Começou tímida. Na icónica praça de Atenas, algumas pessoas aguardavam pelos primeiros resultados junto às televisões dos cafés. Chegaram as primeiras sondagens com uma vitória do ‘Não’. Alguns sorrisos, uma festa contida, mas nada de vitórias antecipadas. Menos de duas horas depois, a 600 metros, na praça Klafthmonos, um ecrã gigante passava a mensagem: o Não ia ganhar por mais de 61%. Gritos de alegria, lágrimas nos olhos, era a vitória contra a austeridade, assim acreditam os gregos.
Quando o ministro do Interior grego anunciou os primeiros resultados, com uma vitória inequívoca do Não (‘Oxi’ para os gregos), os festejos começaram a ganhar forma. Os gregos começaram a sair à rua num dia em que as ruas estiveram praticamente vazias. Carros e motas a buzinar, começaram a sair as primeiras bandeiras, tudo em direção à Sintagma.
Ainda demorou a ganhar forma e não chegou a números de outros dias, como na sexta-feira quando o Não mostrou a sua força na praça Sintagma e preencheu todos os acessos, sem espaço para respirar. Mas o dia era de festa, não de protestos. A mensagem, segundos os presentes, era o Não à austeridade, não aos credores, não aos últimos cinco anos de ‘troika’.
Centenas primeiro, depois milhares. Todas as ruas levavam à praça Sintagma e foi dai que veio a festa. Chega um primeiro grupo e a festa começa a crescer.
Atrás, uma bandeira portuguesa. Seria um português na festa? “Todos os portugueses vêm ter comigo. Já lhes disse que a bandeira é de um amigo que está por aí, não sei onde”, explica Stavros Stellas, de 60 anos, um membro da equipa que dá apoio à equipa parlamentar do Syriza.
Mais a sério, diz, não estava à espera de uma vitória tão grande. A mensagem para a Europa é que os governos “têm de lutar pelos seus povos”. Na Grécia, garante, não vão mudar o Syriza: “eles acreditavam que o Syriza ia mudar, mas nós não vamos mudar, acreditem em mim”.
E depois da vitória? Incerteza. Os bancos estão em mau estado, a economia está em recessão, mas a receita tem de mudar. Assim não pode continuar.
Mais à frente começaram a chegar os grupos organizados, alguns do Syriza. Entraram pela praça a dentro a gritar: “o povo grego não pode continuar a viver assim”.
Daí vieram os mais dinâmicos. Os jovens do movimento anticapitalista Antarsya, com tochas na mão e uma organização a fazer lembrar um exército de uma ex-república soviética, marcharam pelas ruas laterais da praça, até ao Parlamento, onde fizeram a festa, com algum choro à mistura. A emoção era muita.
“Neste dia, o povo grego não disse apenas não ao programa anterior, disse não a todos os memorandos, a todas as medidas que nos impuseram nos últimos cinco anos. O povo grego não pode continuar a viver assim”, explicou Nik, de 23 anos, quando lhe perguntamos o que cantavam os jovens do movimento Antarsya, do qual faz parte.
Bandeiras vermelhas em punho, cartazes grandes, encheram as ruas em vagas organizadas e cantaram gritos de guerra, perante muitos gregos e até alguns turistas que se juntaram à festa.
Pouco mais à frente, um grupo de jovens alemães empunhavam uma faixa com um grande ‘Oxi’: “Não à Alemanha, não à austeridade, nós estamos a celebrar a nossa vitória”, cantavam animados.
Vieram de várias partes da Alemanha e fazem parte do movimento Occupy, explicou uma das jovens, com apenas 22 anos e que veio de Leipzig. “Estamos aqui em solidariedade e contra a austeridade. É uma vitória de todos”, diz Katherine. E irão os líderes europeus ver essa vitória, perguntamos: “não sei, não sei… Acho que não”.
Depois de uma intensa campanha, fica a pergunta: e amanhã, como será? Estarão os gregos divididos? Até nas respostas parecem estar, mesmo dentro dos vitoriosos.
“Divididos? Nem pensar. Amanhã o povo grego vai estar mais fortes e mais unido”, diz Vassilis, que nos explica com a ajuda da filha que para si, a austeridade já estava morta.
Antes Vassilis mostrava a sua bandeira de apoio a Tsipras, onde se lê “uma outra Europa com Tsipras”, acompanhado da mulher e da filha, para um direto da RTP que estava no local.
“Já estávamos divididos. Mas no Sim estão as grandes empresas, os canais de televisão, os banqueiros e todos aqueles que têm medo da [chanceler alemã, Angela] Merkel”, diz Eleni
Ao seu lado, o seu ex-marido, resume o sentimento de muitos dos gregos com quem falámos. “Não queremos fazer nenhuma revolução com este não, só queremos as nossas vidas de volta”, defende Vaggelis.
Do que vem a seguir, tem medo. Sabe que a situação é complicada, mas hoje é de festa. É assim que vão continuar a fazer os dois, felizes com o reencontro nas celebrações.
Com quase todos os votos contados, a vitória do Não continuava com mais de 61% dos votos. Agora, Tsipras vai a Bruxelas tentar negociar com os credores um acordo melhor.
Tsipras diz que a Democracia não pode ser chantageada, Merkel e Hollande que terão de respeitar o voto grego. Já o presidente do Eurogrupo, o holandês Jeroen Dijsselbloem, considera o resultado “muito lamentável” e que sem reformas e medidas difíceis, a economia grega não vai recuperar.
Para já, as reações não antecipam grande abertura. Esta segunda-feira Angela Merkel vai a Paris debater a situação da Grécia com François Hollande. Na terça-feira mais uma reunião extraordinária do Eurogrupo para preparar mais uma cimeira extraordinária de líderes da zona euro sobre a Grécia exclusivamente.
Os gregos falaram. Mas será que a Europa ouviu?