As últimas semanas foram de sonho para a reputada reputação dos reputadíssimos deputados portugueses. Depois das presenças-fantasma no Parlamento, foi agora a vez do deputado Feliciano Barreiras Duarte ter votado o Orçamento do Estado sem estar sequer presente na Assembleia da República. Que saudades dos tempos em que podíamos indignar-nos com o facto dos deputados passarem o dia todo no Parlamento sem fazer nada.

Quem votou o Orçamento do Estado por Feliciano Barreiras Duarte foi a deputada Mercês Borges. Disse a deputada que pode “ter carregado no botão” e admitiu que já carregou “muitas vezes por vários outros colegas”. Para quem acha que o Parlamento está cheio apenas de doutores que falsificam currículos, aqui fica a prova que também há representantes de profissões humildes: por exemplo, a deputada Mercês Borges é ascensorista, como se comprova pela solicitude com que carrega em botões pelos outros.

A irregularidade desta situação foi comprovada com recurso às imagens do Canal Parlamento. Foi uma espécie de VAR do futebol aplicado à política. A grande diferença é que aqui, ao contrário do que sucede no desporto-rei, mesmo quando as imagens não deixam margem para dúvidas não há hipótese de mandar ninguém para a rua. E concedo que neste caso seria complicado mandar para a rua o deputado que já se encontrava na rua.

Foi um facto inédito um deputado votar o Orçamento do Estado estando desaparecido do hemiciclo. O que, na verdade, me leva a questionar se Feliciano Barreiras Duarte terá sido mesmo eleito pelo círculo eleitoral de Leiria, ou se foi eleito pelo triângulo eleitoral das Bermudas.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Ao pé disto, o episódio da deputada Isabel Moreira a pintar as unhas durante uma sessão na Assembleia da República passa quase por demonstração de competência. É sem dúvida menos gravíssimo ir para o Parlamento arranjar as mãos do que votar no Orçamento sem lá pôr os pés. Além de que a deputada revelou grande aprumo no tratamento das cutículas.

Felizmente, para compensar, outros altos representantes da nação têm estado a grande nível. Foi o caso do primeiro-ministro António Costa, que esteve muito bem na recepção ao Presidente chinês. Eu pelo menos achei muito interessante ver o encontro entre o líder de um governo que está na mão de comunistas e o Presidente da China.

Quem se recusou a participar nas cerimónias com o Presidente chinês foi Catarina Martins. Não surpreende. O Bloco de Esquerda não aprecia o modelo chinês de “Um País, Dois Sistemas”. O Bloco olhou para uma solução com comunismo e capitalismo, e olhou para a história do século XX; olhou outra vez para o comunismo e o capitalismo, e voltou a olhar para a história do século XX; fitou de novo o comunismo e o capitalismo, e contemplou outra vez a história do século XX. E pensou: nã, esta parte do capitalismo é para ir para o lixo. Aposto que no Natal a única coisa que vão comer do bolo-rei é a fruta cristalizada.

Tiago Dores é humorista e co-criador do Gato Fedorento