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Luís Filipe Vieira está acusado de três crimes de fraude fiscal e 19 crimes de falsificação de documentos
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Luís Filipe Vieira está acusado de três crimes de fraude fiscal e 19 crimes de falsificação de documentos

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Luís Filipe Vieira está acusado de três crimes de fraude fiscal e 19 crimes de falsificação de documentos

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Vieira acusado de criar esquema de faturação falsa para gerar 1,4 milhões de euros em dinheiro vivo

Ex-líder do Benfica acusado de criar esquema de faturação falsa que prejudicou Estado em 488 mil euros. Tudo para gerar 1,4 milhões de euros em numerário. Para quê? Não se sabe.

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A definição de saco azul — ou de contabilidade paralela ou caixa b — está intimamente ligada à corrupção mas também à fraude fiscal. O objetivo tanto pode ser angariar fundos para executar a corrupção, como pode ser apenas pagar salários ou prémios por ‘baixo da mesa’. As duas situações terão acontecido em paralelo no chamado caso do saco azul do Grupo Espírito Santo.

No caso do alegado saco azul do Benfica, que levou à acusação do ex-líder Luís Filipe Vieira, do atual administrador Domingos Soares Oliveira, do ex-diretor financeiro Miguel Moreira e da Benfica SAD e da Benfica Estádio por três crimes de fraude fiscal e 19 crimes de falsificação de documentos, o Ministério Público ficou a meio caminho.

Benfica e Luís Filipe Vieira acusados de três crimes de fraude fiscal qualificada e 19 crimes de falsificação de documento

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Pelo menos, do despacho de acusação do caso do saco azul nada consta, nomeadamente as suspeitas contra o ex-árbitro Bruno Paixão — que trabalhou para a empresa Questão Flexível e para o seu líder José Bernardes, igualmente acusados pelo MP em regime de co-autoria por fraude fiscal e falsificação de documento. As suspeitas contra Paixão estarão a ser analisadas nos diversos inquéritos de corrupção que visam a gestão de Vieira no Benfica.

O esquema de alegada faturação falsa criado no verão de 2016

Num despacho de acusação subscrito pelo procurador Hélder Branco dos Santos, da 8.ª Secção de Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, a narrativa penal está concentrada num alegado esquema de faturação falsa alegadamente criado por Luís Filipe Vieira que terá servido para retirar cerca de 2,2 milhões de euros de fundos das contas bancárias das sociedades Benfica SAD e da Benfica Estádio entre 2016 e 2017.

Para quê? Para que tais fundos regressassem “à posse” daquelas duas sociedades do Grupo Benfica “sob a forma de numerário”. E com que objetivo? O procurador do DIAP de Lisboa não explica. Apenas concretiza que “no verão de 2016”, o arguido Luís Filipe Vieira terá partilhado tal “plano” com Miguel Moreira, ex-assessor de Vieira e diretor financeiro do Grupo Benfica entre dezembro de 2009 e 2021.

Luís Filipe Vieira é acusado de ter criado um alegado esquema de faturação falsa que terá servido para retirar cerca de 2,2 milhões de euros de fundos das contas bancárias das sociedades Benfica SAD e da Benfica Estádio entre 2016 e 2017. Para quê? Para que tais fundos regressassem "à posse" daquelas duas sociedades do Grupo Benfica "sob a forma de numerário".

Terá sido Miguel Moreira que encontrou o alegado cúmplice certo: o seu amigo José Bernardes, gerente da empresa Questão Flexível, que, por sua, vez trará para o alegado esquema outros personagens importantes chamados Paulo da Silva e José Raposo.

Concentremo-nos, para, já no Grupo Benfica e na Questão Flexível e no alegado esquema de faturação falsa. Como foi implementado, segundo os indícios que o DIAP de Lisboa descreve na acusação?

Aproveitando uma autêntica revolução tecnológica na bilhética e noutros serviços que o Grupo Benfica estava a levar a cabo com multinacionais como a Microsoft ou McKinsey, Luís Filipe Vieira e Miguel Moreira assinaram contratos de prestação de serviços com a Questão Flexível para esta empresa prestar consultoria e assistência informática.

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Problema? A Questão Flexível apenas tinha como funcionários os seus sócios José Bernardes e a sua mulher. Isto é, “não dispunha de qualquer estrutura de pessoas e bens que pudesse afetar ao exercício da atividade económica de consultadoria e assistência informática, nem há registo de qualquer subcontratação de serviços”, lê-se no despacho de acusação.

Daí que o DIAP de Lisboa considera que “os serviços de consultoria e assistência informática que constavam” dos “quatro contratos assinados” entre a Benfica SAD e a Benfica Estádio, então lideradas por Luís Filipe Vieira, e a Questão Flexível eram fictícios. Ou seja, não foram prestados de todo em todo. Foram simulados.

