Bem pode, no Mundo, como o conhecemos, acontecer uma inversão geomagnética que as lideranças políticas em Portugal pouco ou nada se preocuparão com o assunto. Continuará a ser garantido que, mesmo com este possível acontecimento, o planeta não será vítima de uma extinção em massa ou de uma catástrofe natural e, portanto, a seu tempo alguém irá resolver os devastadores efeitos que possa ter na tecnologia. O mesmo acontece com as ameaças internas e externas nas questões da segurança e defesa da soberania portuguesa. Se existem, e são muitas, alguém irá decidir o que fazer, ou talvez não, mas isso também pouco importa. Portugal continua a ser considerado como o sétimo país mais seguro do mundo, o quarto na União Europeia, segundo a última edição do Global Peace Index e, como tal, daí não resulta preocupação para a governação.

Atente-se, antes de mais, no País à nossa volta, onde o que agora acontece é o somatório de más decisões políticas ou mesmo da falta delas. Não se trata de juízos de valor ou estudos académicos, mas, sim, factos reais, demonstrados e dramáticos. Desde logo, o número dos militares ao serviço das FFAA, na ordem dos 20 mil, muito abaixo dos 30.840 autorizados pelo D.L. 6/2022, de 07 de Janeiro, quantitativos já de si bastante reduzidos. Os partidos, os políticos e a sociedade em geral não podem alhear-se deste assunto e todos, sobretudo os primeiros, devem colocar o mesmo na agenda da campanha e mais ainda nas primeiras prioridades da governação futura. A falta de efetivos, os pedidos de abate ao QP de oficiais, as questões do estatuto e da condição militar, da gestão de carreiras, do apoio sanitário e complementar, da integração no sistema da Segurança Social são, em tudo, os elementos mais que suficientes para potenciar um cada vez maior e crescente clima geral de insatisfação, desmotivação e de injustiça relativa nos militares e capaz de, no curto prazo, comprometer de forma significativa a prontidão operacional das FFAA e, até, o cumprimento da sua missão ao serviço do País e dos portugueses.

Acresce que o governo socialista, agora demissionário, com a satisfação da revindicação da Polícia Judiciária na atribuição do suplemento de missão aos trabalhadores das carreiras especiais e das carreiras subsistentes, pelo exercício de funções em condições de risco, insalubridade e penosidade, tido como um investimento na valorização das carreiras, com o objetivo de reforçar os seus meios de combate às diversas formas de criminalidade, o que é laudável, abriu a caixa de Pandora para as carreiras de igual categoria. Repare-se que o anúncio da ministra da Justiça, a título de exemplo, de que os trabalhadores da carreira de investigação criminal passarão a auferir um valor mensal de 996,94€ de suplemento de missão, o que representa um acréscimo de 518,86€, face ao valor anteriormente auferido a título de suplemento de risco, nem é passível sequer de comparação, a não ser pelo ridículo, com o anúncio faustoso da ministra da Defesa do aumento da componente fixa do suplemento de condição militar em 70 euros, passando de 30 para 100 euros. A previsível reação das polícias, também eles merecedores de igual reconhecimento e valorização, a que se somam os militares da GNR, os guardas prisionais e todas as demais instituições ligadas à segurança interna, não acontece (ainda) nas FFAA, não acontecerá de igual forma por força da condição militar, mas é uma ameaça interna, pois criou as condições objetivas para aparecerem “movimentos inorgânicos” nas Forças Armadas. A vacuidade do Ministério da Defesa, o silêncio do Comandante Supremo das FFAA e a absoluta inexistência do Estado Maior General das FFAA, todos sem uma palavra que seja aos militares não augura bom resultado. As Associações Militares atentas aos desabafos dos militares nos quarteis já começaram a dar nota crítica e imagina-se que estejam à espera da resposta governamental às revindicações das Forças de Segurança, mas também os generais já deram o mote do estado da arte através do recente comunicado do Grupo de Reflexão Estratégica Independente.

