Causou algum escândalo, entre os comentadores do Observador, a notícia de um sr. ministro do atual Governo ter constituído uma empresa de intermediação imobiliária um dia antes de ter tomado posse. E a indignação subiu de tom quando se descobriu que um outro sr. ministro teria encontrado tempo, entre os afazeres da governação, para montar e executar uma operação especulativa, também no setor imobiliário, e assim ganhar uma pequena fortuna.

Dado que as facetas menos positivas desta veia empreendedora de vários membros do nosso Governo já foram analisadas exaustivamente, valerá a pena considerar agora alguns dos aspetos mais positivos.

Antes de mais, há que notar a confiança na vitalidade da economia nacional que estas atividades demonstram: ninguém abre uma empresa se não tem a expetativa de vir a faturar, nem compra ativos se acha que os preços vão cair. No meio de notícias preocupantes sobre o abrandamento do crescimento económico do país nos últimos meses, estes relatos põem em evidência um forte sentimento otimista, pelo menos numa classe seleta de investidores. Esperemos que o seu otimismo contagie outros setores do mercado.

Depois, há que considerar o voto de confiança nas instituições e instrumentos da economia de mercado, que estas ações implicam. Num país constitucionalmente a caminho do socialismo, dois srs. ministros de um Governo socialista, apoiado por comunistas clássicos e efervescentes, demonstram com ações concretas, não só que não há nada de eticamente condenável no mercado livre, mas também que, para criar riqueza, não se pode ficar à espera do socialismo. Repare-se que o sr. ministro criou uma empresa, não um movimento, um sindicato ou sequer uma cooperativa; e ainda por cima, uma empresa comercial, não industrial, uma entidade meramente “extrativa do valor incorporado no produto pelo trabalho das massas proletárias exploradas”, que ele professa defender dos excessos do capital. Atente-se também que o outro sr. ministro se limitou, sem usar do aparelho coercivo do Estado, a aplicar o seu capital a comprar a quem lhe vendia barato para vender pouco depois a quem lhe comprava caro, ao que tecnicamente se chama especulação. Será isto um excesso? E haverá algo que dê mais prazer a um neoliberal do que ver um neomarxista a especular? Ainda por cima, não por necessidade, mas por gosto? Não constitui isto mais uma evidência de que a iniciativa humana floresce onde há liberdade, e definha onde o espartilho socialista limita a autonomia das pessoas?

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Tanto quanto é possível perceber, também parece que o fim destas atividades económicas é o enriquecimento privado, não o bem público. Na falta de um esclarecimento de que os lucros gerados por estas atividades, depois do pagamento dos impostos devidos, se destinam a ser doados à Segurança Social ou ao Serviço Nacional de Saúde, para contribuir para a sua sustentabilidade e fortalecimento do Estado Social, ou, ao menos, entregues ao PS, para potenciar a luta por uma sociedade ainda mais solidária, este comportamento demonstra que, no Estado Social em que vivemos, cada qual trata de si. Este esboroar do espírito solidário e concomitante apelo à responsabilização individual pelo seu bem-estar económico, feito nada menos que pelos líderes do movimento socialista, não pode deixar de ser saudado por todos os que acreditam na bondade do individualismo liberal Schumpeteriano e no progresso social que o desmantelamento do Estado Social proporcionará ao nosso povo.

Finalmente, há que considerar o mercado que os srs. ministros elegeram para exercer os seus dotes empresariais: o imobiliário. E fica a dúvida: será por influência daquele político americano que, desde muito jovem, e ainda antes de ser político, se dedicou à especulação imobiliária? E a todos os críticos no Observador pergunta-se: então que exemplo preferem que os nossos ministros sigam, o dos dr. Sócrates & eng. Lula, ou o do sr. Trump?

E quem são os patinhos neste esquema neomarxista? Não são os que, religiosamente, votam socialista?