Foram empresas como a Microsoft e a McKinsey que prestaram tais serviços.

Domingos Soares Oliveira é atualmente co-CEO da Comissão Executiva da Benfica SAD. Foi acusado da co-autoria de três crimes de fraude fiscal qualificada e 19 crimes de falsificação de documento

Filipe Amorim / Global Imagens

“106 notas de 500€, 1052 notas de 200€, 17 notas de 100€ e duas notas de 50€ e 10€”

A remuneração de José Bernardes era, segundo o DIAP de Lisboa, de 11% sobre o valor líquido (ou seja, após os impostos pagos) de cada fatura emitida. Logo, os 89% remanescentes deveriam corresponder ao valor que regressava em numerário à posse das sociedades do Benfica.

Contudo, ainda era preciso mais uma pessoa para poder emitir faturas à Questão Flexível, de forma a que fosse possível chegar ao numerário. É aqui que entra Paulo da Silva, amigo de José Bernardes, que angaria José Raposo e a sua sociedade Capinvest. A compensação? Cerca de 1,5% por cada fatura emitida.

Como é que o esquema funcionava? Da seguinte forma e tomando uma das diversas situações concretas descritas na acusação:

  • A Questão Flexível emitiu uma fatura a 28 de abril de 2017 no valor total de 272.520 euros (224 mil euros de serviços + 51.520 euros em IVA) em nome da Benfica SAD;
  • A fatura foi paga a 3 de maio de 2017 pela Benfica SAD, sendo o montante sido transferido para uma conta no Eurobic da Questão Flexível;
  • Dois dias depois, José Bernardes emitiu um cheque em nome de José Raposo no valor de 265.160 euros;
Bernardes costumava perguntar à sua gestora de conta no Eurobic se era possível que o seu "fornecedor" [José Raposo] descontasse um cheque no dia seguinte em numerário. Às vezes, Bernardes indicava mesmo que tipo de notas queria. A saber: "106 notas de 500 Euros [53 mil euros], 1052 notas de 200 Euros [210.400 euros], 17 notas de 100 Euros [1.700 euros], uma nota de 50 Euros e uma nota de 10 Euros".
  • Antes de emitir o cheque, Bernardes costumava perguntar à sua gestora de conta no Eurobic se era possível que o seu “fornecedor” [José Raposo] descontasse o referido cheque no dia seguinte. Às vezes, como aconteceu às 00h46 do dia 4 de maio de 2017,  Bernardes indicava mesmo que tipo de notas queria. A saber: “106 notas de 500 Euros [53 mil euros], 1052 notas de 200 Euros [210.400 euros], 17 notas de 100 Euros [1.700 euros], uma nota de 50 Euros e uma nota de 10 Euros”. No total, claro, de 265.160 euros.
  • Cumprindo as regras de prevenção de branqueamento de capitais, José Bernardes enviava logo à sua gerente de conta no Eurobic a fatura que a Capinvest de José Raposo tinha emitido em nome da Questão Flexível. Tudo para justificar o levantamento do numerário, o que aconteceu a 5 de maio de 2017.

A forma como era gerado o numerário — e o alerta do Eurobic que parou o esquema

Este modus operandi repetiu-se em mais 18 ocasiões no Eurobic, sendo que José Bernardes ia alternando as justificações que são obrigatórias serem dadas aos bancos.

No âmbito da política “Know Your Costumer” (“Conhece o teu cliente”), obrigatório no regime jurídico de prevenção e combate ao branqueamento de capitais, os bancos têm de solicitar aos seus clientes os contratos e as faturas que justificam levantamentos em numerário ou até mesmo a realização de certas transferências ou a simples abertura de uma conta bancária

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Bernardes tanto podia apresentar faturas alegadamente falsas (por não corresponderem a um serviço efetivamente prestado, na óptica do MP) da Capinvest de Raposo relacionadas com actividades em Dakar (capital do Senegal), como podia invocar o pagamento de alegados serviços em Angola.

Os levantamentos em numerário, esses, iam variando: tanto podiam ser de cerca de 148 mil euros (divididos por 47 notas de 500€; 615 notas de 200€; 12 notas de 100€ e 20 notas de 50€), como podiam ser de valores inferiores a 100 mil euros. O máximo levantado em dinheiro atingiu o valor de 292.500 euros numa só operação.

No âmbito da política "Know Your Costumer" ("Conhece o teu cliente"), obrigatório no regime jurídico de prevenção e combate ao branqueamento de capitais, os bancos têm de solicitar aos seus clientes os contratos e as faturas que justificam levantamentos em numerário ou até mesmo a realização de certas transferências ou a simples abertura de uma conta bancária.

