Ontem, Portugal teve o pior dia de infecções desde 10 de Abril. Em Abril, estávamos fechados em casa. Agora, pedem-nos para irmos à escola, embora de máscara. Que vão fazer se o número de infecções continuar a subir? Não sabemos, mas podemos desconfiar de uma coisa: não vão fazer como em Março, quando fecharam tudo. Que mudou desde então? Dizem-nos que, apesar da escalada da epidemia, há menos mortos, que os infectados são agora gente resiliente, que o mundo, afinal, não vai acabar. Mas há outra razão.

Entre Março e Maio, perante o novo coronavírus, os governos reagiram com uma quarentena medieval. Em sociedades como as de hoje, os danos decorrentes só poderiam ser tremendos: falências, desemprego, endividamento, privação de cuidados de saúde e falta de condições adequadas de aprendizagem escolar. As consequências só serão conhecidas daqui a uns anos. Entretanto, sabemos que o PIB português desceu, por um trimestre, ao nível de 1999, o que confere mais ou menos com o retrocesso civilizacional de 25 anos estimado por Bill Gates. É esta a razão por que, desta vez, não será como em Março, mesmo sem vacina: nenhuma sociedade aguentará outra passagem pelo inferno.

Ah, mas aplanou-se a curva das infecções na Primavera. Sim. Mas não teria havido outros meios? Imaginem, em Janeiro, governos que tivessem levado imediatamente a sério as notícias da epidemia na China. Imaginem, em Fevereiro, governos que tivessem imposto o uso generalizado de máscara de tipo cirúrgico, a desinfecção de mãos à entrada e saída de espaços públicos, e aconselhado ou imposto o distanciamento social. Imaginem, em Março, governos que tivessem percebido que a emergência estava nos lares de idosos, e tomado medidas enérgicas para garantir a sua segurança. Talvez tivesse sido possível dominar a curva e evitar mortes, sem privar tanta gente de rendimentos, de saúde, de educação e até de convívio humano, como muitos idosos e internados. Dir-me-ão: mas em Janeiro, ninguém imaginava; mas em Fevereiro, não havia máscaras nem gel; mas em Março, ninguém percebeu o que era prioritário. Então já não estamos a falar só da epidemia, mas de outras coisas: de imprevisão, de impreparação, e de erro.

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