Tenho amigos e pessoas de família que vão votar no Chega. Muitos desses eleitores são jovens. Há uns dias tive a seguinte conversa com um sobrinho, que vai votar pela primeira vez. “Manuel em que partido vais votar?“ “No Chega, tio.” Confesso que fiquei admirado com a resposta e exclamei, “No Chega???” “Sim tio, e a maioria dos meus amigos também vota no Chega. Alguns votam na AD mas quase todos vão votar no Chega.” Aí, perguntei, “e na esquerda, no PS, no Bloco, ninguém vota?” Ele respondeu: “na esquerda, só votam os velhos.”

Os estudos de opinião confirmam que o Chega é o primeiro partido nas preferências dos jovens, seguido pela AD. Posso garantir que estes jovens não são racistas, têm amigos negros, filhos de emigrantes – amigos mesmo, não apenas conhecidos. E nem sequer sabem o que é o fascismo. Vivem os problemas de Portugal. Sentem que as escolas não funcionam bem (o meu sobrinho acima referido estuda num liceu público, e não numa escola privada). Vêm os irmãos ou primos mais velhos a emigrarem porque não encontram bons empregos em Portugal. Os jovens sabem muito bem quando vivem num país sem um grande futuro.

Claro que os jovens de hoje, como em todos os tempos, também são rebeldes e contra os poderes instalados. Hoje, o PS e a esquerda são os poderes instalados. Para usar uma expressão que muitos socialistas usavam quando eram jovens para atacar a direita, agora aos olhos dos jovens portugueses é “a esquerda que é reacionária”.

Mas há pessoas de todas as idades a votar no Chega. Há uma minoria que é saudosista do Estado Novo e do Salazar, não vale a pena esconder. Mas a maioria não é. A maioria está simplesmente zangada. Cresceram no pós-25 de Abril, assistiram à adesão à Comunidade Europeia, e à vinda de centenas de milhões de euros de Bruxelas para Portugal. Acreditaram que Portugal seria um país rico, onde as pessoas viveriam confortavelmente, e onde quem quisesse trabalhar enriqueceria. Foi isso que ouviram de todos os governos durante décadas. Também ouvem há décadas que a saúde e a educação públicas vão melhorar. Mas só pioram, cada vez se degradam mais.

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Esses eleitores do Chega sentem-se atraiçoados pela classe política. Prometeram um país que nunca chegou. Pior do que tudo, a classe política que lhes prometeu esse país, ignora-os, usa o poder para seu benefício e para ajudar os amigos, e mete-se em casos de corrupção. Esses eleitores estão absolutamente convencidos que existem dois países. Um país onde a classe política se beneficia a si própria, e um país onde as pessoas se fartam de trabalhar para se limitarem a sobreviver.

Há muitos eleitores que estão muito zangados com a classe política, e têm razões para isso. Muito deles, não sentem qualquer ilusão com o Chega ou com André Ventura, mas pelo menos é novidade e nunca os traiu. E quanto mais os partidos tradicionais atacarem o Chega, mais convencidos ficam a votar no partido de Ventura.

Os dirigentes da AD devem tentar compreender estes eleitores e não os atacar. Devem tentar recuperá-los. Tratá-los como fascistas ou racistas não é a melhor forma de recuperar os seus votos. A maioria destes eleitores é da família política dos eleitores da AD. Votaram frequentemente nos mesmos partidos. Mas agora estão mais zangados ou são menos lúcidos, e também se desiludiram com o PSD e com o CDS. Mas nunca devem ser ofendidos pelos outros partidos de direita. No fundo, continuam a fazer parte dos nossos. Eles podem não saber. Mas a AD tem que saber.