Em política, há que dialogar, argumentar e tentar chegar a compromissos razoáveis, qualquer que seja o poder, maior ou menor, que uma das parte tenha. Mas há um momento em que, quando se tem convicções e se está seguro de que se tem razão, é preciso ser firme e colocar todo o peso político nessa firmeza. Ilustro com três casos muito distintos.

1 Nas últimas semanas Volodymyr Zelensky insistiu na necessidade de a Ucrânia receber os tanques alemães de última geração, que vários países possuem, mas que só poderiam ser entregues com o aval da Alemanha. Após alguma hesitação da Alemanha e provavelmente devido à pressão dos EUA e dos aliados ocidentais da NATO, a Alemanha acabou por concordar. Após os tanques, veio o pedido do fornecimento dos caças F-16, que vários países detêm, incluindo Portugal, mas que só poderão ser fornecidos a países terceiros com acordo do EUA. A Polónia prontificou-se a esclarecer que estaria disposta a ceder, desde que a NATO concordasse. Macron, foi um pouco ambíguo sobre a questão, pois disse que dependeria das condições, uma delas a de que não seria atacado solo russo. Os holandeses mostraram-se disponíveis para discutir o assunto com abertura (open mind). Como de costume a pobre União Europeia, não parece ter opinião sobre o assunto. Até agora, só o simples “Não”, dado pelo Presidente Biden à possibilidade de envio dos F-16 (apesar de pressionado fortemente pela Lockeed Martin, construtora dos F-16, e do lóbi de defesa), e o não de Olaf Scholz ao fornecimento de aviões de combate, mantém alguma razoabilidade em relação a este perigo do escalar da guerra.

Por mais bélica que seja a atitude da NATO face à invasão da Ucrânica – e é efetivamente – há algo que todos conseguem perceber facilmente. Uma eventual cedência de caças significaria um escalar da guerra para outro patamar, e um envolvimento mais direto dos países da NATO, que levaria a um confronto direto entre esta e a Rússia, quiçá ao início de uma terceira guerra mundial. Uma coisa são sanções económicas, treino militar, material de guerra terrestre, nomeadamente sistemas de defesa antiaérea, serviços de informação e espionagem (hoje eufemisticamente designados de “inteligência”). Outra, muito diferente, é uma guerra nos céus da Ucrânia, que obviamente não ficaria por aí. Os EUA têm poder de veto sobre o fornecimento dos F-16 à Ucrânia por parte de qualquer país. Serão capazes de ser firmes até ao fim e livrar-nos de uma guerra em larga escala?

2 Margaret Thatcher foi conhecida como a dama de ferro, basicamente porque tinha convicções e as defendia de forma teimosa e com muita firmeza. Por si só, a firmeza não é uma virtude em política. Ela tem de vir acompanhada de bons argumentos que justifiquem a razão das políticas e de uma aparente inflexibilidade. Infelizmente, para ela, foi mal aconselhada economicamente e teimou numa coisa em que não havia argumentos de defesa – a “poll tax” – algo que ditou a sua queda. Defender como razoável que todos os residentes, independentemente da sua capacidade económica, paguem o mesmo montante de imposto para financiar o respetivo município, é algo que muito poucos economistas subscrevem. A firmeza, neste caso não foi apoiada por bons argumentos e o desenlace foi o esperado.

3 António Costa, está de momento a braços com a contestação mais visível que é a dos professores. No passado artigo argumentei que há coisas em que os professores têm razão e há coisas em que não têm. A estratégia sindical, já se percebeu, é que tudo seja englobado no mesmo pacote, e que ou há acordo sobre tudo ou não há sobre nada. Isto é o oposto do que se pode chamar um compromisso quando falamos em negociação. Dentro do tudo, está algo que não deve nem pode ser reaberto, a contagem do tempo de serviço. Repita-se pela n-ésima vez para que seja claro. O “roubo” do tempo de serviço, efetivado nos professores do básico e secundário desde o eclodir da crise financeira, foi comum à generalidade das carreiras gerais e especiais da administração pública. É algo que não é específico destes professores. Manda a justiça e a equidade que havendo condições económicas e financeiras do país para remunerar melhor os professores do básico e secundário, que sem dúvida o merecem, o mesmo deverá ser feito para os outros trabalhadores em funções públicas.

Estamos ainda em tempo de negociação. António Costa afirmou que João Costa negoceia em nome de todo o governo. Assim será. Mas a única forma de, no momento certo e com o balanço da negociação, se pôr fim a esta contestação social é António Costa vir a terreno com o seu maior peso político. Tem de ser claro na argumentação sobre aquilo que o governo aceitou, e deu razão aos professores, e claro e firme naquilo que não aceitou nem aceitará. Só assim se evitará que estas greves perdurem e inflijam danos maiores aos jovens de famílias mais vulneráveis e levem os pais de famílias mais desafogadas a saírem da escola pública, paradoxalmente, penalizando a sua qualidade.

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