O PS vai votar contra Orçamentos de Estado da AD e está também determinado em não entrar sequer em negociações ou quaisquer acordos nesse sentido, ainda que não esteja excluído que possa alinhar com algumas medidas na discussão na especialidade. Mas mesmo nessa fase, a intenção socialista é que a avaliação de medidas pontuais seja sempre unilateral.

“Um acordo global está completamente fora de questão“, afirma fonte socialista quando confrontada com futuros processos orçamentais. “Votaremos contra na generalidade ou final global”, acrescenta outra fonte. É um novo “não é não”, agora do PS e em relação a um instrumento de política que precisa de maioria para passar no Parlamento — que a direita sem o Chega não tem na futura configuração parlamentar. Sem os votos da emigração contados, PSD, CDS e IL somam 85 deputados, contra os 90 eleitos pelo PS, BE, PCP e Livre. E o PS coloca-se de fora da solução.

A única abertura que vai sendo registada no Largo do Rato é para medidas pontuais — recorde-se que no primeiro Orçamento da geringonça o PSD (ainda com Passos Coelho) demitiu-se deste papel, recusando-se a apresentar sequer propostas de alteração. “Votaremos melhor o que acharmos importante na especialidade“, diz fonte do partido que rejeita, no entanto, a disponibilidade para negociar com a AD. O que neste momento está em cima da mesa é apenas disposição para “avaliar unilateralmente a conformidade de medidas especialmente relevantes” com o programa do PS.

Uma das medidas que pode vir a constar de futuros processos orçamentais — seja um retificativo do que está atualmente em vigor seja num futuro Orçamento — é a reposição integral do tempo congelado nas carreiras dos professores. O PS de Pedro Nuno Santos, na campanha, propôs a regularização da situação reivindicada pelo setor de forma faseada e no tempo de uma legislatura. No caso da AD, o faseamento proposto é de mais um ano. São casos como este que podem levar o PS à tal “avaliação unilateral”.

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No topo do partido a visão sobre os orçamentos é, nesta fase, clara “Enformam a atuação dos executivos”, aponta fonte socialista que considera que isso significa que o PS não poderá votar a favor de orçamentos da AD. Tem de ficar claro, argumenta-se, que “a alternativa ao PS é o PSD e a alternativa ao PSD é o PS”.

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“Os orçamentos são instrumentos de política, têm subjacente opções. Normalmente são antagónicas. Não tem a ver com uma ou outra medida, mas com o sentido. Não vale a pena expetativas sobre o PS, porque não é natural que seja o PS a viabilizar orçamentos. Tal como o PSD também não tem por hábito viabilizar orçamentos do PS”, acrescenta outra fonte no mesmo sentido do voto contra as proposta de OE que vierem de um Governo de Montenegro.

Pressões que vêm de dentro

Esta terça-feira, numa entrevista à Rádio Renascença, o socialista Augusto Santos Silva disse que “há matérias que, pela sua importância, aconselham a que haja diálogo, cedência mútua, negociação e compromisso entre os dois partidos, ou entre o Governo e a oposição”. O socialista que ainda aguarda para saber se foi eleito deputado (foi cabeça de lista pelo círculo Fora da Europa) defende ainda que o PS “deve contribuir para a estabilidade. Os resultados são conhecidos, portanto, é hora de construir e não de estar a imaginar já a próxima catástrofe“, acrescentou.

Uma posição próxima daquela que o antigo líder do partido, Eduardo Ferro Rodrigues, expôs na entrevista que deu à TSF logo no dia a seguir às eleições. Ferro disse que “não é bom para democracia” novas eleições no curto prazo, defende que o Presidente da República deve indigitar o líder do PSD primeiro-ministro que também que “é preciso dar tempo a Luís Montenegro para conduzir o Governo e também a Pedro Nuno Santos para reconstruir à esquerda uma plataforma suficientemente forte que possa ganhar as eleições e combater a extrema direita. E isso não se faz em poucos meses”, rematou.

