No rescaldo do “Fórum Socialismo”, Mariana Mortágua insiste na ideia de querer ser a 3ª força política nas próximas europeias, afirmando-se como o único partido capaz de fazer luta direta ao Chega, o que vem corroborar a proximidade entre os extremos políticos, que promovem igualmente medidas comprovadamente falhadas. Contudo, em Portugal não é possível fazer equivaler os dois extremos do nosso sistema político sem ser rotulado de lunático, por muito que a evidência empírica comprove a equivalente nulidade das soluções extremistas para a resolução dos nossos problemas.

No passado 25 de Abril, a caminho de Lisboa para descer pela 1ª vez a Avenida da Liberdade, e enquanto ia ouvindo a atribulada sessão na Assembleia da República, multiplicavam-se os cartazes que apelavam à “Limpeza” de que Portugal precisa. O Chega achou que é aceitável propagar um cartaz em que aparece um “X” na cara de 4 indivíduos (Salgado, Sócrates, Costa e Medina), misturando a limpeza de alegados corruptos com a limpeza do governo. Trata-se de um cartaz execrável que apela à justiça popular, afronta os princípios basilares da nossa democracia, mas é o Chega em defesa do justicialismo. Que mais podíamos esperar?

Já no decorrer de uma semana de férias nas praias amenas do Alto Minho, um partido similar, mas com muito melhor imagem na opinião pública e publicada, decidiu afirmar a sua nova líder com um cartaz igualmente deplorável. Sob o lema “Os lucros deles ou a nossa vida?” as caras de 4 líderes de grupos económicos que atuam em Portugal são recortadas a meio. Esquecendo que os lucros só são apurados após retirar os salários que alimentam milhares de funcionários e a sempre gorda fatia do Estado, o Bloco de Esquerda decidiu ilustrar o seu desejo de “morte ao grande capital” decapitando alguns dos seus rostos em Portugal.

Esta obsessão do Chega e BE pela morte é muito provavelmente patológica, mas pode muito bem ser um reflexo dos resultados que as propostas económicas destes dois partidos obtêm quando aplicadas. Controlo de preços ou rendas, taxação de lucros extraordinários, ou a defesa acérrima da injeção de milhões de euros em empresas estratégicas como a TAP, como cereja no topo deste bolo populista, aproximam estes dois partidos no contributo negativo para a resolução de qualquer problema.

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Mesmo nos temas que supostamente os separam, como é o caso da imigração, um olhar mais fino encontra mais uma vez o ódio como a base do pensamento destas forças políticas. Há uma grande diferença entre repatriar imigrantes pobres que nos vêm roubar os empregos, ou expulsar os imigrantes ricos que nos vêm roubar as casas? Sendo que num caso os empregos que supostamente nos são roubados são aqueles que os portugueses já não querem desempenhar e as casas que nos são roubadas são aquelas que não produzimos riqueza suficiente para conseguir pagar?

Setembro será mediatamente marcado pela inconsequente moção de censura do Chega, que mais não visa do que aprisionar o PSD entre a submissão aos extremistas em caso de voto favorável, ou a sensação de que o mesmo se trata de um partido sem coragem, se votar de forma diferente após a crescente contestação ao atual governo. Já no caso do BE, teremos várias manifestações na rua pelo direito à habitação (ou direito a ocupar casas se seguirmos os congéneres espanhóis), em que serão erguidas um conjunto de bandeiras que só inflamam a já terrível dificuldade em aceder a uma casa condigna. Estamos mesmo disponíveis para continuar a viver politicamente condicionados pelas batalhas infrutíferas entre extremistas?

As eleições europeias, que infelizmente serão apenas uma sondagem para os atos eleitorais seguintes, correm o risco de ser dominadas por esta luta pelo 3º lugar, ou pelo 1º lugar daqueles que odeiam o projeto europeu e tudo propõem para o derrubar. Se olharmos para o parlamento europeu, nomeadamente para a equiparação que lá foi feita entre nazismo e comunismo ou para muitas das votações em torno da guerra da Ucrânia, percebemos que na Europa civilizada a equivalência entre o perigo do Chega e do BE, como adversários do nosso modo de vida, está bem presente. Em Portugal, o mesmo não ocorre por mera conveniência daquele que decidimos deixar ser a bússola do nosso regime, o Partido Socialista, que usa os extremos como seu seguro de vida.

No início de Setembro e sem qualquer sobressalto, surgiu a notícia de que o PS (que passa os dias a alertar para o perigo da associação do PSD à extrema-direita) está a preparar uma frente de esquerda em Lisboa, ou seja, associar-se mais uma vez ao extremismo com o objetivo de se libertar de quem tem capacidade para o derrotar em eleições. Fica claro que vivemos num sistema político viciado para um dos lados, em que a extrema-esquerda é relativizada ao mesmo tempo que se levantam cercos (e bem) à extrema-direita.

Não deixa ainda de ser curioso perceber que António Costa, alguém que mantém intactas as expectativas de transitar para um cargo europeu, deve a sua sobrevivência política a acordos com um partido como o PCP (cujo nível de complacência com o regime russo me dispensa de perder tempo em comparações com os restantes extremistas nacionais) e não hesitará em defender que esses acordos sejam novamente realizados se disso depender a continuação do PS no poder. Como pode este PS dar lições a quem quer que seja sobre coligações? Como pode alguém que quando necessário se coligou com defensores de Putin definir com quem os outros se podem coligar?

Concluindo, ou existe uma coligação de moderados para bloquear qualquer solução de governo condicionada pelos extremos, ou teremos de nos preparar para o surgimento de governos condicionados pela extrema-direita. Colocar a pressão exclusivamente sobre o PSD terminará inevitavelmente com a realização da profecia que mais interessa aos extremos, uma radicalização constante em que o extremo que suporta o poder alimenta o que se encontra na oposição, impulsionando o crescimento de ambos os lados e a perpétua adoção de políticas falhadas, capazes de manter uma constante inflamação na discussão política, mas sem resolver qualquer problema.