Mau. Agora, estou baralhado. Então mas, afinal, a Humanidade está à beira da extinção em massa, como nos dizem os políticos presentes na cimeira do clima, COP26, ou avizinha-se um futuro glorioso para a Humanidade, como nos dizem os políticos presentes na Web Summit? Atenção, longe de mim alinhar por aquele clássico segundo o qual “Isto os políticos é tudo uma cambada de vigaristas!” Mas lá que alguém está a aldrabar-nos, está. É impossível não estar. Não há hipótese, nenhuma, de conciliar os cenários “juízo final iminente” e “paraíso celestial proximamente”. Isto a COP26 e a Web Summit são, no fundo, histerias à compita.

Sendo convidado a apostar se andamos a ser ludibriados pelos políticos do apocalipse imediato, ou pelos políticos do céu vindouro, poria o meu dinheiro em como estamos a ser burlados por todos eles. Porque a verdade é que, não sendo justo presumir que os políticos são todos trapaceiros, é sempre saudável desconfiar, a priori, das suas intenções. Afinal, os políticos são indivíduos que, ou acham que sabem melhor do que nós o que é melhor para a nossa vida, o que é improvável, ou simplesmente querem ter o poder de mandar nas nossas vidas, o que é quase certo.

Bom, mas pelo menos a cimeira do clima está a correr muito bem. Menos para o desgraçado do clima, como é evidente. Que o combustível fóssil que se queimou para fazer chegar a Glasgow os imprescindíveis 25 000 delegados ao evento, e os fundamentais 120 líderes mundiais presentes, dava para alimentar as necessidades energéticas da Nicarágua durante três décadas. Pena os participantes da COP26 não terem vindo, antes, à Web Summit. Se o têm feito, tinham tomado conhecimento da existência de umas tecnologias novas que permitem às pessoas falar à distância e, inclusive, verem-se, umas às outras, num ecrã. Que é como quem diz uma pantalha, para quem não está familiarizado com estas modernices tecnológicas.

Um dos grandes sucessos dos primeiros dias da COP26 foi a promessa do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, de alcançar a neutralidade carbónica do seu país em 2070. Portanto, a ver se eu percebi. O actual primeiro-ministro da Índia, que conta 71 anos, e cujo mandato acaba em 2024, comprometeu o seu país de 1,38 mil milhões de pessoas com aquela que será, porventura, a mais profunda transformação económica da sua história, num processo que se prolongará por quase 50 anos após o fim do seu mandato e, muito provavelmente, durante décadas após o fim da sua própria vida. Hum… Eu não ficaria muito surpreendido se este compromisso tivesse sido assinado, não em papel timbrado da COP26, mas numa base para copos do Famous Grouse.

Já na Web Summit, o Presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, anunciou a intenção de criar a Fábrica de Unicórnios de Lisboa. Lá está, Carlos Moedas é um dos participantes da Web Summit que devia ter ido, antes, à COP26. Se o edil da capital tem estado na cimeira do clima, saberia que, em lugar de uma fábrica de unicórnios, devia era investir numa arca para meter os unicórnios e o resto da bicharada toda. Salvando assim a criação, logo que a subida das águas do Tejo inunde Campo de Ourique. O que deve suceder para aí na semana que vem, o mais tardar.

Quem também pontificou na Web Summit foi um tal de Dorry Segev, que dizem ser “o mais reconhecido epidemiologista da Escola de Medicina John Hopkins, que está na linha da frente da investigação científica em torno da Covid-19 nos Estados Unidos”, e que afirmou que os anti-vacinas contra a Covid-19 são os “condutores bêbedos de 2021”. Segundo este indivíduo, “se uma pessoa conduzir bêbeda dentro da própria propriedade, não quero saber. Mas se o fizer fora dela, já me diz respeito porque é ilegal e põe toda a gente em perigo. É o mesmo com quem não se quer vacinar. Pois, ó Dorry, só que não é. Por várias razões, das quais destaco uma, de tão óbvia. Ao contrário dos demais utentes da via, que podem não ter como se proteger de um condutor embriagado, quem receia cruzar-se na rua com alguém não vacinado tem uma forma muitíssimo eficaz de se proteger: tomar a vacina. Portanto, caro leitor, quando lhe perguntarem “Viste aquele reconhecido epidemiologista da Escola de Medicina John Hopkins na Web Summit?”, poderá responder, com toda a segurança: “Vi, vi, trata-se de um palerma. Ou isso, ou andou nos copos com o primeiro-ministro da Índia na COP26”.

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