E esta terça-feira, Fernando Medina rejeitou a ideia de um Bloco Central, mas também acrescentou que “isso não quer dizer que os partidos não conversem, não discutam não procurem convergências em múltiplos temas e assuntos”. O que considera o ainda ministro das Finanças é que “isso não se deve traduzir em apoios de governabilidade porque isso a médio prazo seria mais um factor de perturbação para o nosso sistema do que uma solução”. Por seu lado, o ainda primeiro-ministro, António Costa, defendeu que “as legislaturas se devem cumprir” e que a estabilidade tem sido importante para Portugal, esperando que que a instabilidade “não passe a ser o novo padrão”.

A aposta inicial de Pedro Nuno Santos parece ser, no entanto, no desgaste rápido da situação política atual. Ainda na declaração de derrota, no domingo passado, o líder do PS tentou alinhar os socialista num sentido: “Não é a nós que têm de pedir para suportar um Governo. Sabemos que essa pressão virá, camaradas, mas vamos aguentar firmes”, disse garantindo um “partido unido”, “forte” e “coeso”. Isto ao mesmo tempo que deixava um desafio de muito curto prazo à AD e não só: “Vamos ver o que vai acontecer nos próximos meses e como a direita vai organizar a governação em Portugal.”

Para rejeitar ser suporte ao Governo da AD que se seguirá, Pedro Nuno Santos usou a mesma fórmula que utilizou, ainda em janeiro, para dizer que não se via a viabilizar um governo minoritário de Montenegro — e que foi sol de pouca dura, já que entretanto vai viabilizar o tal governo. “É praticamente impossível, para não dizer impossível: a direita e a AD que não conte connosco para governar. Não somos nós que vamos suportar um Governo da AD”. E ainda avisou: “E não vai haver divisão no PS”.

Uma prevenção para eventuais votos desalinhados no futuro que possam desencalhar qualquer orçamento — recorde-se que o princípio no PS é a liberdade de voto dos seus deputados, exceto em “matérias que relevam para a governabilidade, designadamente o programa de Governo, o Orçamento de Estado, as Moções de Confiança e de Censura e os compromissos assumidos no programa eleitoral ou constantes de orientação expressa da Comissão Política Nacional, veiculada em deliberação aprovada com tal efeito”.

Repensar pacto na Justiça?

Há outros temas que a campanha trouxe para cima da mesa de eventuais negociações ao centro que a atual configuração parlamentar podem desmotivar, como é o caso do pacto para a Justiça. Na entrevista desta terça-feira, Santos Silva colocou esta área como um exemplo de “matéria de diálogo” e o próprio líder disse, em entrevista ao Observador a dois dias das eleições, que era uma das suas prioridades caso saísse vencedor: “Se nós ganharmos as eleições, com certeza que faremos isso. Eu sempre tive, ao longo da minha vida política, a capacidade para negociar, para conseguir acordos, e continuarei a conseguir isso, tendo a oportunidade para o fazer. E é isso que espero.”

Legislativas. A última chamada dos candidatos antes de o dia acabar

Agora, na direção do partido, há quem aponte a falta de ambiente para mexer nesse ponto, tendo em conta o desenho parlamentar que se segue. “O contexto não é o melhor para isso”, considera fonte socialista ao Observador.

As contas fazem-se quando os resultados ainda não estão fechados, no entanto os socialistas estão desde a noite de domingo convencidos que dificilmente conseguirão um brilharete como o de 2024, quando conquistaram três dos quatro mandatos para a Assembleia da República dos círculos da emigração.

Se isso se repetisse desta vez — o que é tido como pouco provável no partido — o PS poderia chegar aos 80 deputados. Quanto à AD, que tem atualmente 79, ou ficaria com um (e empatada em deputados com o PS) ou mesmo nenhum. Mas as contas socialistas neste momento apenas dão como certa a conquista de um dos quatro mandatos, pelo círculo da Europa, não dando por garantida a eleição de Santos Silva no círculo Fora da Europa — aqui a expectativa é de possível crescimento do Chega e, possivelmente, a conquista de mais um mandato por aqui pelo partido de André Ventura.

Os socialistas estão concentrados da ideia de serem oposição e, mesmo que se verificasse um empate em mandatos com a AD ou mesmo a sua ultrapassagem, o critério tomado é o número de votos obtidos. O próprio líder disse na noite de domingo que “até pode haver uma surpresa no Parlamento”, mas o PS ter “mais votos é muito difícil”.