Grassa a falta de confiança nos partidos convencionais enquanto crescem as ilusões com os chamados «populistas». Sejam quais forem os poderes e as manipulações dos partidos consagrados, são cada vez mais os eleitores que se abstêm ou que se viram para os «populistas» que tudo prometem e, até agora, não conseguem mais do que piorar as coisas, aumentando a desconfiança bem como a crescente instabilidade nacional e internacional.

Fora da Europa, as pseudo-eleições da Venezuela e a continuação da «terra de ninguém» em que o Brasil continua a viver politicamente a pouco mais de 4 meses das eleições presidenciais são dois importantes exemplos negativos do que aí vem em dois países que afectam Portugal indirectamente. Na UE, que nos afecta directamente, o governo saído das eleições italianas – o único país do mundo que tem uma dívida maior que Portugal em percentagem do PIB – só aumentou o grau de incerteza política e já provocou a subida do juro da dívida em três dias. Tomaram o poder dois partidos assumidamente populistas, a Liga e o 5 Estrelas, que reúnem 50% dos votos e cobrem o país de Norte a Sul, mas isso não impediu um economista de pedir logo que a «geringonça» apoiasse o pedido italiano de reestruturação da dívida.

Além do apelo crescente aos «populismos» ou às coligações improváveis, como foi o caso da eleição do Presidente Emmanuel Macron, assim como era improvável que o PS português conseguisse formar governo se tivesse dito antes das eleições de 2015 que ia aliar-se com partidos anti-europeus e adversos à democracia representativa como o PCP e o BE, a desconfiança dos eleitores em relação aos partidos do sistema mede-se há muito tempo pela «crise da representação política». Num país como Portugal, cujo sistema partidário foi congelado pelas elites políticas há 40 anos, a manifestação mais evidente dessa crise é a abstenção eleitoral maciça.

Nos últimos três anos um após outro, nas eleições parlamentares de 2015 e nas autárquicas de 2017, contando os votos brancos e nulos como uma forma de abstenção, praticamente metade do eleitorado absteve-se e nas presidenciais de 2016 a percentagem dos abstencionistas subiu a 53,5%! Acontece que estes últimos são tanto mais difíceis de identificar quanto evitam declarar o seu comportamento real: num estudo com alguns anos, a percentagem de inquiridos que declarou ter votado nas legislativas de 2002 – significativamente mais do que na realidade – alterava de tal modo o resultado que o PS teria ganho a eleição em vez do PSD como foi o caso!

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Com efeito, tal é o distanciamento do eleitorado em relação à política partidária que, desde a primeira votação livre para a Assembleia Constituinte em 1975, na qual votaram quase 92% dos inscritos, a abstenção nunca mais cessou de aumentar. De onde vem e como se exprime essa falta de confiança? Poucos estudos portugueses que permitem responder à pergunta mas pode-se usar o «barómetro da confiança política» existente em França, cuja 9.ª edição realizada em 2017, nove meses após a eleição de Macron, indicava que «os franceses não têm, por ora, razões suficientes para reencontrar a confiança na vida política».

Com efeito, ao cabo de um ano, 44% dos franceses continuavam a declarar que nunca tinham tido confiança em Macron. É relevante notar que o presidente da câmara municipal de cada um, embora em queda, era o único representante no qual os cidadãos tinham alguma ou muita confiança. Os representantes regionais e departamentais eleitos, que nós não temos, recebiam a confiança de cerca de 40% dos eleitores, enquanto o presidente da República tinha apenas 36%, assim como o primeiro-ministro. Quanto aos deputados, estavam em queda, apenas 34% dos deputados franceses merecendo a confiança dos eleitores e só 25% dos deputados europeus. Comparando com algo comparável em Portugal, pode-se dizer que a confiança decresce com a distância e que o sistema eleitoral uninominal francês garante maior confiança aos eleitores do que o sistema prevalecente em Portugal, onde o próprio presidente da República teve apenas 25% dos votos dos inscritos.

Quanto às instituições, a confiança varia também com a distância entre pouco mais de 50% no município próximo e 30% no governo do qual os cidadãos se sentem longe. Por último, quando aos «sentimentos em relação à política em geral», predominam claramente os «sentimentos negativos», tais como a «desconfiança» (39%) e algo difícil de traduzir (dégoût) que vai da «repugnância» ao «nojo» (25%), em comparação com os «positivos» como «interesse» (11%) e «esperança» (8%). Além de ser útil para ajudar a interpretar os comportamentos eleitorais, seria importante aplicar regularmente em Portugal um questionário equivalente a fim de conhecer as causas da falta de confiança e da distância ao poder que os eleitores portugueses sentem em relação à vida política.