Uma publicação de um utilizador do Facebook usa um tweet do eurodeputado Paulo Rangel para denunciar um alegado branqueamento por parte da comunicação social relativamente às críticas que o Parlamento Europeu endereçou ao Governo português. Em causa está a nomeação do procurador europeu que, apesar de ter ficado em segundo lugar na lista de preferências do comité de seleção europeu, acabou a ser nomeado para o cargo por intervenção da ministra da Justiça.

A 30 de abril este utilizador faz três perguntas, juntando-lhes sempre uma resposta: “Notícias na comunicação social sobre isto? Zero. Notas de rodapé ao menos? Bola. Isenção da nossa imprensa? Nicles”. A base para estas questões é um tweet do eurodeputado social democrata Paulo Rangel:

Hoje, o Parlamento Europeu condenou de forma categórica e lapidar, por 633 votos a favor em 690, o governo português e a ministra da Justiça pela inaceitável interferência na nomeação do procurador europeu. Pergunto ao primeiro-ministro: a conspiração internacional é generalizada?”, publicou o eurodeputado.

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O caso da nomeação do procurador europeu José Guerra tem levantado polémica ao longo dos últimos meses. O magistrado esteve sujeito a duas avaliações, uma feita por um júri nacional do Conselho Superior do Ministério Público e outra feita por um júri internacional do Conselho Europeu, tendo conseguido o primeiro lugar no primeiro, mas sendo ultrapassado pela procuradora Ana Carla Almeida no segundo.

Apesar das diferenças das avaliações, o Governo português acabou por impor a nomeação de José Guerra, justificando a escolha com documentos nos quais constavam dados curriculares do magistrado do Ministério Público que não correspondiam à verdade. Numa carta enviada para Bruxelas, o procurador é apresentado como “procurador-geral-adjunto”, sendo apenas Procurador da República. Também era referido que tinha participado “na liderança investigatória e acusatória” no processo UGT, quando da verdade foi o magistrado do Ministério Público escolhido para fazer o julgamento.

Na altura, o primeiro-ministro classificou estes “lapsos” como “irrelevantes”, garantindo que não tinham sido preponderantes para a escolha das autoridades europeias. Mas isso não é verdade, uma vez que, de acordo com um documento do Conselho Europeu a que a RTP teve acesso, os lapsos foram considerados como informação correta e tidos em conta no momento de preterir Ana Carla Almeida.

Este caso levou ainda à demissão do Diretor-geral da Política de Justiça e Francisca Van Dunem enviou uma nova carta às autoridades europeias a corrigir os erros do currículo do procurador José Guerra.

Mas vamos à verificação dos dados presentes na publicação de Facebook que acusa a comunicação social de não ter noticiado as críticas do Parlamento Europeu.

Através de uma pesquisa rápida na secção de notícias do Google é muito fácil desmentir esta acusação. Os principais jornais noticiaram este assunto: o Observador fê-lo aqui; o Público aqui; o Expresso aqui; o Eco aqui; e o Diário de Notícias aqui. A notícia também foi impressa na página 12 (acesso pago) do Público de 30 de abril e na página 16 (acesso pago) do Diário de Notícias do mesmo dia.

Na televisão, a RTP emitiu uma reportagem na segunda parte do Telejornal de 29 de abril (a partir do minuto 5:10). A SIC também fez uma peça sobre este assunto. Este tema também foi noticiado nas Rádios. A notícia abriu o jornal das 17h da Rádio Observador no dia 29 de abril; e foi tema de uma reportagem da Antena 1.

As críticas do Parlamento Europeu surgiram num relatório aprovado pelos eurodeputados no mesmo dia em que o Governo apresentou a estratégia nacional contra a corrupção. A este propósito, a ministra da Justiça concedeu uma entrevista à TVI 24 (a partir do minuto 9:30) que acabou muito dominada pelas propostas do Governo. Apesar disso, Francisca Van Dunem foi confrontada com este tema, garantindo que “as explicações que já foram dadas são suficientes” e ironizando com o timing das críticas: “É uma grande coincidência que estas conclusões do Parlamento Europeu apareçam no mesmo dia em que apresentamos propostas de combate à corrupção.”

Não percebo porque é que estas conclusões aparecem num relatório orçamental, embora estejam associadas a orientações de um conjunto de partidos que conduziram política e partidariamente este processo”, acusa Francisca Van Dunem

Conclusão

Não é verdade que a comunicação social tenha ignorado as críticas que o Parlamento Europeu fez à forma como foi conduzido o processo de nomeação do procurador europeu, José Guerra. No momento em que este utilizador do Facebook faz estas acusações, a notícia já tinha sido publicada por praticamente todos os órgãos de comunicação social nas edições online, nos principais noticiários de rádio e televisão e nas edições impressas dos jornais.

A acusação de falta de isenção também é falsa, uma vez que para além de noticiarem este tema, os jornalistas confrontaram a ministra da Justiça. Numa entrevista na TVI 24, Francisca Van Dunem foi questionada sobre este tema poucas horas depois de a notícia ter sido veiculada e antes desta publicação de Facebook.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

De acordo com o sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook.

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