Falta ainda mais de um ano para as próximas eleições europeias, mas face à possibilidade de estas poderem despoletar eleições legislativas antecipadas importa desde já reflectir sobre as mesmas, em especial no contexto à direita do PS. De facto, à direita, as próximas eleições europeias realizar-se-ão num contexto muito diferente das de 2019: nessa altura, o espaço à direita do PS era ainda dominado por PSD e CDS, com CH e IL à procura de uma oportunidade para romper com o status quo. Essa oportunidade, previsivelmente, não se concretizou nas europeias mas acabou por se concretizar nas legislativas desse mesmo ano, nas quais tanto IL como CH conseguiram fazer eleger um deputado por Lisboa.

Chegados a 2023, o panorama à direita é substancialmente diferente: o CDS desapareceu do mapa parlamentar enquanto o PSD luta para resistir como principal alternativa de governação ao PS num contexto de crescimento de IL e CH. Mudanças que podem estar a ir de encontro às dinâmicas já verificadas em outros países europeus, nos quais os partidos tradicionais do centro-direita perderam espaço e novas forças emergiram. No caso português, as eleições europeias serão um momento importante para aferir se esta dinâmica de reconfiguração da direita se confirma e acentua. Conforme escrevi aqui em Abril de 2022:

(…) será prudente pelo menos colocar a hipótese de o desaparecimento parlamentar do CDS e a crise do PSD poderem ser o início de uma mudança mais estrutural à direita, em linha com o que vem acontecendo noutros países europeus. Muito vai depender, naturalmente, da reacção do PSD à sua crise interna e da capacidade da nova liderança laranja para reconstruir e reposicionar o partido de forma que lhe possibilite continuar a ser a clara alternativa de governação à direita do PS.

Se para o CDS, que ainda tem Nuno Melo como deputado europeu, as eleições serão uma espécie de derradeira oportunidade para tentar a sobrevivência, uma vitória clara nas europeias será fundamental para o PSD tentar estancar o crescimento de CH e IL. Serão eleições muito difíceis para o PSD, que sofre também danos colaterais associados ao desgaste do PS e à crescente desconfiança com os partidos centrais do regime. Danos esses que poderão ser agravados pela maior propensão ao voto de protesto em eleições europeias.

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Uma inclinação para o voto de protesto que tem tudo para beneficiar o CH. Com um crescente sentimento de insatisfação no eleitorado e a percepção de que pouco está em jogo, as eleições europeias deverão apresentar um contexto favorável para a mensagem anti-sistema do CH. A opção pela filiação no grupo europeu ID – do qual fazem parte vários dos políticos europeus mais próximos de Putin – pode trazer alguns incómodos ao CH mas o carácter recente do partido permitiu-lhe evitar acumular episódios potencialmente comprometedores de proximidade com o regime russo como os que penalizaram Salvini em Itália.

A (expectável) elevada abstenção deverá também favorecer o CH e potencialmente também a IL, desde que ambos consigam ter uma campanha mobilizadora. Para a IL, no entanto, o desafio das europeias poderá ser mais complexo do que para o CH. Sendo certo que a filiação no grupo dos liberais europeus – ALDE – não levanta problemas relativamente a relações perigosas com a Rússia, essa pertença também significa que em matéria europeia pouco haverá para distinguir a IL de PSD e PS. A aposta poderá ser no voto de protesto interno contra o PS ou em temas caros aos liberais como a defesa da privacidade e a promoção do comércio livre, mas é provável que no campo do voto de protesto o CH seja mais apelativo à direita.

Por todas estas razões, estaremos assim nas próximas eleições europeias perante um cenário particularmente desafiador para os partidos à direita do PS. O que faz com que nesse espaço a escolha dos candidatos – e em particular dos cabeças de lista – seja um factor especialmente importante nas próximas eleições europeias. Mas esse será um tema para um próximo artigo.