Os militares aceitam a renúncia a direitos, liberdades e garantias que a CRP atribui a todos os cidadãos, assumem a obrigação de dar a vida pela Pátria, na defesa de Portugal e dos portugueses, reconhecem a necessidade da total e permanente disponibilidade para o desempenho de missões operacionais, quer em ambiente real, quer em treino e exercícios, com elevado risco, exigem de si próprios uma profunda capacidade técnica, física e psicológica que os ajude a combater também o afastamento familiar, a companhia dos amigos e as agruras de uma vida penosa, mas lidam mal com a injustiça, por força de tudo isto que abdicam em prol do País e da Bandeira que ostentam no ombro esquerdo. E, nesta altura de campanha eleitoral, todos, homem ou mulher, do soldado ao general, certamente se questionam do porquê de ainda nenhum, nem um sequer líder partidário se referiu à Defesa e às suas FFAA. A razão é simples, não dá votos!

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Menos votos ainda dará trazer para a opinião pública, como outros países europeus já o fazem, a discussão sobre o regresso do Serviço Militar Obrigatório, que hoje envolve questões complexas variadas, como as implicações financeiras do mesmo, a natureza das ameaças, a mudança de mentalidades ou a sua implementação igualitária e justa. A criação de uma reserva de defesa, crucial para mobilizações rápidas e a resposta a imprevistos ou mesmo, os intangíveis desse serviço como a coesão social, permitindo que jovens de diferentes origens sociais, económicas, culturais e de ambos os sexos, vivenciem experiências comuns, o que contribui para a construção de uma identidade nacional, a aquisição de competências que serão valiosas nas suas vidas civis, incluindo camaradagem, liderança, habilidades técnicas e físicas, a par de enfatizar a disciplina, a responsabilidade pessoal e a resiliência, a redução das desigualdades sociais onde o rico e o pobre são colocados em iguais formas de servir a Pátria, podem ser importantes para o País, mas não são para os partidos nem para os políticos. A direita não tem a coragem de trazer o assunto a palco e a esquerda, sobretudo a que defende a nossa saída da NATO, não quer perder o eleitorado que ainda lhes resta. É uma discussão cara, mas será que os nossos políticos já pensaram quanto custa a liberdade? A certeza de que “não é soberano quem quer, é soberano quem pode” não está apenas vinculada à vontade, mas também à capacidade de exercer o poder efetivo, não é apenas uma questão de desejo, mas sim a capacidade real de Portugal ser livre no Mundo.

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Desde a II Guerra Mundial que se assiste na Europa ao desejo generalizado de evitar futuros conflitos e promover a paz, a UE foi concebida para promover a colaboração entre os países membros, reduzindo as tensões e as razões para manter grandes forças armadas, a presença de forças militares dos EUA nalguns países europeus e a garantia de segurança oferecida pela NATO permitiram uma redução das forças armadas, a perceção das ameaças à segurança mudou com o colapso da União Soviética em 1991 e a ênfase passou para as soluções diplomáticas para resolver disputas internacionais. Entretanto em 2022, este equilíbrio acabou. A guerra entre Rússia e Ucrânia fez ressurgir o temor de uma nova Guerra Mundial. A isto juntou-se a guerra de Israel contra o Hamas, a instabilidade provocada pelos Houtis no Mar Vermelho, o conflito Azerbaijão x Armênia em Nagorno-Karabakh, a tensão entre Taiwan e a China, a provocação permanente nas Coreias e nem a guerra da Síria ou a guerra civil no Iémen terminaram, tudo isto num Mundo onde ainda existem 13.080 armas nucleares, das quais 90% pertencem a dois países, a Rússia e os Estados Unidos. As guerras que se desenvolvem em escala local, mais especificamente na Ucrânia, podem ganhar novos desenvolvimentos e escalar rapidamente, passando a incluir assim outros países europeus e dos demais continentes.

