As coisas não estão a correr nada bem. Na saúde, assistimos ao encerramento dos serviços de urgência de várias unidades hospitalares, ao aumento da taxa de mortalidade, incluindo a materna, ao crescimento imparável do número de portugueses sem médico de família (1,3 milhões vs. 710 mil em 2017) e às demoradas listas de espera para consultas, tratamentos, exames e cirurgias.

Perante esta insuficiente resposta do serviço público de saúde os portugueses são o terceiro povo da Europa a despender mais recursos financeiros com a saúde privada (39% da despesa total em saúde segundo o Health at a Glance da OCDE de 2021).

Na educação, o tsunami da falta de professores continua a aumentar, com 40% dos docentes a aposentarem-se até 2030 enquanto o número de alunos em mestrados com habilitação para a docência caiu 70% desde o início do século. Quando comparado com os 35 países da OCDE com dados sobre a idade dos professores do ensino básico e secundário, Portugal é o país com menos docentes abaixo dos 30 anos, apenas 1%.

Conhecendo estes dados, João Costa, o ministro da Educação, na entrevista publicada no Expresso no dia 20 de maio, respondeu o seguinte quando questionado sobre a pouca valorização da profissão de professor: “tem de se repetir todos os dias que não existe sociedade sem professores. Eu sou ministro, mas sou professor e não trocava isso por nada. Mas hoje há uma serie de problemas sociais e os professores não foram formados para lidar com essa diversidade, o que gera frustração. Foram formados para serem professores de bons alunos. Era como formar médicos para verem só pessoas saudáveis. A formação tem de ser reconfigurada”.

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O papel do ministro da educação não é repetir frases vãs semelhantes à afirmação da ministra Marta Temido sobre a falta de resiliência dos médicos durante a pandemia. O papel do ministro é apresentar medidas concretas para resolver os problemas de longo prazo do nosso sistema educativo, incluindo a necessidade de reforçar a atratividade da carreira docente, a autonomia das escolas e a qualidade do ensino público.

Quanto à qualidade da nossa Democracia, segundo o Democracy Index, Portugal voltou a ser considerado uma Democracia com falhas e no último Relatório Global sobre o Estado da Democracia do Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Social fomos o único país da Europa Ocidental a cair em três dos parâmetros que medem a qualidade das democracias: a independência judicial, a ausência de corrupção e a igualdade perante a lei.

Perante estas avaliações, quais foram as medidas tomadas nos últimos anos para melhorar a qualidade da nossa democracia, combater a abstenção, aproximar eleitos de eleitores, assegurar o equilíbrio intergeracional e reforçar a independência das instituições? Nenhumas. Aliás, a governação de António Costa tem sido marcada pelo desprezo pela independência das instituições democráticas, comprovado, entre outros, pelas nomeações enviesadas do Procurador Europeu e do Governador do Banco de Portugal.

O que nos vale é o Plano de Recuperação e Resiliência. Será? Em 2021, o primeiro ano de aplicação do PRR, foram executados apenas 90 milhões de euros face aos 500 milhões de euros considerados no Orçamento do Estado.

Mas, tão grave quanto os atrasos na execução, será a consequência de se ter optado por alocar mais de metade do PRR à construção civil. Porque com a inflação e os aumentos brutais dos custos de construção os montantes anteriormente previstos para essas obras já só serão suficientes para construir uma parte, perdendo-se a oportunidade de alavancar a economia através das empresas.

O próprio sucessor de António Costa Silva na liderança da Comissão Nacional de Acompanhamento do Plano de Recuperação e Resiliência, Pedro Dominguinhos, reconhece que “a questão da inflação, a questão do preço dos combustíveis, levanta riscos de execução”, acrescentado que “há vários concursos, que já foram lançados, que tiveram que ser republicados”. Já o Ministério Público afirmou que a estrutura de missão não dispõe dos meios necessários para efetuar uma eficaz prevenção de fraudes e corrupção na atribuição dos meios do PRR.

Para além do PRR, o Banco de Fomento poderia ser outro instrumento para dinamizar a economia. Mas, depois da trapalhada na nomeação do chairman, foram precisos quase 2 anos para apresentar as contas de 2020, nas quais a própria comissão de auditoria assinala que “é reconhecida a escassez de recursos humanos”, “nomeadamente ao nível das funções de controlo interno, não tendo sido assegurado o cumprimento da superação de tal deficiência até à presente data”. A comissão acrescenta que esta situação condiciona “de forma significativa, o cumprimento dos objetivos estratégicos” do Banco.

Para além destas nuances, segundo o Banco de Portugal, o Banco Português de Fomento violou a lei ao conceder garantias públicas de 99 milhões de euros à Efacec. Como essas garantias foram essenciais para permitir a venda da participação do Estado na Efacec à DST caberá perguntar se o Banco de Fomento estará a ser usado para salvar a face do Governo na nacionalização de uma empresa que apresentou um resultado líquido negativo de 63 milhões de euros e um EBITDA negativo de 32 milhões de euros em 2021?

Será que o Banco de Fomento se vai tornar num repositório de empresas do regime e de boys em vez de ser um verdadeiro promotor da atividade de capital de risco e da estabilização das condições financeiras dos empréstimos das empresas de excelência do tecido empresarial português?

Será coincidência a Efacec e a DST liderarem projetos de investimentos de 1,3 mil milhões de euros que foram pré-qualificados para as agendas mobilizadoras de inovação empresarial financiadas pelo Programa de Recuperação e Resiliência?

