No domínio das relações laborais, a formação profissional é do interesse de ambas as partes, uma vez que, por um lado, permite à empresa um aumento de produtividade e de competitividade e, por outro, ao trabalhador aumentar e melhorar a sua qualificação e nível de empregabilidade.

A este respeito, o Código do Trabalho consagra, de forma expressa, o dever de o empregador contribuir para a melhoria do nível de produtividade do trabalhador, designadamente proporcionando-lhe formação profissional.

Este dever do empregador de assegurar formação profissional deve subsumir-se ao conceito de formação contínua, a qual determina que, de uma forma mais concreta, as empresas devem facultar aos seus trabalhadores um mínimo de 40 horas de formação por ano – sendo que, no que respeita aos trabalhadores contratados a termo por um período igual ou superior a três meses, é feito um cálculo proporcional do número de horas de formação a disponibilizar.

O empregador está obrigado a incluir, todos os anos, 10% dos seus trabalhadores no plano de formação que vier a estabelecer, podendo antecipar ou diferir até dois anos a realização da sua formação anual. Esta percentagem é calculada sobre o número de trabalhadores existentes na empresa a 31 de dezembro do ano anterior.

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No caso de diferimento da formação esta tem de constar obrigatoriamente do plano de formação do empregador, sendo a formação realizada pelo trabalhador sempre imputada ao cumprimento da obrigação mais antiga. Em termos práticos, caso o trabalhador não tenha feito formação em 2020 e 2021, a formação que vier a realizar em 2022 (60 horas, por exemplo), será imputada, em primeiro lugar, ao direito à formação profissional relativa ao ano de 2020 e, na parte que exceda as 40 horas, ao ano de 2021.

A formação profissional poderá ser assegurada pelo empregador, por entidade formadora certificada ou por estabelecimento de ensino reconhecido pelo ministério competente, sendo a área de formação profissional determinada por acordo ou, na falta deste, pelo empregador, caso em que deve coincidir ou ser afim com a atividade prestada pelo trabalhador.

Sempre que o empregador não assegure ao trabalhador as 40 de formação anuais até ao termo dos dois anos posteriores ao seu vencimento, estas transformam-se em crédito de horas de igual número para formação por iniciativa do trabalhador – o que conduz, assim sendo, à evidência que a formação profissional é, na verdade, um verdadeiro direito/dever do trabalhador.

Nesta situação, a área de formação é escolhida pelo trabalhador e tem de corresponder à atividade prestada ou, em alternativa, respeitar a tecnologias de informação e comunicação, segurança e saúde no trabalho ou línguas estrangeiras.

É importante saber em que data se pode considerar vencido o direito à formação profissional já que, uma vez vencido, a legislação laboral fez recair o ónus de gozar os créditos de horas de formação profissional sobre o trabalhador.

O trabalhador, querendo, pode utilizar o crédito de horas para a frequência de ações de formação, mediante comunicação ao empregador com a antecedência mínima de 10 dias.

O regime legal prevê a possibilidade de, por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou acordo individual, ser estabelecido um subsídio para custear parte do crédito de horas utilizado, o qual não poderá, contudo, exceder o valor da retribuição do período do crédito de horas utilizado.

Atendendo a que a formação profissional é um direito do trabalhador, a lei incentiva-o a gastar os créditos à formação, prescrevendo que, se o trabalhador não os gozar no prazo de três anos, a contar da sua constituição, estes caducam, ou seja, o trabalhador deixa de ter direito aos mesmos.

Tratando-se a formação de um direito/dever, não podemos deixar de alertar que o trabalhador tem a obrigação de aceitar ordens legítimas da sua entidade empregadora, constituindo a recusa injustificada de frequentar formação uma situação de possível violação dos seus deveres, podendo, inclusive, o empregador instaurar-lhe um eventual procedimento disciplinar com fundamento em desobediência.

Sempre que as horas de formação ocorram fora do horário de trabalho, mas não ultrapassem as duas horas diárias, devem ser pagas ao trabalhador ao valor da hora normal, uma vez que o Código do Trabalho apenas considera como horas de trabalho suplementar as horas de formação que excedam as duas horas diárias após o período normal do trabalhador, estando sujeitas ao pagamento de trabalho suplementar.

No momento da cessação do contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição correspondente ao número mínimo anual de horas de formação que não lhe tenha sido proporcionado ou ao crédito de horas para formação de que seja titular à data da cessação.

Posto isto, numa altura em que a economia portuguesa vive a maior revolução tecnológica de sempre – indústria 4.0 – e enfrenta níveis de concorrência cada vez mais elevados, decorrente do seu processo de internacionalização, é da maior relevância para a competitividade e produtividade do nosso tecido empresarial português que se aposte fortemente na formação profissional dos trabalhadores.

A nossa estrutura empresarial e os trabalhadores “humanos” necessitam de se adaptar à força de trabalho simbiótica de Inteligência Artificial e às novas tendências/realidades laborais – sendo que, para o efeito, é importante apostar na formação como forma de requalificação e renovação de competências profissionais.

Quem tiver a capacidade de perceber isto, estará certamente mais preparado para enfrentar os desafios do direito do trabalho do futuro.