Segundo alguns leitores que comentaram o meu último texto, nenhum artigo é completo. E de facto assim é. Aquele texto passa tanto mais abreviadamente por cima do PSD quanto receio que este partido não tenha tão cedo, como o PS também não possui, uma saída provável para o actual impasse partidário e para reabilitar a democraticidade constitucional de 1976. Com efeito, nenhum dos dois grandes partidos instalados no poder há perto de 50 anos é capaz de «revolucionar» o sistema político nem parece pretender fazê-lo. Só sairemos, pois, do actual impasse partidário quando for promovida pelo parlamento uma «revolução constitucional»!

Deve-se isso à urgente necessidade de rever profundamente as actuais estruturas constitucionais do país de molde a impor de novo a democraticidade que sucedeu à tentativa «revolucionária» de 1975, a qual se evaporou devido a inúmeras razões, nomeadamente à rápida base eleitoral fornecida pelas bases democráticas estabelecidas pela Constituição de 1976!

Dito isso, o primeiro desvio à Constituição reside até hoje no facto de ela nunca ter sido referendada! O segundo desvio é a ausência de referendo à adesão à CEE em 1985 e às suas sucessivas alterações. Ao contrário do que sucedeu na generalidade dos países membros, a classe política portuguesa cedo monopolizou as regras do jogo europeu até hoje não permitindo à generalidade da população conhecê-las! Entre parêntesis, recordo a exclamação do Dr. Almeida Santos, então n.º 2 do governo socialista, quando me ouviu dizer que a Constituição deveria ser submetida aos eleitores: «Você está maluco!» O mesmo se tem passado com numerosas outras medidas europeias de ordem constitucional que nunca foram ratificadas!

Outra medida absolutamente necessária para limitar o poder dos dois partidos maioritários é rever o sistema eleitoral. O objectivo é garantir a maior proporcionalidade possível entre o número de votantes por partido e a respectiva proporção de deputados eleitos a fim de limitar os «votos perdidos» e de garantir a proporcionalidade eleitoral. Parece uma formalidade, mas não é!

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Basta recordar que, nas últimas eleições legislativas, o PS teve apenas 41,5% dos votos correspondendo a cerca de 85 deputados, quando na realidade obteve o número de 119 em 230, o que evidentemente só se explica pela crescente desproporcionalidade entre as percentagens de votantes e de eleitos, sobretudo nas zonas interiores do país onde impera a crescente desertificação. Ora, isso deve-se a uma vetusta geografia eleitoral que já não faz qualquer sentido mas que convém, alternadamente, aos «dois grandes partidos», como lhes chamam!

Ora, se a democracia não se limita à liberdade individual e exige ser também representada por um número de pessoas proporcional à sua condição social, às suas aspirações futuras e às suas convicções políticas, como sucede na Alemanha e na maioria dos países nórdicos, é urgente reduzir a abstenção nos chamados «pequenos partidos» devido ao isolamento geográfico de grande parte dos eleitores.

A urgente revisão dos cadernos eleitorais a partir do zero asseguraria uma proporcionalidade substantiva e não meramente quantitativa, conferindo ao sistema eleitoral uma espessura democrática que o mero individualismo não possui. O que se passou em Portugal, que começou bem mas acabou pessimamente, foi que os dois maiores partidos se apoderaram não só dos cadernos eleitorais como das vantagens conferidas eternamente ao poder partidário!

Nada que não possa ser corrigido se houver vontade de redemocratizar o distorcido regime eleitoral com que vivemos no século XXI ao mesmo tempo que tivemos de sobreviver à falência do governo Sócrates em 2011 e aos novos desastres dos governos PS, desde a pandemia à guerra e à actual crise económica e financeira! Nesse período, a aliança PSD+CDS só teve oportunidade de gerir os resultados da bancarrota socialista sob a tutela do FMI…

Por fim, com o acesso do actual primeiro-ministro ao poder em Novembro de 2015 graças ao «golpe da geringonça», nunca até então imposto aos eleitores a posteriori, ou seja, essa famigerada «aliança» nunca fôra previamente anunciada ao eleitorado nem os inesperados apoiantes do PS (PCP+BE) tinham lugar no governo, contentando-se em comer as migalhas do poder até o PS obter uma «maioria absoluta de deputados» com apenas 41% dos eleitores e com os sucessivos desastres vindos do exterior e do interior…

Após os dez anos de modernização administrativa e de crescimento económico conduzidos por Cavaco Silva graças à entrada de Portugal na Europa (1985-1995), o PS apoderou-se do país desde 1996 até hoje, apenas excluindo as inadequadas intervenções de Durão Barroso e Santana Lopes (menos de 3 anos ao todo) e o resgate gerido por Passos Coelho durante 4 anos.

Assim tem o PS desgovernado o país quase sucessivamente durante mais de 20 anos desde os anos finais do século XX, permitindo-se até hoje todos os golpes e pontapés a fim de manter o poder e desbaratar as sucessivas presidências do PSD e do CDS, incluindo as actuais, e daí não ter havido até agora a visão nem o peso necessários para resgatar a democracia portuguesa.