Esperemos que sejam tudo coincidências e que apesar dos seus maus rácios financeiros a Efacec consiga retribuir em dobro ou em triplo os recursos públicos concedidos pelos contribuintes portugueses.

Mudando de tema, felizmente o turismo está a correr bem. Mas o crescimento do turismo deve ser acompanhado por infraestruturas e serviços que correspondam ao aumento da procura. No entanto, o novo Aeroporto de Lisboa continua sem uma solução.

Laura Caldeira, presidente do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, afirmou recentemente que “com os estudos que temos, neste momento, Alcochete parece ser a melhor solução a longo prazo. No Montijo temos a limitação da expansão”.

Enquanto o tempo passa o atual Aeroporto de Lisboa foi considerado um dos piores do mundo e os turistas têm sido recebidos com longas horas de espera, um facto que mina a boa imagem de Portugal junto dos nossos visitantes e que não será alheio à anunciada e depois cancelada extinção do SEF.

Mas os dramas sobre o aeroporto não ficam por aqui. Esta semana assistimos a um dos episódios mais rocambolescos da política portuguesa, com o primeiro-ministro a revogar o despacho do seu Ministro das Infraestruturas e da Habitação sobre o Plano de Ampliação da Capacidade Aeroportuária da Região de Lisboa, passando um atestado de incompetência ao ministro e a ideia de amadorismo na resolução de um assunto de interesse nacional.

Mas os desentendimentos não terminam nos meandros do Governo. O modelo de descentralização proposto pelo Governo levou à saída do Porto da Associação Nacional de Municípios Portugueses e vários autarcas argumentam, com razão, que o modelo de descentralização não foi bem definido, tanto ao nível das competências a descentralizar como do respetivo envelope financeiro associado a essas novas responsabilidades municipais.

Foi no meio deste furação, enquanto o mundo sobrevive a uma pandemia, a uma guerra, à inflação e à crise energética e alimentar, que primeiro-ministro veio pedir um aumento de 20% dos salários. Não poderia ter escolhido pior timing para essa boa intenção. Primeiro porque o aumento dos vencimentos da função pública foi de 0,9% quando a inflação ronda os 8%. Depois, porque segundo o estudo o Estado da Nação sobre Educação, Emprego e Competências em Portugal de 2022 da Fundação José Neves a produtividade em Portugal está a divergir da média Europeia. E por último porque Portugal voltou a cair no mais reputado ranking de competitividade internacional, passando da 36ª posição para o 42º lugar do Índice IMD de Competitividade Mundial de 2022, composto por 63 países.

Ora como sabemos, sem incrementos de produtividade e de competitividade é complicado promover o crescimento económico e o aumento sustentável e generalizado dos salários.

Dito isto, perante este seu desejo, quais foram as reformas estruturais realizadas por António Costa para aumentar a competitividade e a produtividade? Nenhumas. A taxa de IRC continua a ser uma das mais altas do mundo. A congestão dos tribunais supera os 150%. A carga fiscal sobre o trabalho voltou a subir em 2021, pelo terceiro ano consecutivo, colocando Portugal como o 10º país entre 38 da OCDE onde a fatia entregue ao Estado é maior. De acordo com o relatório anual Taxing Wages da OCDE, no ano passado a carga fiscal sobre o conjunto dos custos do trabalho atingiu os 41,8%, o que compara com uma média de 34,6% na OCDE. Os jovens mais qualificados continuam a emigrar, fazendo de Portugal um dos países com maior escassez de talento do mundo.

Efetivamente, em política o que conta não são as boas intenções. Um exemplo disso é a habitação. Segundo o índice do esforço para comprar habitação na OCDE, em 2021, os portugueses foram os cidadãos da OCDE que mais recursos tiveram de alocar para comprar a sua habitação, sendo Portugal o segundo país da OCDE onde este índice mais cresceu entre 2017 e 2021.

Em suma, assistimos a um padrão. Os Governos liderados por António Costa sacrificam a competitividade da economia e o investimento público em setores essenciais para satisfazer as suas clientelas políticas, obter apoio dos seus parceiros de geringonça e comprar paz social. Assim, cativou-se investimento, abdicou-se do planeamento de longo prazo, apostou-se na propaganda, desaproveitaram-se os recursos humanos e financeiros disponíveis, acabaram-se com as boas PPPs, escolheram-se ministros com critérios meramente políticos, fecharam-se os olhos às principais dinâmicas globais e não se preparou o país para enfrentar os grandes desafios nacionais, em particular o inverno demográfico e a falta de competitividade da economia.

Posto isto, apesar dos records de funcionários públicos e de carga fiscal, o Estado Social e os serviços públicos estão a degradar-se. Chegados aqui, o País não precisa de otimistas irritantes nem de boas intenções. O País precisa de reformas na fiscalidade, na justiça, na saúde e na educação. Mas todos sabemos que a aversão do Governo do PS a reformas é inversamente proporcional à sua capacidade de propaganda e ao seu ímpeto para tomar medidas eleitoralistas. Por estas razões, Portugal precisa urgentemente de uma alternativa política reformista e credível que evite a degradação da qualidade da Democracia, a destruição do Estado Social e a vergonha de sermos ultrapassados por todos os nossos pares Europeus no PIB per capita. Porque um Governo que falha com doentes, grávidas, estudantes, jovens, turistas e empresas é um Governo que falhou.

30 de junho de 2022