O gabinete da Ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, assegurou que “a filiação no Partido Socialista nunca foi critério de recrutamento” para os gabinetes ministeriais. Ouve-se uma coisa destas e hesita-se: será uma piada, será um engano ou será que a Ministra pretende realmente convencer-nos do que está a dizer? Como ninguém se riu e como não foi corrigida a declaração, sobra a terceira opção. Ora, assim sendo, Mariana Vieira da Silva comete três erros: baralha tudo, diz uma mentira e cria um problema.

O tema na base da discussão é a contratação de um jovem estudante de 21 anos, militante do PS, recém-licenciado e sem experiência profissional, para adjunto no gabinete da Ministra da Presidência — funções para as quais será remunerado mensalmente com cerca de 3700 euros brutos. Ora, confrontado pela comunicação social com esta contratação, o que diz o governo?

Primeiro, a Ministra tentou baralhar os dados: rejeitou que o critério de contratação fosse a militância partidária, o que fez as manchetes nos jornais. Mas o ponto-chave não está na militância do jovem — está na óbvia desadequação do seu perfil para funções de tão elevada responsabilidade. Atenção: a sua nomeação é legal e legítima, na medida em que a contratação para os gabinetes ministeriais é discricionária. Mas não deixa de ser um desprestígio para o Estado quando funções deste tipo são exercidas por jovens impreparados. E ascende mesmo a motivo de vergonha quando é o próprio gabinete a assegurar que houve “adequação do perfil do nomeado à natureza das funções do gabinete” — o que, por outras palavras, implica admitir que a fasquia para exercer funções num gabinete ministerial está muito baixa.

Segundo, a Ministra lançou uma mentira: alegar que a filiação partidária não é um critério de recrutamento nos gabinetes ministeriais é uma mentira descarada (e desnecessária). Os gabinetes do governo de António Costa estão cheios de militantes do PS, da mesma forma que os gabinetes ministeriais dos governos PSD-CDS estavam cheios de militantes de PSD ou CDS. Sendo cargos de confiança política, nada disso se estranha. Aliás, é normalíssimo: a filiação partidária será, possivelmente, o primeiro critério dos partidos na hora de fazer as suas nomeações para diferentes cargos. Não se percebe com que intuito a Ministra se atreveu a negar esta evidência.

Terceiro, a Ministra inventou um problema. Quando há uma maioria absoluta do PS, as pessoas estão à espera de que haja militantes do PS no governo. Julgo que isto é óbvio — se houvesse militantes do PSD nos gabinetes ministeriais é que seria bizarro. Ou seja, a melhor solução teria sido a Ministra dizer a verdade: sim, o jovem de 21 anos foi nomeado porque é visto como um bom quadro do PS. Não era preciso mentir. Aliás, mentir era mesmo a pior solução. Mas a Ministra preferiu mentir, escolheu confundir a opinião pública, e perdeu-se num labirinto. Como tal, criou um facto político: o país confirmou que, mesmo quando a verdade é o caminho mais eficaz, o governo revela-se incapaz de assumir as suas escolhas e, sob pressão, esconde-se sistematicamente entre confusões e mentiras.

É esse o novo problema da Ministra Vieira da Silva: para encobrir uma escolha duvidosa, mas legítima, optou por um caminho sinuoso, repleto de mentiras que partem de um pressuposto irritante — o de que as pessoas são suficientemente parvas para acreditar no inacreditável. Se calhar, a Ministra até tem razão e há quem engula estas versões alternativas da realidade. Mas eu, que gostaria de acreditar que os portugueses não são assim tão parvos, deixo um conselho: da próxima vez, experimentem dizer a verdade. Não dói nada e evita problemas desnecessários.

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