O almirante Rob Bauer, presidente do Comité Militar da NATO, experiente militar, já desafiou tanto os governos quanto os civis para se prepararem para conflitos contundentes e para a perspetiva de serem recrutados para uma guerra que exigirá uma mudança total nas suas vidas nos próximos 20 anos. “Temos de perceber que não é um dado adquirido que estamos em paz. E é por isso que nós (forças NATO) temos planos, é por isso que nos estamos a preparar para um conflito com a Rússia”, disse Bauer aos jornalistas após uma reunião dos chefes de defesa da NATO em Bruxelas. “Precisamos que os intervenientes públicos e privados mudem a sua mentalidade de uma era em que tudo era planeável, previsível, controlável e centrado na eficiência, para uma era em que tudo pode acontecer a qualquer momento. Uma era em que precisamos esperar o inesperado”, alertou Bauer, acrescentando que “é preciso ser capaz de ter que se recorrer a uma base industrial que seja capaz de produzir armas e munições com rapidez suficiente para poder continuar um conflito, se estivermos nele”. Estas declarações aconteceram num contexto do anúncio do exercício militar Steadfast Defender 2024, a maior simulação de guerra organizada pela NATO desde o fim da Guerra Fria, tendo em vista a defesa da Europa. Foram mobilizados 90.000 soldados, envolvendo forças dos 31 países membros da OTAN, além da Suécia, candidata a membro, com Portugal a participar com 37 militares. Sim, leram bem e nem vale a pena, por vergonha alheia, comentar mais nada!

O anúncio deste exercício NATO surge depois de a Alemanha ter revelado que as forças de Putin estão a preparar-se para um ataque à NATO em 2025, com o Ministro da Defesa da Alemanha, Boris Pistorius, a enfatizar a necessidade de “fortalecer rapidamente a nossa capacidade de defesa dada a urgência da situação de ameaça.” Os citados planos revelam em detalhe o que poderia ser o caminho para uma Terceira Guerra Mundial, com Putin usando a Bielorrússia como plataforma de lançamento para uma invasão – como fez em Fevereiro de 2022 para a sua guerra com a Ucrânia. O general Patrick Sanders, chefe do exército britânico, avisou os cidadãos do Reino Unido para estarem preparados para uma guerra à escala dos grandes conflitos do século XX – e que eles próprios poderão ter de se mobilizar. Joe Biden, presidente dos EUA, tem o hábito de fazer referência ao espectro de outra guerra mundial e várias vezes já afirmou que os EUA “estão a tentar evitar a Terceira Guerra Mundial”.

Perante as ameaças internas atrás referidas e em face das gravosas ameaças externas, o que faz a ainda ministra da Defesa? Pavoneia-se em mais uma edição do Dia da Defesa Nacional e vangloria-se de que 25% dos jovens participantes se mostraram disponíveis para participar na defesa do País. O facto de 75% não estarem para aí virados não lhe diz nada! Perante os sinais dos políticos europeus o que fazem os nossos políticos em campanha sobre a Defesa? Diga-me o leitor, porque não vi sinal algum de preocupação nessa matéria.

Para além da fulcral questão dos efetivos, a Lei de Programação Militar aprovada já no meio da guerra da Ucrânia não responde às novas realidades que se vivem no Mundo e é forçoso que o novo governo que saia das eleições de 10 de Março esteja preparado para atuar rapidamente sobre essas graves limitações das FFAA. A última resolução do Conselho de Ministros aponta para que dos 34 carros de combate existentes na Brigada Mecanizada apenas 14 irão ser recuperados, no Exército estamos sem capacidade de defesa aérea, na Força Aérea sem pilotos, na Marinha só um terço dos principais meios de combate (fragatas, corvetas e submarinos) estão disponíveis, e assim mais depressa Lisboa será russa que Olivença será nossa. Os políticos portugueses continuam a assobiar para o ar e, católicos ou não, todos parecem confiar mais na oração à Nª Srª de Fátima do que na proteção dos nossos valorosos Soldados de Portugal. Os portugueses que se preocupam com a Defesa devem estar curiosos com os programas dos partidos nesta área, mas se forem tão pensadas como têm sido as palavras que em campanha têm proferido os nossos políticos em defesa das nossas FFAA, bem merecem o nosso voto!