Este alegado esquema teve um obstáculo sério quando o Eurobic se recusou a descontar mais cheques no dia 3 de agosto de 2017. Estava em causa um valor de 250 mil euros em numerário que José Bernardes queria que fossem levantados da seguinte forma: “1140 notas de 200€ (228 mil euros) e 220 notas de 200€ (22 mil euros)”.

Contudo, e apesar de Bernardes voltar a mostrar uma fatura da Capinvest sobre novos serviços informáticos que teriam sido prestados em Dakar, desta vez o Eurobic exerceu o seu direito de abstenção e não executou a operação solicitada pelo seu cliente. E fez mais: alertou a Unidade de Informação Financeira da Polícia Judiciária por suspeitas de branqueamento de capitais, como manda a lei.

Contudo, e apesar de Bernardes voltar a mostrar uma fatura da Capinvest sobre novos serviços informáticos que teriam sido prestados em Dakar, desta vez o Eurobic exerceu o seu direito de abstenção e não executou a operação solicitada pelo seu cliente. E fez mais: alertou a Unidade de Informação Financeira da Polícia Judiciária por suspeitas de branqueamento de capitais, como manda a lei.

O que fez com que os arguidos mudassem de banco. O Millenium BCP foi o escolhido, tendo a Benfica Estádio transferido cerca de 369 mil euros para pagar nove faturas da Questão Flexível. Desse montante, terão sido levantados em numerário cerca de 357.820 euros.

Os valores totais deste esquema de circulação de fundos foi o seguinte:

  • Entre 27 de dezembro de 2016 e 20 de dezembro de 2017, passou entre as contas bancárias da Benfica SAD e da Benfica Estádio e as contas da Questão Flexível, com a alegada autorização de Miguel Moreira, um valor total de cerca de 2,2 milhões de euros divididos por 19 operações bancárias.
  • Desse montante total, fora levantados em numerário cerca de 1,4 milhões de euros. É esse valor que o DIAP de Lisboa apurou que retornou às sociedades arguidas Benfica SAD e Benfica SAD em ‘dinheiro vivo’.

Como o Estado foi prejudicado? Em IVA e IRC

Como o procurador Hélder Branco dos Santos entende que os contratos assinados entre o Grupo Benfica e as Questões Flexíveis são simulados e não correspondem a serviços efetivamente prestados, daí até à imputação por fraude fiscal qualificada é um pequeno salto.

Tudo porque se as faturas são falsas, as mesmas não podem ser usadas, como foram, pela Benfica SAD e pela Benfica Estádio em sede de dedução de IVA e de IRC.

Ou seja, houve “defraudação das declarações de imposto”. Por um lado, “para anular, pela dedução, os valores de IVA” que as duas sociedades pagaram. E, por outro lado, “para recuperar, pela dedução de custos em IRC, a compensação paga ao emitente das faturas”.

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Numa palavra, a Benfica SAD e a Benfica Estádio fizeram “deduções indevidas” por “operações simuladas”.

Assim, as duas sociedades do Grupo Benfica prejudicaram o Estado nos seguintes montantes pelas 19 faturas emitidas em seu nome pela Questão Flexível:

  • Um valor total 423.660 euros em sede de IVA;
  • E cerca de 64.768 euros em sede de IRC.
  • Total: 488.428 euros.

É este o valor que o DIAP de Lisboa considera que constitui uma “vantagem patrimonial ilegítima” do Grupo Benfica.

A Benfica SAD e a Benfica Estádio são acusadas de ter feito alegadas "deduções indevidas" por "operações simuladas" através de 19 faturas. Assim, terão prejudicado o Estado em sede de IVA e de IRC num total de cerca de 488 mil euros. É este o valor que o DIAP de Lisboa considera que constitui uma "vantagem patrimonial ilegítima" do Grupo Benfica. 

Benfica, Vieira e Soares Oliveira podem vir a ter de pagar indemnização ao Estado

Como é hábito nas acusações deduzidas por crimes de fraude fiscal — e nos casos de branqueamento de capitais, crime este que não foi imputado às sociedades do Benfica nem aos ex-dirigentes do Benfica, mas sim apenas a José Bernardes —, o Ministério Público deduziu desde logo um pedido de indemnização civil aos arguidos pelos alegados prejuízos provocados ao Estado.

O pedido de indemnização civil é no valor total do enriquecimento ilegítimo que é imputado a todos os arguidos, sendo que no caso das duas sociedades do Benfica atinge os já referidos 488.428 euros.

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O procurador Hélder Branco dos Santos entende também que, em caso de condenação transitada em julgado, Luís Filipe Vieira, Domingos Soares Oliveira, Miguel Moreira e José Bernardes devem ser condenados a pagar os prejuízos ao Estado de forma solidária com as sociedades envolvidas.

E porquê? “Porque todos concorreram para a produção do dano”, segundo se lê no despacho de acusação.

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