|
|
A primeira mensagem chegou ao telemóvel do João Porfírio às 7h25 de quarta-feira. “Bom dia. Podemos ir fazer reportagem ao Bairro Amarelo, em Almada?” O “podemos” não podia ser mais certeiro. O nosso editor de fotografia não tem só uma das agendas profissionais mais apertadas do país — àquela hora, também ainda devia muitas horas à cama. Quatro horas e meia, mais precisamente, se contarmos que uma boa noite de sono deve ter pelo menos oito. |
Tinha chegado a Lisboa às quatro da madrugada, vindo de uma reportagem em Coimbra. Contava dormir até meio da manhã e depois seguir para a Assembleia da República, onde o parlamento debateria, durante a tarde, o plano do Governo para recuperar a economia. O problema é que, oito horas antes, no final da noite de quarta-feira, uma declaração de Inês de Medeiros fazia título de um artigo do Observador: numa reunião da autarquia, a presidente da câmara de Almada tinha falado da vista maravilhosa e “invejável” do Bairro Amarelo, para onde não se importaria nada de ir viver já amanhã — provocando uma das polémicas da semana e obrigando a própria autarca a vir dizer depois que as suas palavras foram tiradas do contexto. |
Três minutos antes de a mensagem chegar ao telemóvel do João Porfírio, uma semelhante chegava ao da Tânia Pereirinha. E algum tempo depois (com um despertador mal desligado pelo meio), os dois estavam a caminho da Margem Sul, para ver para além das letras gordas — e até da fachada do bairro, que parecia semelhante a tantos outros, de prédios altos, amarelos, com bastante comércio e muita gente na rua. |
Tiveram de estacionar para perceber os contrastes, logo a começar pela quantidade invulgar de lugares ocupados por carros com vidros estilhaçados e pneus furados — ou sem pneus, de todo. Depois, mais junto aos prédios, veio o resto: muito lixo, muitas garrafas de cerveja e de outras bebidas pelo chão, caixas de correio destruídas, patamares e paredes sujos e janelas com vidros estilhaçados, uma delas com aquilo que parecia mesmo ter sido um tiro. |
Sem campainhas a funcionar, foram batendo às portas e acabaram por entrar num apartamento do 6.º piso, quase sem mobília e a precisar de obras, de um casal recém chegado ao bairro — e efetivamente maravilhado com a vista desafogada: o Tejo e a ponte 25 de abril ao centro, o Cristo Rei de um lado e Belém do outro. |
Foram os únicos a elogiar o que se vê da janela. Num bairro social onde as carências parecem suplantar as virtudes, todas as outras pessoas com quem a Tânia e o João falaram, algumas nascidas no bairro, outras lá moradoras há várias décadas, encolheram os ombros à vista (que, ainda para mais, explicaram, é exclusiva de um ou dois prédios apenas) e apontaram os problemas com que se deparam no dia a dia e que não serão muito diferentes dos outros bairros sociais do concelho ou do país: as casas que precisam de intervenções, os prédios degradados, as ruas sujas e a insegurança provocada pelo tráfico de droga, os desacatos entre vizinhos e a sensação de viver num gueto, onde a GNR entra “armada até aos dentes” sempre que é chamada. |
Quando já estavam de saída, os dois jornalistas do Observador aperceberam-se do derradeiro contraste: mesmo ao lado do Bairro Amarelo fica a Piscina Municipal da Caparica. Do lado do bairro social, junto à estrada, há lixo e vegetação alta, completamente selvagem, e um carro totalmente queimado; atravessando para o lado oposto, o da piscina, há um jardim bonito, limpo e aparado, com esculturas e equipamento desportivo. |
À noite, a reportagem que prepararam contava tudo isto: a vista é, de facto, maravilhosa; o pior é o resto. E era em tudo semelhante à reportagem que o Miguel Videira, que também passou a manhã no “Pica Pau Amarelo” — como também é conhecido — preparou para a Rádio Observador sobre o bairro de vista invejável onde a PSP não entrava. |
Já os sons do Miguel passavam na rádio, mas ainda a Tânia dava os últimos retoques no texto, o telemóvel do João tocava outra vez, às 20h12. “Podemos ir fazer reportagem a Madrid?” Há dias que a capital espanhola está em muitos dos títulos das notícias que se escrevem por cá, por causa das medidas para controlar a Covid-19, com Espanha a liderar a segunda vaga da pandemia na Europa. |
Mas como estão, de facto, a viver os madrilenos, com confinamentos seletivos que põem vizinhos contra vizinhos — e empresários da restauração à beira do desespero? Desta vez, o João Porfírio arrancou com a Sónia Simões, às 6h da manhã do dia seguinte, já bem dormido. Chegaram a Madrid à hora do almoço, passaram a tarde num dos bairros confinados onde a tensão tem sido maior e ainda se estavam a ambientar quando viram para lá das letras gordas as consequências das medidas de restrição na paciência dos moradores — que, por ali, se está a esgotar. Em frente à Assembleia de Madrid houve pedras e caixotes do lixo atirados contra a polícia, uma carga policial violenta, pelo menos seis detidos e outros tantos feridos. |
De imediato, publicámos no nosso liveblog dedicado à Covid-19 as informações mais importantes e as fotografias dos confrontos, enquanto a Sónia Simões contava tudo o que estava a acontecer em direto na rádio — o que voltou a fazer esta sexta-feira e também no Zoom das Manhãs 360. O que viram, nesse dia, acabaria por ser sintetizado num trabalho especial com um título que resume o sentimento de quem se queixa de verdadeira segregação: “Fora da nossa área. Saiam daqui.”. E tudo isto antes de as medidas mais apertadas serem estendidas, esta sexta-feira, a ainda mais locais da capital espanhola, sabendo-se já que, a partir da próxima segunda, estarão militares na rua para garantir que as regras são cumpridas. |
Até lá, teremos mais reportagens importantes da Sónia Simões e do João Porfírio a partir de Madrid. É que, às vezes, é possível contar bem uma história à distância, procurando as melhores fontes e cruzando as informações mais rigorosas. Mas noutras, só estar no local onde tudo está a acontecer permite saber o que, de facto, ali se passa — para lá das letras gordas ou de declarações mais ou menos polémicas. |
|
Talvez lhe tenha escapado
|
|
Coronavírus
|
|
Em março, Itália foi o símbolo do drama que chegava à Europa. Agora, está a lidar com a 2.ª vaga melhor do que Espanha ou França. Antecipação, cautela e rigor — com muitas multas — explicam o sucesso.
