Margaret Thatcher, num dos seus mais brilhantes aforismos, sintetizou o modo de actuação dos governos socialistas explicando que eles acabam sempre por esgotar o dinheiro dos outros (“They always run out of other people’s money”). O sábio aforismo de Thatcher aplica-se na perfeição à situação de Portugal, ainda que boa parte dos políticos portugueses pareça não estar consciente disso.

Essa falta de compreensão é particularmente grave porque o problema não vem apenas de 2011, nem sequer de 2000. Na verdade, nas últimas quatro décadas de democracia a insustentabilidade tem sido o padrão dominante no âmbito das finanças públicas. O gráfico seguinte, que agradeço a Jorge Costa, ilustra bem este ponto ao apresentar o saldo corrente, ou seja: a diferença entre despesas correntes e receitas correntes, do Estado português ao longo das últimas seis décadas.

grafico_jorge_costa

Em quatro décadas de democracia, o Estado português apresentou um saldo corrente negativo em 80% dos anos. Mais: a maior parte desses défices correntes foram em valores muito significativos em proporção do PIB. Ou seja, o regime tem vivido sistematicamente empurrando dívidas para as gerações futuras, dívidas essas que não têm qualquer contrapartida em activos já que não estão associadas a despesa de investimento.

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A prática de legar aos filhos e netos sucessivos défices correntes tem sido de tal forma transversal e reiterada que se pode considerar um dos pilares desta terceira república. De tal forma que, tragicamente, o único travão que se tem revelado eficaz é, precisamente, a falta de dinheiro. Só mesmo a secagem das fontes de financiamento obriga a alterar políticas e, mesmo assim, apenas o mínimo necessário para manter o modelo vigente. Não obstante a propaganda partidária e o ruído mediático, a verdade é que a coligação PSD-CDS que governou o país nos últimos quatro anos ficou aquém da troika e muito aquém do que o país precisava em termos de contenção da despesa pública e de reforma do Estado.

Como muito bem resumiu João César das Neves em artigo recente: “No Orçamento, depois de tanto esforço, atingiu-se apenas o limite máximo do intervalo permitido. Pior, a indiscutível redução do défice foi conseguida sobretudo à custa de medidas contingentes e temporárias, com poucas reformas na máquina. Preferiram-se cortes em salários e pensões, que na campanha todos os candidatos se propuseram eliminar. Por isso a tão falada consolidação orçamental está ainda muito longe. Por sua vez, o lado privado da situação financeira não é mais favorável. As empresas continuam descapitalizadas, os bancos permanecem frágeis e a taxa de poupança das famílias encontra-se no mínimo histórico. A conjuntura só é boa se comparada com a anterior.”

Apesar de ter ficado aquém da troika, é justo (e realista) reconhecer que o executivo liderado por Pedro Passos Coelho foi ainda assim além do que teriam feito quaisquer das alternativas governativas no contexto partidário português. E que só isso evitou um colapso do Estado português que estava iminente em 2011 e que o país seguisse a via da Grécia.

Quem em 2015 contribuir – seja por que forma for – para colocar Portugal a seguir essa via será co-responsável pelos resultados desastrosos que não é difícil antecipar. Ainda que nos próximos anos continue a não haver em Portugal uma reflexão crítica séria sobre o modelo vigente de Estado Social, importa que os responsáveis políticos reconheçam pelo menos que não há dinheiro para pagar mais socialismo do que o que já temos.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa