Os incêndios de 2017. Os roubos e as aparições de Tancos. As golas contra o fumo que sufocavam os utilizadores. O fulgurante e pornográfico nepotismo nos cargos de decisão. O candidato a primeiro-ministro que esteve a centímetros de esmurrar um velho. O ucraniano torturado até à morte por funcionários públicos. A subvenção e a tomada dos “media”. O “sorteio” e os palpites do juiz Ivo Rosa. O currículo falsificado do procurador europeu. O “investimento” na TAP. Os “investimentos” na banca. As dívidas públicas e privadas que não são para pagar mas para gerir. O estado policial a pretexto da Covid. As falências. Os mortos por incúria do melhor SNS do mundo. A invasão armada do Zmar e a brutal detenção de imigrantes. O retorno da censura oficial. O ministro que tenta intimidar um empresário estrangeiro por questionar as escolhas desse exacto ministro. O riso permanente do dr. Costa, que nenhuma máscara esconde.

Em que nação tais peripécias, uma amostra mínima de cinco anos e meio de regabofe, não fariam cair o governo? Em muitos, do Burkina Faso à Nicarágua. No Ocidente, que ainda nos acolhe por lapso e imposição geográfica, a exigência costuma ser um bocadinho maior. Para felicidade do PS, por cá a exigência é nula. Talvez pelo contrário: por cá exige-se que o poder seja corrupto, prepotente e incapaz. Quanto pior, melhor para o PS, que sobe nas sondagens à medida que o país desce em todos os critérios económicos, sociais e, desconfio, psiquiátricos. Há dias, o PS roçava os 40% nas sondagens. De propósito, deixei de fora do rol de desgraças acima a semana vigente, que estabeleceu novos recordes nas modalidades do descaramento, despotismo e desnorte. A esta hora, é plausível que o PS tenha alcançado a maioria absoluta.

A semana começou com um programa da RTP destinado a louvar a referida lei da censura. Uma apresentadora de variedades garantiu aos – escassos – espectadores que a lei é fantástica porque permite punir e evitar a “desinformação”. Se a lei fosse levada à letra, os senhores que nos pastoreiam não voltavam a abrir a boca. Por azar, o objectivo é o oposto: condicionar opiniões divergentes da propaganda oficial, da qual o programa em questão é excelente exemplo. Para tirar dúvidas, a apresentadora de variedades perguntou ao criador da lei, o simpático leninista José Magalhães, se se pode falar em censura. Não se pode, esclareceu sem contraditório o deputado, que satisfez a apresentadora de variedades a ponto de ela se deitar no seu colinho. Poucos minutos decorridos, a senhora, que pelos vistos tem um padrão, já pousava a cabeça no colinho do prof. Marcelo, após breve entrevista em que ambos aplaudiram o combate às “fake news”. A piada estava feita. Já espreitei pedaços das televisões venezuelanas e norte-coreanas: essencialmente, não se distinguem disto.

A semana prosseguiu com a revelação, no Porto Canal, das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril. Ao que consta, são necessários três anos de preparativos e dois e meio para lavar a louça e aspirar o chão. A liderar a vital empreitada, arranjou-se o dr. Adão e Silva (é apenas um sujeito), vulto com carreira no comentário dependente de ordens superiores. Se a ideia era enxovalhar o golpe de Estado, missão cumprida. Por falar em missão, haverá uma “estrutura” adequada à dita, com resmas de assessores e motorista. Graças ao seu desprendido entusiasmo por “Abril”, o comissário Adão aceitou a encomenda a troco de simbólicos 300 mil euros. Perante os resmungos de alguns fascistas, que pagam a folia mediante impostos, democratas sortidos indignaram-se com razão. Naturalmente, o prof. Marcelo aprova.

A semana acabou com o “caso” Medina, ou a entrega, pela câmara lisboeta, dos nomes e moradas de críticos de Putin à embaixada russa. Alguns dos denunciados, cujas vidas entraram em saldo, têm nacionalidade portuguesa. Uma, em Janeiro, contou o crime a “jornalistas”, que o ocultaram com zelo. Até que enfim a capital é mencionada no estrangeiro sem ser pelos “rankings” fajutos dos destinos turísticos. O indescritível sr. Medina, e os indescritíveis defensores do sr. Medina, que evidentemente incluem o prof. Marcelo, torcem-se em justificações: o procedimento é normal; tratou-se de um erro lamentável; não há problema nenhum; os russos juraram ter apagado os e-mails; a embaixada da Rússia não representa Moscovo; não se pode fazer “aproveitamento político”; etc. Dizem uns que não há memória disto acontecer em lugares civilizados, mas é porque sofrem de amnésia: o envio de informação confidencial ao KGB já fora inaugurado pelo PCP com os arquivos da PIDE. E considerarmo-nos um lugar civilizado é manifesto exagero.

Já não temos o que quer que achávamos que tínhamos. Sem surpresas nem sobressaltos, voltámos às “Conversas em Família”, a um presidente decorativo, às celebrações masturbatórias de quem manda, ao culto das denúncias, à proliferação de prostitutos e prostitutas, à radical impunidade de uns poucos à custa dos restantes. Ao sufoco sem alívio. O mofo regressou, em versão maçónica, brejeira e analfabeta. A falta de oposição, factual, não explica tudo. Um estudo fresquinho sugere que dois terços dos portugueses não desgostam de ditaduras. Parece-me um dado optimista. Fora uns excêntricos e umas excitações provisórias, o português médio prefere rédea curta e cabeça baixa a alternativas “modernas” e “libertinas”. O salazarismo durou 48 anos. A democracia, pobrezinha, não chegou a tanto. Houvesse aqui vestígios de dignidade e o PS, mais respectivas metástases, não estaria no poder. Boa parte estaria na cadeia. Em vez disso, essa sinistra gente vai organizar em 2024 a festa deles, e o velório do que havia em redor. Os meus pêsames.

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