|
|
|
|
Coronavírus
|
|
Investigadores estudaram a ligação das infeções com Covid-19 às estações de comboio. Mas, rapidamente, se transpuseram as conclusões para dentro das carruagens, até o ministro Pedro Nuno Santos o fez.
|
|
|
|
Coronavírus
|
|
Secretário de Estado admitiu implementar "semáforo" do risco transmissão do coronavírus em Portugal. Áustria já adotou o sistema, Inglaterra está a ponderar e a Irlanda tem ferramenta parecida.
|
|
|
|
|
Football Leaks
|
|
Começou a ser investigado em 2015, mas só em 2019, quatro anos depois, a PJ chegou a ele. Foi depois de o pai ter recebido uma mensagem do banco com a indicação do pagamento de uma viagem.
|
|
|
|
Operação Lex
|
|
A mulher de Rui Rangel terá recebido 100 mil euros para decidir um recurso. É a verdadeira autora do único acórdão que deu uma vitória a Sócrates. E também da decisão que reduziu a pena a Duarte Lima.
|
|
|
|
Operação Lex
|
|
Rangel e Galante teriam empresas paralelas às suas funções de juízes — uma atividade proibida e que "mantiveram oculta". Santos Martins, advogado, teria a tarefa de lhes fazer chegar os rendimentos.
|
|
|
|
|
Televisão
|
|
Há um filme americano em que um tipo se alimenta exclusivamente de hambúrgueres durante um mês. Foi assim que Hugo van der Ding se sentiu pelas oito da noite, quando O Dia de Cristina por fim se pôs.
|
|
|
|
Música Portuguesa
|
|
O músico português lança esta semana "Vias de Extinção". Em entrevista, fala das novas canções, das dores que as criaram e de uma nova "tranquilidade". Pensavam mesmo que o conheciam?
|
|
|
|
Livros
|
|
A Península que gostava de ver unida. O desinteresse pelo passado, o futuro "pessimista" e o efeito das redes sociais. Entrevista com o escritor espanhol a propósito do novo "Uma História de Espanha".
|
|
|
|
|
Eleições EUA
|
|
Em 2016, Hillary achou que o voto latino chegaria para vencer Trump. Falhou. Em 2020, Biden demorou a procurá-lo. Na sua ausência, Trump preencheu o vácuo e pintou o adversário de vermelho-comunista.
|
|
|
|
Farfetch
|
|
Fundou o primeiro unicórnio do país e é o primeiro português a integrar o movimento de Bill Gates. Aos 46 anos, o fundador da Farfetch diz que era mais urgente do que nunca lançar uma fundação.
|
|
|
|
Novo Banco
|
|
"Nata 3" é o último pacote de créditos tóxicos que o banco quer vender. 75% dos créditos são cobertos pelo Estado. Pressionado politicamente, o Fundo de Resolução quer travar mais vendas nesta crise.
|
|
|
|
Opinião
|
|
|
Louçã mentiu sobre a proposta da Iniciativa Liberal para passarmos a uma só taxa de IRS e de repente começámos a discutir as vantagens e desvantagens da “flat tax”. E descobrimos coisas surpreendentes
|
|
|
|
Há muito tempo que os governantes parecem acreditar que resolvem os problemas com anúncios, listas de procedimentos ou leis. No passado já era bastante mau. Em tempo de pandemia tudo é mais grave.
|
|
|
|
E o peso “deste” fim de época? Os optimistas dirão que se trata de um intervalo num percurso de normalidade conhecida, os pessimistas, como eu, chamam-lhe fim de época: sem medo das palavras.
|
|
|
|
Se fosse possível resumir, de forma genérica, aquilo que faz de uma escola a melhor escola do mundo, diria que é a que ensina a aprender.
|
|
|
|
A Bonnie e o Clyde da Beira Baixa já devem estar a engendrar as ONG por onde vão canalizar os subsídios que aí vêm. Fica a dica.
|
|
|
|
|