois meses aos mais de 3 mil dias de António Costa e garantir que já tem muito para apresentar. Fê-lo logo em Évora, no primeiro comício, e quando voltou, em Santa Maria da Feira, já tinha mais um plano aprovado e voltou à carga para garantir ter mais “pedalada” do que os seus adversários políticos. Pelo meio vai também garantindo que o ritmo é para manter, “qualquer que seja o resultado” da noite das Europeias.
Já o seu independente preferido do momento vai dizendo, com ironia, que percebe “que haja alguma estranheza e novidade de haver um governo a fazer coisas porque durante 9 anos houve um Governo que não queria resolver o problema”, disse em relação ao Plano para as Migrações. Afastou-se das “tricas políticas”, mas não deixou de se mostrar menos afoito quando o tema são as críticas de aproximação ao Chega com este mesmo Plano. E André Ventura não terá ajudado, ao vir dizer que Montenegro apresentou o Plano nesta altura (e apoiado pelo Presidente da República) para lhe tirar protagonismo.
Para sacudir o extremismo, até a ajuda de um socialista serve
Esta terça-feira, ao fim da manhã em Coimbra, socorreu-se do “insuspeito António Vitorino” para sacudir qualquer radicalismo da AD, ao negar restrições com as novas regras para a imigração aprovadas pelo Governo — nomeadamente o fim do visto sem contrato de trabalho para imigrantes. “Acha que, se as medidas do governo tivessem alguma coisa a ver com a extrema-direita, ou com algumas restrições, António Vitorino as vinha elogiar? Tenho a certeza que não, eu também não as elogiaria?”, atirou aos jornalistas que o confrontavam com o fim de um mecanismo que facilitava entradas.
O argumento a que o candidato se tem agarrado é que o que a “manifestação de interesse” dos imigrantes — a que o Governo pôs agora fim — acabou, sim, por “duplicar” os números do tráfico humano no país. A argumentação que ganha peso no discurso do candidato vai sempre por esta via, desviando-se de questões sobre quotas ou limites a número de imigrantes no país . Há uma tentativa clara de separar as águas face ao Chega e de colá-lo ao lado de lá.
O tema é de extrema delicadeza para a AD que sabe ter no Chega um problema. Foi o partido cujo crescimento, nas últimas legislativas, boicotou qualquer hipótese de a coligação conseguir distanciar-se do PS no resultado final. E a forma de lidar com o partido de Ventura ainda não dá certezas aos partidos da coligação, já que o “não é não” das legislativas clarificou a estratégia, mas isso não fez o PSD crescer o suficiente ao centro. Por isso, agora a linha passa para associar o Chega ao PS e os dois à instabilidade política.
Hugo Soares foi o dono do discurso mais objetivo neste sentido. Em Guimarães, este domingo, o líder parlamentar do PSD esteve ao lado de Bugalho na rua e não esteve com meias palavras. Disse que o PS “acena com o papão da extrema direita”, mas é a ela a que se alia no Parlamento desde as últimas legislativas. Dirigiu-se muito diretamente a quem votou no Chega, aos “muitos que foram votar em protesto contra o que aconteceu em Portugal, foram votar contra o socialismo” e para perguntar: “Como se sentirão a olhar para o partido em que votaram para correr com socialismo a ser uma espécie de colinho do PS” no Parlamento.
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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR
E não ficou pela pergunta, deu a resposta: “Eu sei como se sentem: enganados, frustrados, Todos os portugueses que votaram a contar com uma coisa, que votaram a pensar em alhos e saíram-lhe bugalhos, têm a oportunidade de nesta eleição dizer o que querem”.
Foi o apelo mais direto a esse grupo de eleitores que fugiu ao PSD nas últimas legislativas, mas ele tem andado sempre pelos discursos da candidatura. Está no de Bugalho sempre que pede a Pedro Nuno Santos que defina as suas próprias “linhas vermelhas”, o acusa de “extremismo” ou questiona os socialistas por terem na sua família líderes de governos que deportam imigrantes (Dinamarca), criminalizam o aborto (Malta) e têm muros para imigrantes (Espanha) — um trio a que se agarrou durante toda a campanha para radicalizar o PS.
Do lado da AD vende-se a ideia da “moderação”, de uma coligação que o candidato independente que a representa à cabeça diz ser de “mudança sem isso significar destruição e uma quebra total”, numa altura em que a Europa, diz, “precisa de quem não tenha medo de disromper mas não queira partir tudo, divergir mas não queira rasgar a página toda”. Seguir com difícil equilibrismo pelo caminho do meio, mesmo quando as últimas eleições mostraram que a radicalização levou votos ao Chega.